Durante a alfabetização, algumas crianças apresentam dificuldades no aprendizado. Omitem, acrescentam, trocam e invertem letras e sílabas. Não conseguem interpretar textos e demoram em decorar a tabuada. Alguns adultos demoram muito tempo para ler um livro, por mais que tenha poucas páginas e resistem em escrever mensagens. Tais dificuldades são sinais clássicos de dislexia.
Do grego dis- distúrbio, lexis- palavra, é um transtorno genético e hereditário de linguagem. Dificulta a capacidade de aprender a ler e escrever e de entender textos.
Os portadores desse transtorno podem não conseguir estabelecer a memória fonêmica, ou seja, fazer a associação dos fonemas com as letras.
Segundo dados da Associação Brasileira de Dislexia, o transtorno atinge de 0,5 a 1,7 da população mundial. A incidência é maior em homens, para cada 4 homens, uma mulher tem dislexia.
Tipos de dislexia
Dislexia Adquirida: Dificuldades na leitura e na escrita são explicadas pelo deterioramento das áreas do cérebro responsável por essas atividades;
Dislexia Superficial: Erros de omissão, substituição e adição de letras. Os portadores desse tipo de dislexia apresentam maior dificuldade com ortografia, pois, guiam-se pela informação auditiva;
Dislexia Auditiva ou Disfonética: A ausência da percepção dos sons acarreta em dificuldades na fala, erros na leitura devido as dificuldades com os grafenas-fonemas. Os portadores da dislexia auditiva também cometem erros na escrita, pois, trocam as sílabas;
Dislexia Visual ou Diseidética: Provoca dificuldades em diferenciar os lados direito e esquerdo, erros ortográficos e erros de leitura causados pela má visualização das palavras;
Dislexia Fonológica: Nesse tipo de dislexia, o portador faz uma leitura visual das palavras. Elas são observadas de global. O portador da dislexia fonológica pode ler “casa” em vez de “caso”, ou seja, a pessoa adivinha a palavra em vez de ler. Os erros mais comuns na dislexia fonologia são:
- Omissões de letras-sílabas-palavras: chave/cave
- Confusões nas letras: d-b, p-q, b-g, u-n, g-p, d-p
- Invenções de palavras: e de quê
- Inversões nas letras-sílabas: pai/pia
- Substituição de palavras
- Ortográficos em palavras novas ou desconhecidas
- Hesitações nas palavras desconhecidas
- Reiterações de sílabas-palavras: cozinha/cocozinha
Dislexia Profunda ou Mista: União de dois ou mais tipos. Dificuldades visuais e auditivas ao mesmo tempo, o que leva a erros visuais, semânticos ou paralexias (confundir “feliz” com “Natal”).
Causas
- Origem neurobiológica – alteração cromossômica transmitida por um gene de uma pequena ramificação do cromossomo 6 o que torna a dislexia altamente hereditária;
- Alterações cerebrais – mau funcionamento, atraso no amadurecimento do sistema nervoso central, ou falha na comunicação entre os neurônios, o que dificulta as funções de coordenação;
- A produção excessiva de testosterona durante a gestação também é apontada como o que justificaria a maior incidência em homens;
- Doenças como a encefalopatias;
- Perturbações no parto ou início da vida;
- Desnutrição grave – nos primeiros anos de vida pode afetar o sistema nervoso central, comprometendo a aprendizagem e o desenvolvimento geral da criança;
Como a dislexia age no cérebro?
Segundo neurocientistas da Georgetown University Medical Center (Estados Unidos), a anatomia cerebral de homens e mulheres com dislexia é diferente. O estudo é o primeiro a comparar o cérebro de homens e mulheres com e sem o distúrbio. Os resultados da pesquisa foram publicados na revista Brain Structure and Function.
A pesquisa aponta que as mulheres não são levadas em consideração nos estudos sobre o assunto, porque a maior incidência de dislexia é nos homens.
Nos homens, o menor volume de massa cinzenta é encontrado nas áreas do cérebro ligadas ao processamento da linguagem. Já nas mulheres, o menor volume de massa cinzenta está nas áreas responsáveis pelo processamento sensorial e motor.
Diagnóstico
O diagnóstico é feito por uma equipe multidisciplinar (médico, psicólogo, psicopedagogo, fonoaudiólogo e neurologista). A dislexia é confirmada após serem excluídas deficiências visuais e auditivas, escolarização inadequada, déficit de atenção, problemas socioeconômicos e emocionais.
Quanto mais precoce for o diagnóstico, mais eficiente será o tratamento e o portador aprenderá a lidar com suas dificuldades.
Tratamento
Os distúrbios de aprendizagem e atenção são provocados pela ausência de certos neurotransmissores, conta a psicóloga e neuropsicóloga Edyleine Benzik. A psiquiatra ainda esclarece que a medicação repõe as substâncias ausentes.
