As nossas personalidades são fixas ou maleáveis? Em que grau? Essas são questões que os filósofos e neurocientistas vêm tentando entender há alguns anos. É confortável atribuir as nossas incríveis qualidades ao nosso jeitinho de ser. Isso nos deixa preguiçosos, e nos ajuda a procrastinar a mudança.
No entanto, quando ficamos inconscientes ao fato de que podemos mudar as nossas inclinações naturais até certo ponto, que nós realmente podemos mudar a maneira como os nossos cérebros disparam sinais, acabamos optando por continuar a viver nos padrões que desenvolvemos na juventude, e assim nunca crescemos.
“Neurônios que são estimulados juntos, trabalham juntos” essa é a única frase que resume a teoria Hebbiana. A ideia de Donald Hebb é que por meio das ações repetitivas, os neurônios se conectam para se tornarem engramas, ou estruturas permanentes do cérebro.
O termo moderno é neuroplasticidade, e a ideia é que o cérebro pode criar novos caminhos neurais para se adaptar às “zonas de conforto”, e esse é provavelmente um dos conceitos mais cruciais e subutilizados para a autorrealização.
Em outras palavras, você se torna o que você pratica. Você chega aonde estava indo. Em último caso, se a sua vida se resume ao que você faz todos os dias, então a verdadeira mudança está no ajuste de pequenos hábitos. Embora isso nem sempre seja instintivo. É uma crença comum que a força do hábito nasce da monotonia e da falta de caráter. Muitos filósofos, inclusive, idealizaram uma existência livre de hábitos. Alva Noë da National Public Radio acredita que isso seja um engano. Ela argumenta:
Goethe disse que a arquitetura é uma música congelada. Na verdade, a arquitetura é um hábito congelado. Uma existência livre de hábitos seria uma existência robótica; em que nada poderia ser garantido. Mas se nada pode ser considerado garantido, você não pode começar nada. Como você poderia falar, se não pudesse ter a sua própria fluência, ou seja, como poderia ter o domínio das palavras, seus significados e modo de falar, se isso não pudesse ser garantido? Como você poderia ler o jornal? Imagine que você teria que pensar e decidir onde colocar o seu pé pela manhã! Sem os hábitos não seria possível reconhecer um humano ou até mesmo um animal. Para ter uma mente como a nossa, você precisa de hábitos como os nossos.
É claro que não se trata de tentar eliminar os nossos hábitos e inclinações, mas sim de estruturá-los, a fim de servir os nossos objetivos.
Se você quer ser criativo, você precisa treinar o seu cérebro a se sentir confortável com a criação. Se você não quer mais misturar o relacionamento que você tem com os seus pais com o seu esposo, você precisa treinar para isso. Se você quer se ver livre dos pensamentos negativos ou se importar menos com o que as pessoas pensam, você precisa escolher fazer isso antes que se torne a sua segunda natureza.
Ao que parece, as nossas batalhas internas mais profundas podem ser simplesmente as nossas escolhas conscientes indo ao encontro da nossa atual estrutura neurológica.
O psicólogo e filósofo William James escreveu O Hábito em 1887, e foi um dos primeiros a explicar como os padrões comportamentais moldam o que nos referimos como caráter e personalidade mais do que imaginamos. Em uma das passagens mais bonitas, ele explica o dom do hábito assim:
O hábito é o enorme volante da sociedade, é o seu precioso agente conservador. Sozinho é o que nos mantém dentro dos limites da ordem, e salva os filhos da fortuna das revoltas invejosas dos pobres. Sozinho, ele impede que as mais difíceis e repulsivas caminhadas da vida sejam abandonadas por aqueles que foram trazidos para trilhá-la. É o que mantém o pescador e o marinheiro no mar durante o inverno; mantém o minerador na sua escuridão, e mantém o homem do campo na cabana de sua fazenda solitária durante todos os meses de neve; é o que nos protege da invasão dos nativos do deserto e da zona congelada. É o que nos condena a lutar na batalha na vida sobre as linhas da nossa criação e escolha precoce, a fazer a melhor perseguição que discordamos, porque não fomos equipados para nenhuma outra, e é tarde demais para recomeçar. Ele evita a mistura de diferentes classes sociais. Já nos vinte e cinco anos você já vê o maneirismo num jovem comerciante viajante, num jovem médico, num jovem ministro, num jovem conselheiro de direito. Você vê as pequenas rachaduras no caráter, nos truques de pensamento, nos preconceitos, na maneira de “comprar” com uma palavra, de um homem que depois de um tempo não pode mais fugir da manga de seu casaco que de repente pode cair num novo conjunto de pregas. No fim, é melhor que ele não escape. É bom para o mundo que a maioria de nós, com a idade de trinta anos, o caráter tenha se definido como gesso, e que nunca mais volte a amolecer novamente.
No entanto, apesar de tudo isso, há algo inerentemente atraente sobre fazer uma profunda e radical mudança. Nós nos imaginamos sendo felizes, ainda que não possamos entender como escrever algo que nos fez feliz a cada a dia possa realizar essa mudança. Embora, seja apenas um efeito momentâneo. É o mesmo conceito do porquê organizar as suas coisas, ou do porquê seu subconsciente tem uma tendência a controlar a sua vida mais do que as suas escolhas conscientes são capazes: o que você faz repetidamente molda quem você é. Aqui, B.J. Fogg explica exatamente como isso acontece.
Você tem mais controle sobre a sua vida do que imagina. Muitas vezes, não se trata de se esforçar para descobrir o que não se pode controlar — mas sim de querer ter o controle. Quando assumimos que estamos indo ao encontro das nossas inclinações, passamos a adaptar nossas maneiras numa façanha quase impossível. Quando reconhecemos que as nossas ações vão construir e se adaptar a nós mesmos, percebemos que não é uma questão de saber se podemos ou não fazer alguma coisa, mas sim se teremos a disciplina para fazer.
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Sua mente será como seus pensamentos habituais; pois a alma se torna tingida da cor de seus pensamentos. Portanto, encharque-a com correntes de pensamento bons, como, por exemplo: onde a vida é mesmo possível, também é possível uma vida correta.
Marcus Aurelius
Texto escrito por Amanda Magliaro Prieto da Equipe Eu Sem Fronteiras.