Do lado sombrio da minha existência, talvez permaneçam ócios incubados sobre expectativas desvencidas. Sobre invenções não levadas adiante. Sempre tive taras a neologismos, emblematizações categóricas com noções desprovidas de sentido num primeiro momento. Não há como ser de fácil compreensão o código que poucos conseguem decifrar. Não se trata de ser a soma de metamorfoses, mas o incremento de sensações. A descontinuidade de princípios que foram sequer premeditados. Um despropósito monumental de existir.
Nas capas robustecidas de glória sobre meu futuro planejado, inferi despromessas ao amar em plenitude o que eu estava disposta a não ser. Aos ideais negados e à presunção de mudança colocada em prioridade. Ser anarquista frente às próprias estagnações, amanhecendo com a imprevisibilidade de quem se permite nascer a cada dia de forma destoante a de outrora. Não ser, pois, tendência, para que o vanguardismo tome outra significação. Para que seja pura miscelânea de roteiros inacabados, a somar-se rotineiramente por ocasiões unas e improváveis, repletas de loucura e embriaguez pelo novo.
Ao revisitar minhas antigas paixões, reconfiguro ordenamentos e perspectivas. Inovo semblantes e reafirmo velhas concepções. Dentro de todas minhas mudanças, há resquícios imutáveis de amor ao vivido, de paixão pelos impulsos. Ao tudo que se abstém com as gírias tendenciosas, convenço-me sobre lápides precocemente concluídas. Frases antecipadamente constituídas sobre metamorfismos incongruentes. Sobre incertezas que, imaturas, assumem o lugar de certas. Não há como reviver sem problematizar. As inferências são o gás necessário às metas que se renovam toda vez que nos permitimos desabrochar.
Na retenção dos traumas, ensurdeço minhas possibilidades de ir além. A referência é positiva apenas no contexto da causalidade apreciativa, ou mesmo da busca pelo que agrega. Meu acervo é revisitado à medida que procuro exemplos rechaçados. Que reestabeleço ordens de amor a serem seguidos àquilo que, em algum momento da vida, possa ter sido enterrado sem a real necessidade. Ser impulso não é agressividade, mas pressa em viver. Agonia por estar ciente de que há muito a ser feito e pouco tempo para que seja realizado. Nossos parâmetros jamais se adequarão ao tempo. Somos mutação em forma de permanência.
Todo o ato seletivo configura uma forma preestabelecida de convencimento. De alguma forma, temos sempre de dar preferência. Não há como reviver todas as experiências numa única história. A fragmentação da rotina é a forma didática de viver por acaso. Caso contrário, incorreríamos sobre o perigo do desgaste e da perda ainda maior de detalhes. Já perdemos tanto pelo caminho, seria uma pena termos de saborear tudo de uma só vez.
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O passar dos dias é a conta ideal para a deslegitimação de palpites. Para o descarte dos registros maldosos que fazem de nós a todo o momento. Somos figura pormenorizada pelo externo na maior parte do tempo. Mesmo sendo concepção holística de um todo que só funciona graças à perspectiva relacional, constantemente somos diminuídos à escala de peças. Reviver paixões é convencer-se de que sentimentos não são possíveis em marionetes. E é dessa forma que vamos quebrando barreiras e criando espaços. Nosso tempo é o agora, que não é consequentemente uma continuidade do que veio antes.