Quem nunca se sentiu culpado por dedicar muito tempo ao trabalho e pouco à família, dedicar tempo aos estudos e por isso não conseguir marcar aquele encontro com os amigos ou, ao contrário, sair com os amigos e por isso não conseguir estudar? Quem aqui já exagerou na comida e sentiu culpa por ter saído da dieta, terminou um relacionamento e sentiu culpa por ver que o outro sofria com o término ou, ao contrário, não terminou o relacionamento e sentiu que a culpa por não estar feliz era sua falta de ação? Alguém já sentiu culpa por exagerar na bronca com o filho, por ter sido permissível demais com ele ou, ao contrário, por ter sido rígido demais?
A culpa nos é familiar, mas de certo modo um pouco difícil de descrever com exatidão o que é, pois muitas vezes aparece em concomitância a outros sentimentos, como o remorso, o medo e a vergonha. Talvez por isso seja ainda mais difícil de lidar.
A vivência da culpa vem sempre seguida de uma experiência de conflito, seja eu comigo mesmo, com o outro ou com o mundo. Um conflito entre o desejo e a ação.
No livro “A presença do sentido”, Guto Pompéia e Bile Sapienza contribuem lindamente para pensarmos a culpa, onde dizem: “… Vou sentir que pelo que fiz ou pelo que não fiz, fiquei também em dívida para com o mundo”.
Assim, é bastante comum nos expressarmos dizendo “Devia ter feito diferente” ou “Não devia ter feito isso”. Dever nesse sentido é aquilo que precisava ter sido feito ou não, mas dever também é dívida.
A culpa reflete de algum modo a nossa incapacidade de dar conta de tudo, essa dívida da qual estamos falando, por isso, sempre estaremos em dívida. Assim, podemos pensar que sempre haverá uma brecha para nos sentirmos culpados.
Quando nos sentimos culpados, muitas vezes buscamos justificar nossa falta, nossa dívida, ou então, buscamos o perdão do outro, certo? Seria insuficiente pensar que o perdão do outro é suficiente. A busca pelo perdão do outro, na verdade, busca retirar a nossa culpa, busca o perdão de si.
Só sentimos culpa porque queremos realmente ser a completude que tanto desejamos, sem disposição de abrir mão de nada. Retomando aos questionamentos iniciais do texto, queremos trabalhar e também estar com a família, estudar e sair com os amigos, sair da dieta e mesmo assim alcançar os objetivos. Será mesmo possível?