Autoconhecimento Comportamento Convivendo

A viciada

Imagem de fundo preto em destaque as palavras: Virtude ou Vício escritas em caixa alta na cor branca.
Plherrera / Getty Images Signature / Canva Pro
Escrito por Nina Veiga

O termo “viciante” é explorado de forma crítica, refletindo como as séries podem se tornar uma forma de escapismo, onde as pessoas buscam refúgio em narrativas fictícias para evitar os desafios da vida real. A reflexão aponta para o impacto desse comportamento, questionando se o espectador realmente vive a plenitude da vida.

Dia desses, estava na fila do banco quando escutei duas jovens conversando sobre uma série da Netflix. Uma disse que não estava acompanhando, ao que a outra respondeu: “Assiste! É viciante”. Fiquei intrigada com o adjetivo utilizado: “viciante”.

Até então, para mim, “viciante” era uma coisa a se evitar. “Viciante” era algo ruim, algo de que tínhamos de nos manter afastados. Se, por acaso, caíssemos em “vícios”, seria necessário tratamento, que poderia ir do autocontrole à internação, passando pelos mais diversos programas anti vício. Por isso, quando escutei o comentário animado fazendo do adjetivo nefasto um sinônimo de elogio, estranhei. Mas afinal, o que se elogia, quando se qualifica uma série de “viciante”?

Um estudo, publicado no livro da americana Jean Twenge, mostrou que a geração smartphone (Geração Z, nascidos entre 1997 e 2010) usa menos drogas, lícitas ou ilícitas, consome menos álcool e faz menos sexo do que as anteriores. Diz a autora: “Eles não têm grandes expectativas como as que tinham os millennials (a geração dos nascidos entre 1981 e 1996)”, compara. “Eles estão mais preocupados em estar física e emocionalmente seguros. Bebem menos e não gostam de riscos”.

Imagem de vários adolescentes sentados rolando seus smartphones. Retrato da geração Z, totalmente cibernética e de conexão on-line.
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Talvez, o vício em série seja um vício em se esconder do mundo, em evitar a dor de viver. Neste sentido, o vício em série se equipara aos demais vícios que se instalam na posição de anestesiadores do viver.

Alguém viciado em uma série turca, por exemplo, com mais de 40 episódios de 2h40 de duração. Garante muito tempo de anestesia. Muito tempo de morada em um lugar sem riscos. Lugares ficcionais, onde os perigos, os amores, as vidas são vividas. Vidas que se acompanham, mas não se vive.

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Seguir séries é tornar-se espectador. As questões que se movimentam nesse contexto então são: será possível coexistirem numa só pessoa o viver e o ser espectador? Que vida é essa de ser espectador? Será que, como espectador, eu vivo a plenitude da vida?

Sobre o autor

Nina Veiga

A artemanualista e ativista delicada Nina Veiga é doutora em educação, escritora, conferencista. Sua pesquisa habita o território da casa e suas artes, na perspectiva da antroposofia da imanência. É idealizadora e coordenadora do coletivo Ativismo Delicado e das pós-graduações: Artes-Manuais para Educação, Artes-Manuais para Terapias e Artes-Manuais para o Brincar. Desenvolve trabalhos de formação de artífices e escritores. Suas oficinas associam o saber teórico-conceitual às artes-manuais como modo de existir e à escrita como produção de si e do mundo.

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