Acho que eu sempre fui uma pessoa movida pelos riscos. Paga-se um preço por este fato; só prefiro seguir minha intuição ao invés de precisar seguir ideologias já formadas. Ideias hermeticamente construídas pela sociedade. Veremos como um mundo tão diferente do meu será capaz de modificar a construção do meu eu. Chamo construção pelo fato de acreditar que não somos isso ou aquilo definitivamente. Somos um emaranhado de escolhas e eventos que acontecem – ou não – de acordo com os nossos planos.
Deixei o Rio de Janeiro com vários objetivos e meio que impulsivamente, mas em vários aspectos consciente do porvir. Faço o que acredito precisar muito mais do que o que eu gostaria de fazer. Encontrei esse caminho em meu percurso e resolvi que ele seria o meu destino por agora. A tal bifurcação que todo mundo se depara, cedo ou tarde. Já no Chile, fazendo minha primeira conexão, tive tempo para pensar na minha saída de São Luís, na minha temporada carioca e então o meu quase um ano em São Paulo e, depois disto, minha nova volta ao Rio. Sampa, sem dúvida, serviu de trampolim para este salto mais alto e desafiador.
De qualquer forma, minha conexão dizia que eu passaria 8 horas no Chile e, depois de atravessar a Cordilheira dos Andes e sua turbulência agressiva, só conseguia agradecer por estar em solo seguro, mesmo com tantas horas de espera. Já havia esperado tanto tempo. O que são horas neste caso?! Andei. Bisbilhotei o Freeshop. Fiz duas boas refeições e resolvi entender o meu bilhete de embarque – Ué! Se saio daqui às 23:15h, por que será que o meu bilhete diz hora do embarque: 04:00h da manhã? Seria o fuso ou me faltam parafusos?! Foi quando resolvi descer e conversar com a atendente que me disse que havia sim este “pequeno” atraso e que ela me daria um ticket que valia duas refeições. Juro que quis perguntar se ela trocava uma bicicleta por uma caixa de fósforos, como fazia Silvio Santos no finado “DOMINGO NO PARQUE”, no jogo do sim ou não. Contive minha petulância e aceitei a minha condição.
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Senta, levanta. Senta, levanta. Anda. Vai ao banheiro. Come. O medo de dormir e perder o avião? Minha bagagem? Meu dinheiro?! Vou ficar acordado. Será que falo para alguém me acordar? Enfim, não dormi. Entrei no voo às 5:00 AM e deixamos Santiago por volta das 05:20 AM. Apaguei e só acordei às 03:00 PM, no horário de Brasília. Uau! Das 11 horas de prisão aérea que eu tinha até o meu destino, boa parte eu tinha me livrado. Pelo menos no aeroporto eu esperei podendo me mover com liberdade, algo que não se faz em um avião.
Quando pousamos aqui na Nova Zelândia – Sim! Eu ainda não cheguei. Não, eu não sabia que pararia aqui e mesmo assim continuo calmo – a primeira coisa que me aconteceu foi uma fungada canina em busca de qualquer coisa suspeita. Eles são uma espécie de recepcionistas e dão as boas-vindas, sabe?! Tenho mais 6 horas de espera até o meu voo para Sidney e não sei quanto mais terei que esperar até, finalmente, chegar a Brisbane. E continuo emanando a tal calma dos budas tibetanos, pois se tem algo que eu já percebi é que a vida gosta de testar a gente. Comecei a me sair melhor depois desta sutil descoberta!
E antes mesmo de pisar em solo Australiano já tive minha primeira grande lição. Não é só no Brasil que imprevistos acontecem. Fora dele as pessoas se atrasam. Erram. Se equivocam. Tudo do jeito que estamos acostumados a ver em terras tupiniquins. O que de fato muda é a forma como essas pessoas lidam com os imprevistos. Existe uma “sabedoria” ao administrar estes eventos incontroláveis – na verdade, controlamos bem menos do que presumimos – e uma verdadeira vontade de fazer com que o equívoco causado seja o menos danoso para quem sofre. Existe uma proatividade em ajudar o próximo com um real interesse no propósito. Genuinamente.
Percebo, mesmo antes de chegar ao meu destino, que há um abismo mais perceptível do que eu supunha entre essas culturas. E foi ao entrar em contato mais claro com este fato, que a minha chateação pelos atrasos perdeu qualquer tipo de peso. E sabe o mais curioso? Acaba de passar por mim uma “brasileirinha” de uns 6 anos que disse o seguinte para sua mãe: “Minha professora pediu que eu levasse de lembrança uma conchinha para ela, mãe!”. Quando os nossos mestres são lembrados por uma nova geração, há um ar de esperança que nos invade e nos renova ao mesmo tempo. Lembranças. A vida é feita de simplicidade!