Autoconhecimento

Amor platônico — Compreenda este fenômeno

Pessoa contornando com suas mãos um coração feito de flores
Amy Shamblen/Unsplash
Escrito por Eu Sem Fronteiras

Popularmente, quando alguém deseja falar de um amor inatingível ou impossível se refere a ele como sendo um amor platônico, mesmo sem saber muito bem o que de fato isso significa, de forma equivocada e muito diferente do que o filósofo grego Platão — de onde vem o adjetivo “platônico” — postulava a respeito do amor. Compreenda esse assunto!

Quem foi Platão?

Platão foi um filósofo e matemático grego, nascido em Atenas, aproximadamente em 428 a.C. e morreu aos 80 anos, provavelmente no ano 348 a.C., tendo como principais interesses a Filosofia, a Dialética, as Artes, a Literatura, a Educação, a Justiça, a Virtude, a Política, a Epistemologia e o Militarismo. Ele foi o fundador da Academia de Atenas, a primeira instituição de ensino superior do mundo ocidental. Recebeu influências ideológicas de Sócrates, Homero, Hesíodo, Aristófanes, Parmênides, Pitágoras e Heráclito, entre outros. Influenciou a maioria dos filósofos como Plutarco, Aristóteles, Cícero, Maquiavel, Descartes, Hobbes, Schopenhauer, Nietzsche e muitos outros.

Platão realizou muitos estudos e desenvolveu muitos textos e “diálogos”, entre eles “O Banquete” no qual desenvolveu a sua concepção sobre o amor, base do termo “amor platônico”.

O amor, segundo Platão

Coração em formato de folhas em um carro
Roman Kraft/Unsplash

O amor, para Platão, é uma fonte de motivação, é essencialmente puro, não se fundamenta num interesse, mas na virtude, e não se baseia em paixões, pois estas são materiais, passageiras e falsas. É o ideal e perfeito.

É importante ressaltar que Platão seguia os princípios do dualismo, corrente filosófica na qual a realidade é formada por duas “substâncias” que nunca se misturam: o espírito e a matéria.

Segundo Platão, o amor surge a partir do desejo de descobrir e admirar a beleza, que começa pela beleza física, progredindo até a beleza espiritual e avançando à admiração pura, já desprendida da beleza material, num estágio mais elevado.

Com base no postulado de Platão, podemos perceber que o amor platônico não é inatingível ou impossível, sendo o contrário, porque é profundo, amplo e completo. Ele parte da beleza física que é material e deve transcender, sendo difícil de alcançar, mas não intangível. Ele não é orientado especificamente às pessoas. Veja esse trecho do discurso dele, extraído de “O Banquete”:

“Deve considerar mais valiosa a beleza das almas que a beleza do corpo, de modo que se alguém for virtuoso na alma, ainda que tenha uma aparência não desejável, já será suficiente para amar, cuidar, cultivar e buscar ideias tais que façam melhores os jovens, para que seja obrigado, uma vez mais, a contemplar a beleza que reside nas normas de conduta e a reconhecer que todo o belo está relacionado entre si, e considerar dessa forma a beleza do corpo como algo insignificante.”

Entendendo a beleza, na concepção de Platão

Duas pessoas segurando conchinhas formando um coração
Aaron Burden/Unsplash

Quando conseguimos identificar a beleza, surge em nós o amor, que vai nos mover a conhecer e a contemplar. É um processo, com fases graduais e evolutivas, em que a beleza está sempre presente:

Beleza física — é a primeira fase e começa com o amor direcionado a um corpo belo em particular, mas evolui para apreciar de forma mais ampla a beleza geral. Com base no trecho de Platão, podemos perceber que o conceito de beleza é subjetivo, para o qual não há um padrão estético predefinido.

Beleza da alma — uma vez transposta a primeira fase e se “apaixonar” pela beleza física, a próxima etapa é conhecer o “interior”, ou seja, os aspectos morais, éticos, culturais, espirituais, as crenças e os valores, o universo interno da pessoa, a alma.

Beleza da sabedoria — conhecida e apreciada a beleza da alma ou do espírito, o amor progride para a fase de conhecer e apreciar a beleza das ideias, do conhecimento e muito além da pessoa em si. O amor nesta etapa transcende da matéria.

Beleza pura — nessa fase, o amor está livre de qualquer sujeito ou objeto. Ele se refere ao propósito do amor em si, pela sua beleza de ser, pela possibilidade de ser sentido. É a etapa de amor supremo, transcendental e intransitivo, que não se altera, não se corrompe, porque é entendido como para a eternidade, universal e essencial.

Como surgiu o conceito atual de amor platônico?

Homem e mulher sentados em um banco olhando para o mar
Charlie Foster/Unsplash

O conceito de amor platônico da forma como é entendido atualmente, surgiu pela primeira vez com Marsílio Ficino (filósofo humanista italiano), no século XV, caracterizado por ser um amor concentrado na beleza do caráter da pessoa, na inteligência e não na aparência física, relativo ao plano das ideias, incorruptível e perfeito, até então muito relacionado ao postulado por Platão.