Dislexia em crianças
Apresenta-se no final da alfabetização e no início da vida escolar. Como muitos profissionais de educação e saúde possuem pouco ou nenhuns conhecimentos sobre a dislexia associam as falhas de escrita e a dificuldade à preguiça ou desinteresse. Porém, Clélia Estill, fonoaudióloga e psicopedagoga da Associação Nacional de Dislexia relata que nem toda dificuldade de aprendizagem é dislexia. No ambiente escolar, cabe ao professor ter a sensibilidade para perceber que algo não está bem. Cabe a ele apresentar o caso a coordenação pedagógica e, principalmente aos pais.
Sintomas
Dos 3 aos 6 anos
- Falar como um bebê;
- Dificuldade em reconhecer as letras que formam seu nome;
- Dificuldade em lembrar nome de letras, n
úmeros e dias da semana;
Dos 6 aos 7 anos
- Dificuldade na divisão silábica;
- Não consegue ler palavras monossilábicas;
- Memoriza textos sem compreendê-los;
- Reclama que ler é muito difícil.
Dos 7 aos 12 anos
- Erros constantes de leitura e dificuldade para interpretar textos;
- Usa palavras vagas como “coisa”;
- Desorganização na escola e em casa;
- Dificuldade nos ditados e ao copiar;
- Não consegue terminar as provas;
- Medo de ler em voz alta;
- Dificuldade em seguir instruções verbais e impressas;
- Problemas de conduta por não conseguir realizar as atividades escolares;
- Imaturidade e problemas de autoestima.
12 anos em diante
- Escrita descuidada, desordenada e incompreensível;
- Confundir instruções verbais e sequências, como por exemplo, números de telefone;
- Interrupção das atividades;
- Dificuldade para aprender idiomas;
- Baixa estima
Dislexia infantil e depressão
A falta de acompanhamento profissional e do apoio familiar deixa as crianças mais expostas aos perigos da depressão, segundo pesquisa realizada pelo neuropsicólogo Ricardo Franco de Lima, da Unicamp. Crianças disléxicas sentem-se inferiores às demais porque não conseguem realizar as atividades. Como a dislexia não tem cura, essa negligência dará origem a um adulto com dificuldades de aprendizado e sentimento de inferioridade ainda mais acentuados.
Tratamento
Para alguns médicos a dislexia e demais distúrbios de aprendizado em crianças podem ser tratados sem medicamentos. Segundo a pediatra Maria Aparecida Moysés, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), os medicamentos podem causar dependência, pois, as anfetaminas é o princípio ativo de todos os remédios usados nesses tipos de distúrbios. As anfetaminas causam sensação de prazer. A pediatra informa que jovens de 18 a 20 anos têm dificuldades em abandonar o tratamento. Ainda de acordo com a pediatra, as crianças com transtorno de aprendizado tratadas com medicamentos apresentam distúrbios do sono e agem como “zumbis”. Maria Aparecida finaliza sua análise dizendo que a intervenção medicamentosa pode alterar hormônios sexuais e do crescimento.
Tratamentos complementares
Crianças com dificuldades fonológicas devem ser submetidas a treinamentos para reconhecer mudanças de fonemas. O FAST FORWARD é um programa de computador usado em escala comercial nos Estados Unidos. A terapia fonoaudiológica em cabine é outro importante recurso para o tratamento do disléxico com alterações no processo auditivo.
O papel do professor no tratamento de crianças disléxicas
O professor tem um papel importante no cotidiano das crianças disléxicas. Junto com a equipe pedagógica da escola serão responsáveis por criar um ambiente favorável ao ensino. Confira qual deve ser o comportamento do professor:
- Respeitar o ritmo do aluno;
- Individualizar o ensino, dividindo a matéria em várias partes;
- Repetir as informações quantas vezes forem necessárias;
- Destacar os acertos e elogiá-los;
- Privilegiar a avaliação oral;
- Corrigir conteúdos gramaticais (conhecimentos e não a ortografia);
- Permitir que o aluno relacione aprendizados escolares com experiências anteriores;
- Lições de casa não muito extensas;
Dislexia em adultos
As dificuldades na fala, escrita e compreensão continuarão na fase adulta, caso a criança disléxica não receba acompanhamento profissional e o apoio da família. As dificuldades persistem, assim como as brincadeiras de mau gosto. A baixa estima de um adulto disléxico aumentará sua timidez, colocando em risco suas relações familiares, com amigos e amorosas. Por esse motivo, é comum o consumo de drogas lícitas e ilícitas para afugentar a angústia e as cobranças pessoais e de alguns familiares e amigos por não conseguir desenvolver tarefas simples. Em um primeiro momento, as drogas trazem conforto, porém, é uma saída temporária, pois, os sentimentos negativos voltam tão logo cessa o efeito. Dependência é tudo que o disléxico não precisa daí a importância de observar o comportamento e buscar informações para ajudar.
