Foi num tempo não muito distante, com um menino chamado Joaquim, que uma conversa interessante aconteceu.
“Mãe! Quem você ama mais – eu, meu pai, o Pedrinho, a Tereza ou o Bento?”
“Que pergunta é essa, Joaquim?!”, disse a mãe com cara de espanto.
“Eu amo você, seus irmãos e seu pai da mesma maneira. Amo igual todos vocês.”
Joaquim então ficou um pouco em silêncio, pensando naquela resposta da sua mãe e se perguntando como ela poderia amar igual se cada um é um?
Ele por exemplo ama cada um de seus irmãos de um jeito, e seu pai e sua mãe de outro.
Após alguns instantes de silêncio, ele perguntou:
“Mãe! Como é possível amar todos iguais se somos diferentes?”
Agora quem ficou em silêncio e com uma cara de dúvida foi a mãe.
E então Joaquim continuou:
“Mãe, eu gosto de cantar e inventar histórias, o Pedrinho gosta de ficar brincando e cuidando das galinhas e seus pintinhos, a Tereza adora jogar futebol e quer ser jogadora profissional, o Bento fica com o pai mexendo nos carros o dia inteiro.
Como você faz pra gostar da gente da mesma maneira?
Eu amo cada irmão meu de um jeito! Amo você e o papai também de forma diferente, que não sei falar como, mas sei que amo diferente, mãe.”
A mãe, após ouvir seu filho falando tudo aquilo, percebeu que era verdade que cada filho tinha seu jeito de ser e que é justamente esse jeito único que faz nascer nela um amor diferente por cada um.
Então, com um sorriso no rosto, chamou Joaquim pra pertinho dela e olhando em seus olhos lhe respondeu:
“Você tem razão, meu filho!
Amo cada um de vocês de uma maneira e do jeitinho que são.
Mas, Joaquim, amar diferente cada um de vocês não quer dizer que amo mais um do que outro.
Amor não tem tamanho e não se mede, meu querido.
Amor se sente, se vive e se compartilha.”
Joaquim sorriu e abraçou sua mãe, se sentindo amado e amando.
A mãe aprendera com aquela conversa que o amor não é igual porque ele é despertado e nutrido pelo jeitinho de cada um.
Aprendeu com seu filho Joaquim a importância de mostrar aos seus filhos que embora façam parte da mesma família e que sejam filhos do mesmo pai e mãe cada um é um e será amado justamente pelos seus gostos, sua maneira de brincar, falar e viver a vida.
Joaquim aprendeu que na matemática do amor a divisão não é subtração, e sentindo-se mais amado do que nunca deu a mão pra sua mãe e saíram caminhando e conversando sobre o amor e a família que tinham.
Escrevi esta historinha porque agora tenho dois filhos e nesses poucos três meses de maternidade dupla tenho percebido e sentido como cada filho me toca, me causa e desperta emoções e amores diferentes.
Todos nós já ouvimos frases como “Eu amo meus filhos da mesma maneira” ou “Meu amor é igual por todos os meus filhos, não tem diferença de um pro outro”. Mesmo que não tenhamos irmãos, já escutamos alguma tia, mãe de amigo, padrinho dizer isso. Enfim, levante a mão quem nunca ouviu uma mãe ou um pai dizer que ama do mesmo jeito todos os seus filhos.
Eu já ouvi diversas vezes, mas só agora tenho um sinal da dimensão dessas frases e de como elas podem afetar quem as escuta no lugar de filho. Se você tem irmão ou irmã, me diga o que sente e/ou sentia ao ouvir sua mãe/pai falar que te ama da mesma maneira que ama seu irmão ou irmã.
Todos nós queremos ser amados de forma única e do jeito que somos! Agora o que nos acontece quando escutamos das primeiras pessoas que amamos que elas nos amam da mesma forma e com o mesmo amor que sentem por outra pessoa? E, pior, ama do mesmo jeito aquele ser que invadiu nosso espaço e roubou a atenção que antes era só nossa (no caso de irmãos mais velhos) ou aquele ser que chegou para tirar o pouco de atenção que tínhamos, porque tudo já era dividido com outros irmãos e agora temos mais um.
