Aprendi a treinar meus ouvidos à música clássica, ainda bem pequenina…
Tudo começou porque eu tenho dedos cumpridos e ouvia as pessoas dizerem que eu devia ser pianista.
Mas mamãe me mostrou a realidade e disse que não podia me dar um piano e sugeriu que eu fizesse aulas de balé no Conservatório Musical da minha cidade natal.
Então, com meus 5 aninhos, vestida num pequeno collant preto, com minhas meias e polainas rosa-bebê, minhas minúsculas sapatilhas e com um cuidadoso coque no alto da cabeça, que teimava em desmoronar, segui feliz e contente segurando pela mão de meu pai.
Assim, devidamente paramentada, pude ouvir as primeiras notas musicais vindas de um suntuoso piano de cauda.
Este que ficava no canto de uma sala enorme, pelo menos naquela época eu achava ela muito espaçosa. O chão era de sinteco em madeira, muito lustroso, sem nenhum desnível ou imperfeição e tinha um retângulo desenhado com madeiras mais claras marcando o centro da sala. Nas paredes, haviam arandelas acessas, o que chamam atualmente de meia luz, dando um ar de aconchego misturado à sofisticação. As janelas eram grandes, emolduradas a madeira e com vidros recortados em quadradinhos absolutamente limpos. Nas portas, uma moldura em gesso e a cor da sala era um amarelinho, hoje chamada de off-white. O cheiro… esse era indescritível.
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Bom, mágico mesmo foi o momento quando adentrou a essa sala uma senhora com seus cinquentas e poucos anos, vestida com uma calça preta colada às pernas, com uma blusa de gola rolê embaixo, com um cardigã cor vinho, seu cabelo era preso em um impecável coque, calçava sapatilhas e usava óculos de armação grande, quadrada e rosa.
Ela se sentou ao piano, ajustou o banco à sua altura, levantou a tampa do teclado e espichou seus cumpridos dedos em direção às teclas pretas e brancas… um som maravilhoso saiu de dentro daquela grande caixa de ressonância.
Essa era a minha professora de balé, era estrangeira, de nacionalidade italiana, tinha um sotaque delicioso de se ouvir, era gentil, mas não menos exigente. Além disso, portava uma varinha nas mãos, que ardia no bumbum das pequenas bailarinas desavisadas que saíam da postura antes do permitido.
Ela tocava para nós durante as aulas, até hoje não entendo como tinha olhos para duas coisas que exigem atenção ao mesmo tempo: tocar piano e ver os saltos que tínhamos que fazer na diagonal, de uma extremidade a outra da linha marcada no chão com a madeira mais clara, os quais, muitas vezes, não saíam exatamente como ela desejava. Quando isso acontecia, ela interrompia a música abruptamente e vinha até nós e erguia nossas pernas até acima das nossas cabeças; o ‘aiii’ podia ser apenas mental.
Lembrei-me de tudo isso agora enquanto escrevia essas linhas apenas ouvindo as mesmas músicas que ouvia há 4 décadas. A música tem o poder de nos carregar a algum lugar ou de nos fazer viajar no tempo. E só fechar os olhos e sentir…
Assim, dia após dia eu aprendia as posições do balé e também sobre os compositores daquelas músicas que ditavam o ritmo e dava graciosidade à dança.
Strauss, Bach, Beethoven, Verdi, Schubert entre outros, porém os meus prediletos sempre foram, Chopin e Mozart.
Tive um reforço no meu gosto musical quando, na pré-adolescência, passava férias na casa de meu tio e ele ouvia música clássica o tempo todo. Esse era o repertório de fundo em seu escritório, onde permanecia muitas horas trabalhando ou enquanto dirigia longos percursos, visto que ele morava na grande São Paulo. Hoje, só me resta agradecê-lo essa oportunidade e influência.
Gosto também de outros ritmos, sou bastante eclética, percorro e me adapto sem problemas da música clássica ao rock, passando pelo samba, country e sertanejo, MPB, bossa-nova, eletrônica e pop rock.
A música clássica, no entanto, é aquela que tem o poder de abrir o compartimento da minha mente onde fica armazenada a criatividade, as ideias e tudo mais que uso para criar o meu mundo mágico e, assim, ter acesso às crianças quando aplico Educação Nutricional.
Certa vez, li que bebês que escutassem as músicas de Mozart durante o quinto mês de vida intrauterina poderiam desenvolver maior capacidade intelectual. Hoje, é sabido que não há estudos que comprovem essa teoria.
Mas eu escutei.
E, depois, foi constatado por mim mesma que meus bebês dormiam um sono tranquilo, sempre tiveram uma capacidade de concentração bastante relevante na hora de montar blocos, possuem memórias excelentes e são bastante criativos. Além disso, a capacidade auditiva foi muito estimulada (escutam até aquilo que não precisam) e expressam com facilidade as suas emoções.
Acho que foi benéfico.
E utilizo com eles a mesma técnica que meu tio usou comigo.
Fiz uma playlist, coloquei no áudio do carro e, quando ligo, já surge uma miscelânea das nossas músicas, não apenas as clássicas, pois tem Beatles, Queen, U2, Roxette, ABBA, Marisa Monte, Bete Carvalho, Tiago Iorc, Cazuza, Sandy, Alcione, Zé Ramalho, Titãs, Jota Quest, Shakira… e Roberto Carlos. Meus filhos até cantam junto comigo…
Sim, nós podemos escolher nossos cantores e músicas preferidas e, com isso, nossos ouvidos e nossa mente, com certeza, agradecem.