Comportamento Maternidade Consciente

Irmãos

Irmão beijando testa de irmão mais novo dormindo
123RF | Foto de: Famveldman
Escrito por Juliana Meyer Luzio

Faz um tempo que tenho reparado nas relações entre irmãos e em toda a riqueza de sentimentos envolvidos nesse convívio.

Assim como a maternidade, a irmandade também vem carregada de emoções idealizadas e quase sacras, só que em ambas o cotidiano é bem mais trágico, difícil e complexo do que nos ensinam.

Ter um irmão é devastador porque se somos filhos únicos, ele já chega nos tirando/roubando um lugar, olhares e atenções antes só nossas. Então, num primeiro momento, este ser que adentra nossa casa e nosso espaço é antes de tudo o destruidor de um sistema emocional e físico, já estabelecido e equilibrado.

Se somos filhos do meio, vivemos o dilema entre ser comparado com o mais velho e, portanto, aquele que sabe, que é o primogênito. E o mais novo que vem, como dito acima, nos roubar o lugar de caçula e demandar os olhares, amores e cuidados antes destinados a nós e divididos com apenas mais um. Essa posição de filho do meio muitas vezes nos deixa de escanteio, com as sobras do que foi dado ao mais velho e ao mais novo, exigindo de nós um esforço extra para sermos notados.

Irmãos brincando perto de janelas fechadas em quarto
Jessica West | Pexels

Já os caçulas, embora não sofram com a chegada de um irmão intruso, desde de sempre vivem com os brinquedos, roupas e objetos como carrinho, banheira, berço, entre outros, que eram dos mais velhos. Vivendo sob comparações e à sombra dos que vieram antes.

Parece pesado e muito ruim os parágrafos acima, mas talvez eles só se tornem fontes de sofrimento se forem ignorados e não considerados e falados entre os familiares. É preciso poder dizer o quanto é chato dividir o que é nosso, principalmente o amor, o olhar, a atenção e o carinho do nosso pai e da nossa mãe.

É preciso poder dizer que os irmãos nos incomodam, nos atrapalham e nos magoam para então conseguirmos sentir ternura e irmos construindo no dia a dia os laços que possibilitarão um compartilhar amoroso, gentil e verdadeiro.

Recente mãe de dois, me peguei preocupada em como transmitir a importância de se ter e ser irmão. Fiquei me perguntando em como educar para ensiná-los a serem melhores amigos, companheiros e cuidadosos um com o outro. Um sentimento muito verdadeiro de querer que meus filhos se cuidem na minha ausência, se ajudem nos dissabores da vida e não construam uma relação de competição, inveja e distanciamento.

Criança maior brincando com irmãzinha menor do lado de fora da casa
Jens Johnsson | Unsplash

E aí, observando o meu mais velho — hoje com cinco anos e dez meses — ao conhecer sua irmãzinha — hoje com um ano e três meses —, atenta aos seus gestos e comportamentos, me dei conta do quanto o espaço antes só dele, os pais antes só dele não existiam mais e, portanto, meu pequeno estava vivenciando um luto. Estava vendo seus pais, brinquedos e seu quarto serem tomados e invadidos.

E foi diante de uma cena de indignação dele que pude enxergar uma raiva e uma dor muita legítimas. Entendi ali, naquela hora, que eu — a mãe, a adulta da cena — precisava ajudá-lo a nomear sem julgamento o que estava sentindo. Sentei-me no chão ao seu lado e disse o quanto deveria estar sendo chato para ele tudo aquilo, que ter uma irmã mais nova estava atrapalhando o seu dia e que eu o entendia e lhe dava razão! Mas, podia lhe garantir que essa chatice um dia se transformaria e que assim que sua irmãzinha ficasse um pouco maior ela se tornaria uma companheira de brincadeiras e não apenas alguém que demanda tanto a minha atenção.

A partir desse momento, passei a considerar que talvez um caminho para transmitir a riqueza e a delícia de se ter irmãos é simplesmente reconhecer também seu lado ruim e falar abertamente sobre isso. Com delicadeza, cuidado e respeito, mas abrir espaço para que cada um dos meus filhos possa sentir sem culpa e sem pesar que às vezes é um saco ter irmão.

Percebi a importância de estar atenta às diferenças de cada um deles, no modo de cada um se relacionar, brincar, falar, sentir e compartilhar suas emoções e fortalecer essas maneiras. Me pareceu fundamental que cada um tenha seu espaço e alguns objetos/brinquedos pessoais. Que cada um tenha um tempo de atenção e companhia exclusivos com seus pais. Irmãos não precisam compartilhar tudo, pelo contrário, nós, pais, não podemos nos esquecer da individualidade de cada filho e se faz necessário que criemos e respeitemos seus universos particulares.

Cada qual em seu espaço, com seus amiguinhos, suas músicas e filmes preferidos propiciará uma vontade genuína de compartilhar e estar com o outro. Penso que é preciso que cada filho sinta para então saber que o amor não se divide, mas se multiplica e que a presença de um irmão para além de uma ameaça é uma oportunidade de trocas e inspirações.

Deixar que cada filho tenha seu espaço físico e emocional dentro da casa e da família lhe dará recursos para a construção de sua autoestima, de olhar para o outro não como ameaça, mas como uma outra pessoa assim como ele, rica em ideias, projetos, sonhos, sentimentos e que, portanto, também merecedora de atenção, afetos e consideração.

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Olhar para cada um de nossos filhos como um ser singular, lhe proporcionar um ambiente de aceitação e validar suas emoções me parecem hoje atitudes fundamentais e que refletirão diretamente na construção de sua maneira de viver a vida e lidar com as questões que ela lhes trarão.

Não sei se agindo assim conseguirei criar uma relação de cumplicidade, amizade e amor entre meus pequenos, mas essa será minha aposta, e maternidade é sempre uma aposta, uma tentativa e uma transformação diária. Assim como a irmandade, um eterno tecer de confiança e cumplicidade.

Sobre o autor

Juliana Meyer Luzio

Terapeuta que constrói sua clínica através de um espaço que integra fala, consciência corporal e quietude, tornando possível uma reconexão com o que há de belo, delicado e muito forte em nós - nossa saúde.

Formada em Psicologia, Psicanálise, Terapia de Integração Craniossacral, Transmutation Therapy, entre outros, está sempre em busca de conhecimentos que agreguem, em seu dia-a-dia maneiras, diferentes de olhar a vida.

Atualmente, além de sua clínica, lançou a Îandé, onde tem se dedicado à arte de criar e costurar produtos exclusivos e cheios de carinho.

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