“Não faça esforço para trabalhar, nem para renunciar ao trabalho. Seu esforço é seu cativeiro.”
A frase acima é atribuída ao sábio indiano Ramana Maharshi e sinto que ela me inspira tanto que eu poderia terminar este texto aqui.
Trabalho, atualmente, tem basicamente duas conotações: uma santificada, em que a maioria sente que é um lugar impossível alcançar (pense em: missão, propósito) ou uma amaldiçoada, o qual carrega um peso enorme (pense em domingo à noite) e zero realização.
Direto ao ponto
O trabalho santificado ou vocação
Sobre o trabalho santificado, como disse anteriormente neste texto, “para Max Weber, a ideia de vocação foi introduzida com a Reforma Protestante. A vocação seria, primeiramente, uma forma de projetar a religiosidade nos atos cotidianos.
Além disso, considerada a noção de predestinação e de que Deus já havia seus escolhidos ou a prática de boas obras, seria uma forma de mostrar que se pertencia a essa classe. E, acima de tudo, fazer riquezas por meio de uma vocação seria a prova da benção divina. Enriquecer era “desculpado” por ter sido conseguido por meio de uma vocação.”
Ressignificando o trabalho por intermédio de um meio termo
No livro “Criando o Trabalho que Você Ama”, Rick Jarow chama o trabalho sofrido com pressão e luta por status de “carreira” e fala de um meio termo em que sintamos realizados e, ao mesmo tempo, com o sentimento de que estamos contribuindo para isso e que isso não pese como a questão da missão, de anticarreira. Esta, por sua vez, tem por objetivo ‘criar o espaço e fazer a preparação interna que permitirá que o seu dharma o encontre’. Segundo Deepak Chopra, dharma é seguir nosso propósito, nosso caminho, nossa alegria. É estarmos alinhados com o fluxo.
A anticarreira enseja tanto um trabalho individual, que acabe também por levar à transformação do mundo e do indivíduo, como coletivo, pois, para ser realizado, depende de um trabalho conjunto. Não existe anticarreira sem interdependência.
Para isso, ele afirma serem necessárias quatro qualidades essenciais:
1) “Energia vibrante e dinâmica” – elemento fogo
É essa energia ou esse investimento (na forma de dinheiro, tempo, atenção e imaginação) que, focada, será aplicada de maneira construtiva quando você for atraído para o trabalho que inspira. Quando ela não está lá, porém, há o sentimento de que, não importa o seu cargo ou se o seu salário não é o suficiente, você sempre procurará outras compensações por meio da bebida, por exemplo.
Você deve estar se perguntando como vai manifestar esse tipo de energia se o seu trabalho está suga de você toda a energia. É por isso que, antes de falar dessas qualidades, o livro ensina técnicas de alinhamento dos chacras, caso contrário, caímos no “dinheiro sem alma”, que é o problema atual. Já falamos aqui várias vezes sobre a importância da harmonização dos corpos e, sobre isso, não há milagre: é o interno que será manifestado no externo.
Sobre o alinhamento dos chacras, Jarow diz: “se o seu foco não estiver alinhado com o impulso de seu ser, você se vê preso em um atoleiro de obsessões, desvios e síndromes de vício no trabalho que exigem a amputação de parte de você mesmo como uma condição para o sucesso.”
2) Disciplina
Já mencionei em outros textos que a disciplina é o contrário da preguiça. Para haver disciplina, que Jarow chama de “inteligência aplicada” e que envolve compromisso, consistência e versatilidade (elemento ar), precisa primeiro ter havido a energia acima ou o fogo.
Se a disciplina aparece dentro de um quadro de desalinhamento dos chacras, de maneira que sentimento e vontade estejam fora do compasso, esse desequilíbrio vai aparecer de outra forma, atraindo, por exemplo, parceiros com a qualidade que você precisa trabalhar.
É a disciplina que vai permitir que continuemos a apostar no trabalho, mesmo quando as coisas não vão tão bem. Jarow afirma: “a disciplina, a busca constante de seu projeto, cria uma pele grossa que é capaz de resistir à rejeição.” Além disso, por meio dela, o trabalho em si vira a recompensa.
Nesse mesmo texto, ele discorre sobre a importância de se ter um mentor. Assim, vale lembrar a relevância do coaching para as pessoas para as quais a disciplina não é algo fácil de alcançar, uma vez que o processo proporciona um acompanhamento de objetivos mesuráveis, com data para acontecer.