Como será que essas crianças que possuem irmãos e crescem ouvindo e acreditando num amor padronizado, sem nuances, intensidades e singularidades, constroem e vivenciam sua maneira de amar?
Como será que lidam com as idiossincrasias dos amores que sentimos ao longo da vida e todos os seus altos e baixos?
Como será que essas crianças se relacionam com seus irmãos, uma vez que elas vivenciam uma forma de amor por cada um deles e sabem que não os amam da mesma forma?
Cada filho afeta seus pais de um modo, provocando e convocando-os a viverem a maternidade e paternidade de forma diferente.
Ser pai e mãe é revisitar a própria infância constantemente e ter que relembrar suas experiências enquanto filhos, enquanto crianças, e isso não é fácil nem pouca coisa.
Os filhos são nossos maiores espelhos, eles nos mostram o tempo todo as dores que sentimos, os maus-tratos que vivemos, seja por outras pessoas, seja por nós mesmos. Eles escancaram a forma como nos tratamos hoje e nos revelam sem nenhum tato a pessoa que nos tornamos, e só por essas coisas não daria para amá-los da mesma forma. Porque cada um vai descortinar um lado nosso e certamente temos lados mais bonitos e interessantes que outros. Lados que queremos acessar e outros não.
Cada filho demanda um tipo de atenção, um tipo de cuidado, um tipo de afetuosidade que varia conforme sua essência e isso faz com que cada pai e cada mãe respondam a essa demanda como lhes é possível.
Me lembro de sempre escutar minha mãe dizer que sua mãe tinha preferência por um tio e uma tia, que os tratava diferentemente e que gostava mais deles. Ela dizia isso pra minha vó inclusive, que sempre se defendia dizendo que gostava de todos igualmente, mas que fulana e sicrano precisavam mais dela do que os outros e só por isso ela os ajudava mais.
Ser mãe e pai requer diariamente um olhar atento para cada filho, suas características, jeito de ser e reagir ao mundo. Precisamos lidar com as fantasias e expectativas que depositamos em cada filho e como cada um vai responder a elas no cotidiano, na vida real.
Muitas vezes as comparações são armadilhas imensas que armamos para nós e nossos filhos, porque de novo cada um é um e nenhum deles está aqui para responder e/ou viver os sonhos que não fomos capazes de realizar.
Enfim, essas são apenas algumas reflexões que tenho tido e que me fazem acreditar que dizer que amamos igual e sem diferença é ao mesmo tempo uma ilusão, uma repetição e uma desconsideração com quem recebe nossa declaração.
Precisamos aprender a simplesmente amar como somos capazes de amar!
Se somos diferentes, singulares e despertamos em cada pessoa que nos cerca algo ímpar que ninguém mais desperta e o mesmo acontece com a maneira que somos tocados por essas pessoas e se buscamos diariamente nos sentirmos únicos nas relações que vivemos, precisamos aprender a demonstrar e dizer sem medo ou preocupação que amamos de formas diversas e que isso não tem a ver com amar mais ou amar menos, mas simplesmente com amar diferente.
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Precisamos olhar para um filho e afirmar que ele é único e amado exatamente por isso, que com ele aprenderemos e viveremos coisas e situações incomparáveis. Dizer que ele não é e não precisa ser igual ao seu irmão ou irmã para ser amado, mas que ele é amado por existir assim como é.
Deixar que nosso filho se sinta amado por ser quem é e de maneira única por nós, independentemente do número de irmãos que ele tenha, é ensiná-lo que o amor é da ordem do infinito e não da divisão, da comparação, do menos ou do mais. Mas, sim, da confiança, disponibilidade e da entrega que experenciamos nas relações humanas que vivemos.