Neste terceiro artigo da série sobre a morte, vamos investigar como o tema era tratado nas antigas sociedades tradicionais. Nas sociedades tribais o indivíduo estava inserido na vida grupal, que era mais importante que ele mesmo.
Nas sociedades tradicionais ainda predomina este sentido comunitário. Os ritos fúnebres são muitos e variados, evoluindo de acordo com os costumes regionais e com a idade, sexo e posição social do falecido.
Há uma série de cerimônias e rituais que cercam o evento da morte. O rito fúnebre começava com a agonia, continuando com o velório, as exéquias e o luto. O prolongamento do rito se dava com o culto aos mortos. O ritual funerário indicava cada passo a seguir para conter o caos e a perturbação com a separação e instaurava novamente a ordem.
O elemento mais importante era o futuro ritualizado do cadáver, obedecendo a uma série infinita de exemplos. O ser humano procurava controlar a corrupção material (fosse presenciando-a de forma controlada, afastando-a da vista ou procurando detê-la) de diversas maneiras:
- Os parses (Irã) abandonavam os cadáveres no alto das “torres do silêncio”, onde eram rapidamente devorados por abutres;
- Os corpos de antigos viajantes marítimos eram comumente amarrados em uma pesada pedra e lançados à água;
- Na África, algumas tribos penduravam os corpos enrolados no alto das árvores ou no oco do tronco;
- Na América (múmias incas e as dos antigos Chinchorros do deserto de Atacama), Ásia (sacerdotes budistas que entraram vivos, pela ascese, para a eternidade) e África (principalmente no Egito), os corpos são conservados à espera de um futuro retorno à vida;
- Através da cremação, que liberta e purifica com a ação do fogo (ritos hinduístas, budistas, xintoístas, vikings, gregos);
- A inumação (retorno a Terra-Mãe) era a mais comum: o corpo é enrolado em um lençol, caixão ou urna funerária e colocado em sepultura, cuja forma, importância, orientação, profundidade e riqueza variam consideravelmente.
Podemos tentar compreender estas condutas, apesar das disparidades no tempo e espaço, analisando-as sob dois níveis:
- No plano do discurso manifesto, cujo significado é organizar o futuro do morto – com a repulsa da corrupção corporal e o favorecimento de sua entrada para um estado de sobrevivência potencial;
- No plano do discurso latente, no qual podemos reconhecer a defesa contra a angústia da separação.
Importante rito de passagem, as cerimônias manifestam o desejo de atenuar a morte, negando-a e, através disso, confortam os vivos. Isto acontece porque, como todo morto evoca um sentimento de culpa, os ritos fúnebres são ocasião para um resgate simbólico – a comunidade, os sobreviventes e sobretudo os parentes, não podem se libertar do domínio da morte enquanto não pagarem este resgate, através de um conjunto de obrigações a cumprir: período do luto, gastos com sepultamento, missas, etc. Assim, todos ficam em paz com o morto e com a morte.
Quando mobiliza a comunidade e toma seu sentido na exaltação da vida, o rito cumpre função terapêutica, regenerando o grupo e fortalecendo sua coesão e continuidade diante da ruptura da morte.
Por último, o rito traz de volta a esperança na promessa de sobrevivência.
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O sentido profundo e a função fundamental dos ritos funerários dizem respeito ao indivíduo vivo e à comunidade: é necessário dominar simbolicamente a morte para tranquilizar, curar e prevenir.
No próximo artigo, vamos começar a examinar alguns “guias” espirituais elaborados para esclarecer e preparar a jornada da alma no além.
Leia todos os artigos da série Terapia de Regressão.
Fontes
“Filosofando” – Ma. Lucia A. Aranha e Ma. Helena P. Martins – Editora Moderna, São Paulo, 1988.
“Sentido oculto dos Ritos Mortuários” – Jean P. Bayard – Editora Paulus, São Paulo, 1996.