Sintomas da dislexia em adultos
- Não conseguem se relacionar;
- Dificuldade em distinguir direita e esquerda;
- Escrita e leitura comprometidas. Adultos disléxicos demoram em terminar a leitura de um livro;
- Pular os finais das palavras na leitura;
- Dificuldade em aprender idiomas;
- Memória imediata prejudicada;
- Dificuldade para soletrar;
- Dificuldade em administrar o tempo;
- Dificuldade em nomear objetos e pessoas;
- Relutam em escrever;
- Problemas com sequências;
- Confundem mensagens telefônicas;
Adulto disléxico e vida escolar
Vestibular
A redação, interpretação de textos e os enormes enunciados já são aterrorizantes para quem não tem dislexia. Imagina para quem tem. Os disléxicos podem solicitar tempo extra para realizar a prova. A Comissão Permanente dos Vestibulares da Universidade Estadual de Campinas (Comvest/Unicamp) avaliam esse pedido. Caso for aceito, o aluno tem duas horas a mais e faz a prova em outro lugar, com o auxílio de um monitor que lê as perguntas. O aluno pode usar calculadora e elabora mentalmente a redação e dita para o monitor transcreva.
Ensino Superior
É perfeitamente possível um disléxico ter êxito no Ensino Superior, desde que adotadas algumas medidas:
- Usar várias formas para apresentar os conteúdos: vídeos, apresentação de slides;
- Ter um resumo da aula para familiarizar o aluno ao assunto. Esse resumo deve ter palavras chave;
- Dar exemplos para ilustrar um assunto e textos complementares. Esses materiais não devem ter fundos com imagens, nas fontes Arial ou o Comic Sans e sem parágrafos muito extensos;
- O aluno pode imprimir o material de apoio com papel de outra cor. Alguns usam acetatos de cor que colocam por cima do texto para facilitar a leitura;
- O professor precisa perguntar ao aluno se ele está conseguindo acompanhar;
- Fazendo pausas regulares;
- As perguntas das avaliações devem ser objetivas;
- Professor precisa combinar com esse aluno datas de entrega de trabalhos;
Curiosidades sobre a dislexia
Disléxicos têm o hemisfério cerebral lateral-direito mais desenvolvido. Segundo estudiosos, tal característica explica o enorme potencial para as artes, atletismo, mecânica e criatividade na solução de problemas, além de habilidades intuitivas. O mundo viu e está vendo grandes cientistas, escritores, atores, políticos e atletas disléxicos. Confiram como conseguiram superar as dificuldades:
Albert Einstein- cientista: O maior cientista de todos os tempos dizia: “Quando eu lia, somente ouvia o que estava lendo, e era incapaz de lembrar a aparência visual da palavra que lia”.
Thomas Alva Edison – inventor: O maior inventor de todos os tempos e sua relação com a dislexia: “A mais satisfatória forma de arrebatamento é pensar, pensar e pensar”.
Hans Christian Andersen – escritor dinamarquês: O autor do livro “O Patinho Feio” nunca conseguiu escrever e soletrar em sua língua nativa.
Agatha Christie- escritora: A escritora britânica, autora do livro “Assassinato no Expresso do Oriente” sempre reconheceu suas limitações: “Eu, por mim mesma, sempre me reconheci como a ‘mais lenta’ da família. Isto era inteiramente uma verdade e eu sabia disto e aceitava isto”.
Whopppi Goldberg – atriz: A estrela de “A Cor Púrpura” relata “Minhas lembranças da escola não são minhas coisas favoritas. Nós não somos estúpidos – nós temos uma deficiência e essa deficiência pode ser superada”.
Danny Glover – ator: O astro de “Máquina Mortífera” revela o duplo preconceito, racial e por ser disléxico: “As crianças faziam piada de mim por causa da minha pele negra, de meu nariz grande, e porque eu era disléxico. Já como ator, demorou um longo tempo para que eu pudesse entender por que as palavras pareciam misturadas em minha mente e eu as pronunciava de maneira diferente”.
Winston Churchill – político: O líder inglês conta o perigo da discriminação: “Fui totalmente desestimulado em tudo, em meus dias de escola. “E nada é mais desencorajador do que ser marginalizado em sala de aula, o que leva a nos sentirmos inferiores em nossa origem humana”.
Magic Johnson – jogador de basquete: O maior jogador de basquete de todos os tempos conta seu desejo de superação: “Eu queria mostrar a cada um que podia fazer o meu melhor, mas, também, que eu era capaz de ler”.
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Ao detectar qualquer problema no desempenho escolar do seu filho, procure orientação junto à escola. Não hesite em levá-lo ao psicólogo, psiquiatra e neurologista. Diagnosticada a dislexia, siga à risca o tratamento. Com acompanhamento profissional, da família e dos amigos, a criança disléxica poderá ter qualidade de vida, tornando-se assim um adulto bem sucedido em sucedido nos estudos e em seus relacionamentos.
- Texto escrito por Sumaia Santana da Equipe Eu Sem Fronteiras.