3) Servir
O servir, nesse contexto, está relacionado à qualidade de interdependência da anticarreira.
Uma distinção importante que Jarrow faz nesse capítulo é a do servir com uma conotação negativa (servil), culposa, do servir que vem de um transbordamento do coração, da autenticidade, da gratidão e do desejo de compartilhar as dádivas; um serviço que não sobrecarregue e que permita que as vidas pessoais e profissionais estejam em equilíbrio.
Um exemplo que ele oferece para clarificar essa diferença é o de vender apenas com o intuito de fazer dinheiro versus o vender com o intuito de compartilhar algo em que acredito ou que me entusiasma e, principalmente, vender com o objetivo de que aquele bem vai trazer algo de positivo para alguém. Entender que toda a troca, seja de serviços, seja de mercadorias, é sagrada por ter relação com a interdependência. Ou seja, o que eu vendo afeta o todo, inclusive a mim.
Outro exemplo é o do marketing, que parte de uma visão de abundância em vez de uma de escassez (“acaba hoje”, “último dia” etc.).
Eu, pessoalmente, substituí a palavra “servir”, que tinha um peso para mim, pela palavra “contribuir”, que é o que sinto ser o principal verbo dessa nova era.
4) Multipotencialidades e gestão interativa
Como falado anteriormente, autenticidade é uma das qualidades relacionadas à anticarreira. Mudamos o tempo todo, temos diversos interesses e o fato de sermos fieis a nós mesmos vai refletir isto.
Essa diversidade pode ser tanto de áreas como de um único interesse que é aplicado em diversas direções. Significa também descentralizar, isto é, concentrar-se naquilo em que se é bom e naquilo que faz feliz e deixar que outras pessoas façam o que as deixam felizes.
Como a natureza nos dá uma infinidade de opções para nos alimentarmos, ela também deverá ser nosso portfólio. Jarrow diz que a natureza nunca perde um emprego, porque ela tem milhões de empregos com o qual se ocupar!
Esse capítulo aborda também sobre a gestão interativa, um modelo de trabalho com ‘sistemas que promovem o alinhamento entre o amor e o trabalho’, redirecionando recursos e consumo.
Nesse sentido, não apenas o que fazemos é importante, mas como fazemos e, principalmente, onde fazemos. Assim como é para a Ayurveda, para Jarrow o lugar onde você está influencia exponencialmente nos resultados. A gestão interativa implica ainda em equilibrar o sono, o alimento, o sexo, o exercício, ou seja, ter uma “roda da vida” harmonizada.
Por onde começar?
Bom, sei que olhando tudo junto assim parece algo fora do nosso alcance. Já vou logo dar uma dica de coaching: divida as tarefas grandes em pequenos pedaços, de modo que a coisa pareça factível!
Por qual dessas quatro qualidades (ou chaves) você pode iniciar? Você pode, por exemplo, imprimir uma “Roda da Vida” e começar por aí.
Mais: de repente, você pode se dar conta de que já está fazendo um pouquinho para ativar cada uma das qualidades. Vou dar um exemplo da minha própria vida: no momento, a minha médica Ayurveda decidiu trabalhar o fogo (agni) na minha digestão com uma misturinha simples de cúrcuma, gengibre e mel antes das refeições.
Como a anticarreira é holística, sei que cuidar do fogo na minha digestão vai afetar outras áreas da minha vida. Outro dia, a médica postou que a falta de fogo se traduz em digestão lenta não só dos alimentos, mas das emoções também; e sei também que vai afetar (e já está afetando) a minha “vontade”, pois me sinto muito mais produtiva.
Como a Ayurveda tem várias rotinas, principalmente matinais, isso está conferindo disciplina à minha vida. Além disso, pela visão da Antroposofia, sei que a disciplina trabalha no corpo etérico, portanto dá energia.
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Quanto ao servir, essa é uma questão muito premente na minha vida, principalmente agora na pandemia. Arranjei uma mentora e tenho soltado a pergunta para o Universo todos os dias: “Como posso contribuir nessa nova era?”
Essa mentora está me ajudando também com o item quatro, que é a questão de direcionar minhas potencialidades. Com relação à gestão internativa, tenho procurado escutar os povos indígenas (saberes como os transmitidos por Airlton Krenak) e outras pessoas que têm essa visão de que tudo influencia tudo.
Espero, de coração, que este texto inspire você a começar.