O cantor e compositor Cazuza, de forma poética, criticou a necessidade humana de prender-se a ideologias.
Parece, realmente, que existe uma ânsia no indivíduo em fazer parte de grupos, tribos etc., pois a grande maioria das pessoas busca por definições de si mesma. Poucos percebem que aquele que precisa de alguma ideologia para definir-se não é livre, pois liberdade pressupõe ausência de definição. Você só poderá ser livre longe dos uniformes, das etiquetas, dos rótulos, das facções, dos partidos etc. A liberdade vai exigir um total desinteresse pelo mundo.
Quem dera pudéssemos todos dizer que não temos partido, que perdemos as nossas ilusões, que vendemos os nossos sonhos, como explica a letra do poeta, tudo isso seria a tradução mais pura da liberdade.
Quem dera pudéssemos pagar a conta do analista e desistir da ideia absurda de descobrir quem somos, pois não existe armadilha maior.
Aquilo que sou não é algo para ser identificado através de uma busca psicoterapêutica. Quem eu sou é algo para ser vivido na total ausência de definições. Como posso definir, limitar ou estreitar o infinito?
Cazuza, quando escreveu essa letra, estava em processo de despertar de consciência, talvez nem ele se desse conta. Parou de querer mudar o mundo e passou frequentar as festas, esse é o caminho. Não sei porque ele cantava com tanta melancolia essa música, pois a ideia de festa está muito próxima da ideia hinduísta de tratar a vida como uma brincadeira do divino (Leela).
O mundo tem a sua própria agenda, é loucura pensar que podemos mudar alguma coisa. Na verdade, a gente só veio aqui para testemunhar; a mudança ocorre com ou sem a nossa participação, pois existe uma Lei Natural de Evolução que não precisa do nosso consentimento para agir. É preciso negar aquilo que nos deixará vinculado a esse mundo, pois é aquilo de ligardes na Terra será desligado no céu e vice-versa, como está escrito.
Estamos aqui para perdermos a identidade que criamos com o corpo e a mente, mas tudo o que as ideologias fazem é apenas reforçar uma identidade.
“Eu me identifico com a religião tal, com o pensamento tal, com tal pessoa” e assim por diante.
O que esses pobres incautos não percebem é que estão se transformando em meras fotocópias, pois passam a se vestir, falar, pensar e agir de forma programada, sem perceber que estão se ajustando a um mundo doente.
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Herman Hesse estava certo ao dizer que, aquele que não se encaixa no mundo, está mais perto de encontrar a si mesmo.
Por que essa ânsia primitiva de querer fazer parte de tribos ainda é tão forte na humanidade? Será que ainda somos influenciados por instintos? Só isso explicaria, pois é algo absolutamente primário. Estamos no limiar de um novo milênio, mas ainda agimos e pensamos como os nossos primatas. O homem precisa aprender a se bancar, ser quem ele é, seja lá que o for.
Termino esse texto fazendo uma homenagem a dois dos maiores letristas da minha geração: Cazuza e Arnaldo Antunes.
Ideologia, não quero uma pra viver. Minha tribo sou eu!