Existe direito à esperança?
Hoje o dia amanheceu frio e cinzento feito meu coração. Machucado, ele não bate com tanta força. Enfraquecido, pede socorro. Alguém me ajude, por favor! A vida tem que seguir, afinal o pulsar do sangue que continua correndo no corpo avisa que não se pode parar. Mas como continuar acreditando? Como olhar o mundo com os óculos do arco-íris quando tudo o que restou precisa ser reconstruído? De queda em queda, ganhamos experiência para não cair de novo, porém as cicatrizes nos lembram o quanto o tombo foi dolorido e que todo cuidado ainda é pouco. Sorrir é tão difícil. O riso amarelo está contido aqui, pela falta de vontade e confiança de olhar em volta e dizer… sim vou recomeçar! Eu preciso mesmo de um milagre, que faça brotar em mim a esperança novamente. A esperança daquelas tardes com chuvas passageiras que só fazem barulho. Preciso aprender a tropeçar sem medo de cair. Mas o que eu mais necessito e almejo é a busca por mim mesma. Poder respirar com todo ar que entre nos pulmões e que me purifique de todo esse mal. Me livre de toda a falta de confiança. Que invada meu peito e retire de lá cada cantinho embolorado que ficou sem ter que ficar. Preciso saber entender e viver com as pequenas frustrações do dia a dia, como me disse um amigo um dia desses. Eu preciso olhar para fora de mim, colocar forças naquilo que realmente vale a pena e parar de ficar com correntes de desesperança. Vai passar, é tudo o que eu preciso pensar agora. A eternidade está logo ali, basta esticar os braços curtos e eles viram elástico. O cheiro das flores, o calor do sol, o vento nos cabelos, tudo isso está prometido, virá, sei que virá! E a vida? Já dizia o poeta… “é bonita, é bonita e é bonita!”.
Paliativos são necessários em alguns momentos. Precisamos deles para suportar. Mesmo sabendo que são os últimos recursos, eles aliviam a dor e dão o conforto necessário para o mínimo de dignidade. É difícil compreender o antagonismo principal, tema central deste artigo, vida e morte, morte e vida. Um tempo “perdido” que não volta mais, a vida acontecendo em flashes rápidos, nossa infância e adolescência sendo “chipada” e nada do que fizermos pode mudar essa realidade. Apesar da pandemia, ela não mudará. Esses seres já vieram assim, “chipados da Fonte”, e viverão atrás de telas, na certeza de que estarão mudando a atual progressão dos fatos. E estarão mesmo. Mas voltando ao paliativo, é quase isso, vivem sem dor, num mundo à parte, nada pode atingi-los além de uma derrota virtual. E eles tampouco se abalam por isso. Ao contrário, montam estratégias de contra-ataque até achar o ponto fraco do oponente. Entre mortos e feridos, no fim salvam-se todos. Mas o paliativo é quase isso, explicado em outras palavras, é um mundo paralelo onde a dor é capaz de ser amenizada. É como perguntar :
— Existe direito à esperança?
E se a resposta for sim, algumas doses de drogas potentes podem ser ingeridas e levadas ao mantra do corpo, para que, absorvidas, alucinem e curem. Mesmo que não seja a cura, fará do fim algo mais colorido e não mais preto e branco. Olhar em volta e ter esperança é o único de uma lista de desejos que não pode nunca acabar. E vejam que interessante a descrição para paliativo:
“A Organização Mundial de Saúde o define como o tratamento completo e ativo de pacientes, cujas doenças não mais respondem a tratamentos curativos; portanto, o objetivo principal é conseguir controlar a dor e outros sintomas, bem como problemas psicológicos, sociais e espirituais”.
Fonte: Tratamento Paliativo
E ainda segundo essa mesma fonte:
“Há um ditado do século 16 que resume essa ideia: “Cure algumas vezes, alivie frequentemente, conforte sempre”.
Confie e tenha esperança, essas são minhas palavras por hora! Tenham fé, aquela capaz de mover montanhas!
Uma vez que as pessoas têm diferentes crenças religiosas, assim como necessidades espirituais, o cuidado espiritual é configurado para atender as necessidades específicas de cada indivíduo, isso inclui ajudar cada um a encontrar o significado da finitude, permitindo que ele se despeça ou ainda realize algum ritual ou cerimônia religiosa. Mas quem na finitude da vida, ali dentro de uma U.T.I. ou preso a um leito doméstico, lembraria de um rito ou de uma despedida quando tudo o que desejava é continuar vivendo, pelo menos na maioria das vezes, eu creio. Mas a bondade do criador é infinitamente amorosa e antes de devorar mais um de seus filhos, Ele o abraça e o acolhe em seus braços e a prece final é apenas de socorro ao Pai. Dali em diante o paliativo entra em ação de forma quase irreversível e somente um milagre pode mudar o rumo das coisas. Assim as horas vão passando e a viagem de regresso começa a acontecer. O esquecimento vai preenchendo cada célula e fazendo os órgãos falirem, até que finalmente o coração para de bater. Chegou a hora de voltar para casa. De ser acolhido nos braços do Pai, de virar criança novamente e reaprender. Paliativo como a cura, nossa esperança nasce novamente e cremos que tudo agora será diferente, mais bonito e verdadeiro. Que teremos melhorado e seremos outros seres. Em outros corpos físicos, outras famílias, outras espiritualidades e crenças, apenas temos que seguir acreditando.
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E o Pai maior, o criador e modelador de almas segue a produção infinita com a misericórdia do esquecimento, para que no regresso possamos acreditar com esperança na cura que outrora se findou!
E tudo o que temos a dizer é “eu creio, obrigada, Pai, por mais essa oportunidade para acertar” e o ciclo da vida que se rompeu começa novamente e novamente ao longo dos séculos.
Se paliativo pudesse ser um termo mais bonito, com certeza seria esperança.
Sigamos!