Seja bem-vindo, meu novo desconhecido!
Como eu mudei… Estava pensando um dia desses. Não sou mais a mesma, me transformei aos poucos. Uma mudança gradativa. Um processo lento, até que um dia você avista em pequenos detalhes os primeiros indícios.“Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro se tornar cinza?” – Assim Falou Zaratustra (Friedrich Nietzsche).
Amizades, um primeiro ponto indicativo dessa mutação.
O carinho existe e as lembranças também, mas e os valores? Não, esses não são mais os mesmos! Primeira pista, algo está diferente.
E nesses momentos de mudança, muitas vezes, você se sente perdido… E agora? Qual o caminho?
Por algum tempo, você se sente suspenso, como que perdido em um limbo, difícil de se reconhecer. Quem sou eu?
Dois anos, talvez mais, talvez menos. Não existe um marco inicial e preciso, mas, sim, escolhas inconscientes, que sutilmente te levaram e direcionaram para essa mudança.
Até que um dia você enxerga o grande quebra-cabeça e como as peças, que antes pareciam se encaixar perfeitamente e desenhar o mapa de sua vida, não mais possuem o formato adequado. As peças se transformaram, algumas se estenderam, outras encolheram e o quebra-cabeça agora possui um novo recorte.
Pouco a pouco, a pessoa que você conhecia não está mais lá, ela não reside mais em você. Ela se foi, é por isso que você se sente só. Você não se reconhece. Mas esse é apenas um processo passageiro, para que uma nova pessoa possa surgir.
O momento chega quando você reconhece que, sim, há uma nova pessoa ali dentro, com sentimentos, vontades, desejos e força. E agora você deseja conhecer e criar intimidade com esse novo ser, mas ainda pode parecer contra intuitivo.
Eu não te conheço, o que você quer?
Em alguns dias, ela é apenas uma desconhecida tentando invadir o seu mundo. Você não aceita, a rejeita e então foge em busca da antiga pessoa.
Porém agora algo não mais se encaixa. O quebra-cabeça é outro, pede novas peças.
Em outros, a nova pessoa é fonte de admiração, aquela que você sempre buscou conhecer. Lentamente, você encontra um novo conforto nela.
Mas será apenas passageiro? Não, chegou a hora!
Você anseia às escondidas receber e criar espaço para essa nova pessoa, que parece te pertencer. Mas espera aí, essa nova pessoa é você! Ela existe aí dentro, ela está viva e pedindo para ser aceita. Talvez ela sempre tenha estado aí, mas cegamente você não a escutava.
Sim, ela vive e você finalmente percebe que ela sempre existiu, apenas se escondeu, pois não sabia se teria a coragem para dá-la as boas vindas.
“Eu mudei!”, você finalmente reconhece com toda a sua força.
Não adianta mais recorrer à antiga amiga. Enfim, você percebe que ela morreu e deixa ir…
Deixa ir quem você sempre acreditou ser. A parte mais difícil e dolorosa, pois ninguém o acompanhou por tanto tempo, por toda a sua vida, em todos, exatamente todos os momentos, senão ela. Mas agora você sabe que ela se foi.
Pouco a pouco, você então compreende que está pronto para acolher a nova pessoa e esse reconhecimento é tranquilizador. Essa é você, essa sou eu.
Chegado o momento de assumir as consequências de ser quem se é, sim, terão perdas ao longo do caminho e, como toda perda, um sentimento de nostalgia, faz parte.
Você se depara então com a perda de algumas e alguns, que deverão partir, não digo deixados para trás, pois não se trata de uma corrida, apenas de uma transformação.
Amizades, ideias e crenças talvez não terão mais espaço e estar em paz com a perda não é tão simples. Mas você não consegue mais forçar e fingir, a nova pessoa é honesta, honesta consigo. Não há mais como se trair por aceitação.
E assim, lentamente, você percebe que existem outros mundos e outras realidades onde você poderá voltar a se sentir em casa. Pessoas novas, sim, ainda desconhecidas, mas que despertarão em você o seu novo olhar, as suas novas verdades.
Não é fácil deixar de ser aquele conhecido. Você imaginava saber onde e a quem pertencer, porém agora você descobre que pertence a si mesmo.
Você vive a sutil despedida e o medo que a acompanha, pois ele segue presente, afinal, não existem mais garantias. Essas você optou em deixar para trás. E apesar de imaginar que, sim, ainda é possível voltar, você reconhece em si mesmo que essa possibilidade inexiste de agora em diante, pois quem você foi deixou de ser.
Mudei, me despi, me despedi, para te encontrar.
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