Por ser um amor perfeito, ele acaba por ser inatingível em nosso mundo, pois não há pureza suficiente, ainda não nos libertamos de amar segundo nossos interesses, não atingimos o amor na virtude. Não vivemos num mundo perfeito; ele é material, portanto esse amor é uma ilusão.

Então, o amor platônico é idealizado: um sentimento romântico que se tem pelo outro, sem que se possa, por qualquer razão, alcançá-lo e, sendo assim, não é físico, não há desejo e nem vínculo sexual. É excludente e, desse ponto de vista, solitário.

No conceito de Platão, o amor busca e precisa do belo, que é igual ao justo, ao bom e ao verdadeiro.

O amor platônico, segundo Platão, é a busca pela parte da alma que nos falta e que o outro tem a oferecer, porque é a representação para nós da beleza, da justiça, do que é bom e do que é verdadeiro. Então, ele não é de fato inatingível ou impossível, e sim representa uma jornada, um recurso, que pode incluir o desejo e o vínculo sexual, a perpetuação da espécie, mas está muito além disso, porque transcende a matéria. Ele não é excludente.

Por que acontece o amor platônico na visão atual?

Silhueta de homem e mulher se beijando com a luz do sol
Thanh Tran/Unsplash

A maior parte das pessoas entende por amor platônico aquele que por ser perfeito, não pode existir no mundo real, que é imperfeito e só existe no plano das ideias. É um amor à distância, idealizado e fantasioso, no qual o ser amado é perfeito e sem defeitos, sem contato físico, seguindo a interpretação de Marsílio Ficino.

Algumas pessoas têm medo de se envolver, de se machucar e de perceber que o ser amado foi de fato idealizado e que não corresponde, na realidade, com o que se imaginava e, portanto, tem medo de se desiludir. Então, preferem alimentar um amor platônico para se resguardar, mesmo que essa atitude não seja de forma consciente.

Outra possibilidade é já saber que o amor não é correspondido e, mesmo assim, ele é alimentado de forma platônica, como se fosse suficiente ou se bastasse para quem o sente.

Consequências do amor platônico

Duas pessoas se mãos dadas em um campo de flores
Joe Yates/Unsplash

Se o amor se relaciona à beleza, transcende a matéria, vai do físico para a alma e com ele um ser se completa com o outro, ele só pode ser digno de ser vivido, experienciado.

Deixar de vivenciar o sentimento de amor real, factível, na integralidade, com tudo o que ele possa trazer e que faz parte da busca pela beleza, é, no mínimo, solitário e triste. Podemos ponderar que há mais ganhos do que perdas, principalmente se estamos falando de pessoas saudáveis que se permitem amar.

Permitir se conhecer, ao mesmo tempo que se conhece o outro, é uma jornada, um caminho laboral a ser feito. Requer coragem e transpor barreiras. É, por isso, que a frase “O amor é para os fortes” tem tanto impacto. Todavia, não adotar a atitude de se envolver também tem as suas consequências de distanciamento, de incredulidade e de tristeza.

Amar significa conhecer e dar-se a conhecer. Envolve dar e receber afeto; é um exercício de reciprocidade, não necessariamente igualitária, porque tem um conteúdo individual, pessoal e específico.

Viver na fantasia de um amor platônico significa romper com a realidade e com as possibilidades de aprendizado e evolução que esse sentimento possibilita e que é a base para a convivência em sociedade. Há um impedimento de enxergar a si próprio.

Como podemos superar um amor platônico?

Duas pessoas sentadas em um muro de frente para o outro
Kate Kalvach/Unsplash

Adotar uma atitude de amor-próprio é o primeiro passo para superar um amor platônico e identificar as possibilidades de encontrar a beleza de um relacionamento afetivo recíproco. Outras dicas são:

– Converse com amigos, com familiares próximos ou com alguém de confiança sobre os seus sentimentos. Falar sobre as emoções e ouvir a opinião de alguém de fora da situação pode trazer um olhar diferente e mais realista, muito necessário.

– Descubra em você as características positivas que possam ser observadas também pelas outras pessoas e se abra para torná-las conhecidas. Valorize-se! Enalteça o que há de melhor em você. Fortaleça a sua autoestima.

– Permita-se conhecer novos lugares e muitas pessoas. Viaje, passeie, converse, faça um curso, se envolva em atividades diferentes das rotineiras. Deixe que outras pessoas o descubram!

– Procure a beleza nas pessoas, nos lugares, nas ideias, mas observe que estamos longe da perfeição e somos todos suscetíveis a falhas, a não cumprir expectativas e a não compreender a realidade tal qual ela se apresenta. Ninguém é perfeito, há distorções de percepção e todos estão em processo de aprendizagem.

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– Apaixone-se por você, pela vida, pela natureza. Adote um outro olhar sobre os relacionamentos e sobre a convivência. Alimente a positividade. Busque exemplos de relacionamentos felizes nas diferenças!

Ao refletirmos um pouco sobre o amor, na concepção de Platão e no que atualmente conhecemos como amor platônico, também fazemos uma análise sobre as nossas ideias e sobre como enxergamos esse sentimento em nossas vidas. Perceba essa oportunidade de autoconhecimento e busque amar muito e a todos. O amor é lindo e muito válido, por mais que essa definição seja clichê.

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