A vida viva vive. Escreveu o título e ficou a pensar no que significava. A vida viva vive. Gostava de começar pelos títulos, mas nem sempre o restante do texto se compunha de imediato.
Ficou ali, a olhar os vês: vê – i, vê – a, vê – e. Vida viva vive. A frase como um vento soprando na cabeça vazia. A vida viva vive. Um substantivo, um adjetivo e um verbo precedidos de um artigo definido. Definido? Aquilo o incomodou. Talvez ficasse melhor se usasse um artigo indefinido. Uma vida viva vive. Incomodou-se também. Uma ou a? Se fosse a, pareceria uma sentença definitiva, uma abstração. A vida como todas as vidas.
Não era isso que queria dizer com vida viva vive. No entanto, se ficasse Uma vida viva vive, daria a sensação de que só aquela vida, aquela uma, a viva, e nenhuma outra, vive. Seria isso? Os olhos olhavam, as perguntas perguntavam, mas a cabeça, ainda mais vazia, só ventava. E o vento soprava, vês, vis, vas. Uma vida, a vida. Talvez mais importante do que o substantivo precedido de seu artigo, fossem o adjetivo e o verbo: viva vive. Viva poderia receber um ponto de exclamação e faria toda a diferença: Viva! Começava a delirar. Era sempre assim, quando a escrita travava, o delírio se intensificava.
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Delirava entre vas, vês, vis. Afinal, o que queria mesmo dizer? ______ silêncio. Respirou um pouco mais profundamente e voltou-se novamente para o título: A vida viva vive. Deixaria o artigo definido, não tinha forças para indefini-lo. Às vezes, pensava que era mais difícil indefinir do que simplesmente definir. Eis o título: A vida viva vive. O vento soprou mais uma vez, levando os últimos pensamentos, vês… O que era mesmo que queria dizer na crônica que escreveria com esse título? A cabeça vazia ecoou: A vida viva vive.