Desde a minha infância escuto essa frase. Houve momentos em que a usei para me tornar um ser humano extremamente focado em ação e resultados. E, sinceramente, foi uma fase que não desejo para ninguém. Não da forma como eu a vivi.
Eu aprendi muito, com toda certeza. Mas aprendi muito mais sobre o que não fazer e, especialmente, o que é esse tal de perfeito.
Curioso como uma simples frase pode ser algo que a/o leva para a coerência em seu caminho ou para o oposto disso.
Eu realmente era muito, mas muito produtiva mesmo! Hoje tenho 38 anos e, pela primeira vez na vida, tirei o pé do acelerador para entender qual é de fato o meu tempo, e não o tempo considerado top das galáxias do coletivo. Níveis de perfeição ainda em análise.
Pois bem, criatura divina, foi uma infância em que eu já sabia ler e escrever antes dos 5 anos. Uma adolescência em que, se deixassem, eu fazia os projetos de ciências da turma toda. Teve uma fase em que eu treinava natação, vôlei e pedalava para tudo o que era lugar. Na primeira faculdade, nem caderno eu tinha, mas nunca aceitei notas abaixo de 8, e colar não era exatamente uma opção para mim. Terminei essa graduação tendo uma vaga de mestrado garantida, objeto de sonho de muitos microbiologistas. Mas eu só fiz minha obrigação!
Na segunda faculdade, só não entrei em mais projetos porque não era possível. Depois de formada, foram cinco pós-graduações em sete anos, entre as quais um mestrado. Detalhe: para as formações de ensino superior, só estudei em instituições públicas. No meio das minhas ações sem limite de perfeição, tive um overtraining, pois pedalava e treinava todo santo dia! E meu nível de insatisfação só crescia. Pois como eu só fazia pós, trabalhava 13 horas por dia em três dias da semana como personal, cuidava da casa, das compras e mantinha um relacionamento? Deveria já ter x, y e z situações mais estruturadas!
Como, como eu só fazia isso? Frase irônica, ok?
Ah! No meio disso também casei e descasei (risos). Não tive filhos até o momento. E usei o trabalho e o estudo como provas para o mundo do quanto o movimento constante é importante.
Conviver comigo era altamente irritante. Há quem diga que ainda é. Mas isso é intriga da oposição. A questão é que, para mim, não era só a questão do feito e do agir, mas sim de estar perfeito segundo a minha régua, e não a do outro.
E como cresci ouvindo que sempre podia fazer melhor, imagine o que é para mim um nível satisfatório.
Isso gerou um buraco enorme de insatisfação dentro de mim, pois tudo o que eu fazia podia ser melhor e era considerado pouco ou nada mais nada menos do que minha obrigação, uma vez que eu já havia me proposto a fazer.
Como se não bastasse, busquei fazer parte de grupos também focados nessa proatividade. Isso foi muito válido, mas lembra-se de que eu disse anteriormente que não desejo para ninguém?
Estar em hiperperformance me colocou num contraponto de realmente sentir o que era coerente para mim e o que era apenas obrigação com o propósito de “melhor feito do que perfeito”.
E aí vem o porquê de não desejar para ninguém a forma como fiz, pois eu deixei de sentir! Deixei de sentir a mim mesma. Deixei de viver a minha vida de acordo com o que seriam as minhas escolhas mais genuínas para sustentar e provar para o mundo que tudo, exatamente tudo, é possível se você se propor a isso.
Veja bem, de fato é. Mas qual o preço disso?
Bem, tratei muitas pessoas como meros projetos a serem solucionados, tanto pacientes como pessoas do meu contato pessoal.
Abafar o meu sentir fez com que eu me colocasse em situações cada vez mais extremas para TUDO, TUDO MESMO! Lembra-se do overtraining? Você acha que eu parei? Lógico que não! Isso me levou a ter um ruptura de musculatura da coxa durante um simples alongamento, pois meu limiar de dor (capacidade de sentir) estava totalmente alterado.
Nas relações íntimas com meu parceiro, até a habilidade de sentir prazer e chegar ao orgasmo ficou alterada. O prazer existia, mas chegar ao clímax disso virou uma missão quase impossível. Imagine o quanto isso era frustrante tanto para mim quanto para o meu parceiro!
E assim a insatisfação só foi aumentando, em igual proporção a ser mais proativa. Lembra-se dos grupos, certo? Então, se eu não atingisse o resultado almejado, era porque ainda não tinha feito de tudo e provavelmente estava me sabotando em algum nível.
Nossa! Como eu aprendi! E como isso soa altamente incoerente hoje para mim.
Definitivamente essa máxima, que já foi uma verdade para mim, hoje é motivo para eu rir de nervoso.
Hoje entendo que não é “go, go, go” frenético. Não é a quantidade, nem a constância, nem muito menos a perfeição ou a imperfeição.
Enquanto a ação não estiver em ressonância com o sentir genuíno, serão apenas ações.
Veja bem, não estou propondo a procrastinação, mas sim uma autoanálise das suas ações e uma análise do quanto estas estão alinhadas com a sua verdade, com o seu tempo e com a sua percepção de perfeição.
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Continuarei a ser uma adepta do movimento, pois ele nos traz, das mais variadas formas, a consciência da vida. Mas movimento sem sentir amor, prazer, leveza e coerência com a sua essência é só um cumprimento de protocolo.
O convite é que essa máxima “melhor feito do que perfeito” faça, sim, parte da sua vida, mas de uma forma revisada, em que o sentir seja o guia para que você possa confiar, fazer, entregar e soltar.
Espero que tenha feito sentido para você e ficarei muito feliz caso queira compartilhar seus insights comigo.
Um super abraço,
Mari de Carvalho.