Quando pensamos no Big Brother Brasil, obviamente pensamos no reality show a partir da perspectiva de quem está aqui de fora assistindo “de camarote” aos barracos, às brigas, aos amores, aos desentendimentos, à solidão e à agonia dos participantes.
Nas timelines do Twitter, é fácil e simples julgar os participantes do BBB como se fossem produtos de entretenimento a nosso serviço ou os personagens daquele seriado que amamos assistir, mas a verdade é que as pessoas que estão ali são de verdade e, portanto, seus sentimentos são muito reais. De que maneiras, então, a experiência no Big Brother Brasil pode afetar os participantes?
Direto ao ponto
Comportamentos diferentes em frente às câmeras
A primeira característica que se deve considerar num programa como o BBB é o confinamento, ou seja, a reunião de um grupo de pessoas afastadas da sociedade como um todo as quais, de certa forma, são obrigados a interagir entre si, independentemente se se gostam ou não.
A principal característica do confinamento pode ser o descolamento da realidade, que faz com que as pessoas se esqueçam do mundo aqui fora, das relações e dos vínculos que mantinham nele e fiquem focadas demasiadamente no jogo lá dentro, o que pode até mesmo criar uma realidade paralela.
Outro comportamento conflituoso promovido pelo jogo é a necessidade de estar em contato ininterrupto com pessoas com quem o participante tenha brigado e/ou se desentendido. Na vida real, quando entramos em conflito com alguém, o mais comum é que nos afastemos e evitemos manter contato com essa pessoa, a fim de não fomentar esse conflito. No BBB, entretanto, isso é impossível, já que as pessoas que se desentenderam são forçadas a conviver todos os dias literalmente, o que pode ser bastante estressante e desgastante.
Não podemos nos esquecer também de que o BBB é um jogo. Há um grande prêmio em dinheiro sendo disputado, além de objetivos individuais, como sair dali mais famoso do que entrou, tornar-se uma figura popular nas redes sociais, ganhar fãs e admiradores… Os participantes nunca sabem de verdade quais são os objetivos de seus concorrentes, o que pode criar conflitos grandes, visto que, mesmo sem intenção, estão atrapalhando seus concorrentes na busca pelos objetivos.
Apesar de amizades e de romances serem construídos na casa, o BBB é um jogo e esse jogo é uma disputa em que é impossível vencer em dupla ou em trio, por exemplo. Sendo assim, imagine como é desgastante ter que concorrer, disputar e, muitas vezes, sabotar alguém por quem você está apaixonado ou um grande amigo com quem você conta e em quem confia. A verdade é que o BBB promove as traições e cria esse cenário em que ninguém pode confiar em ninguém, porque traições podem acontecer a qualquer momento.
Estresse o tempo todo. Preocupação com o paredão, com a prova do líder, com a prova do anjo, com o Big Fone, com o que a família está pensando lá fora, se está sendo bem aceito nas redes sociais, se os vínculos criados na casa são realmente verdadeiros, se os sentimentos negativos que está sentindo são de verdade ou fruto do desgaste do jogo… O participante do BBB está constantemente afetado por todos esses fatores estressantes e por muitos outros, como o fato de que há um prêmio a ser conquistado para justificar a participação no reality. Já se sabe, segundo a psicologia, que estar exposto ao estresse o tempo todo pode ter consequências desastrosas na vida emocional de uma pessoa, que passa a não saber mais quem é de verdade. Atitudes explosivas e nervosas de pessoas que sempre se consideraram calmas e tranquilas podem acontecer, por exemplo.
Agora, imagine que o que foi descrito no parágrafo anterior não está acontecendo pontualmente, mas com todos os participantes. É como uma panela de pressão que foi esquecida no fogo e está prestes a explodir, já que todos os confinados estão tremendamente estressados e em busca de um prêmio pelo qual precisa derrotar o outro.
Pressão em provas do líder e paredões
Além de todo o desgaste causado devido ao confinamento, ao estresse, às brigas e aos desentendimentos, não podemos nos esquecer de que é um jogo cheio de provas e momentos decisivos.
A prova do líder, por exemplo, pode parecer uma bênção, já que livra o vencedor do paredão e dá a ele o direito de aproveitar mordomias na casa. Em contrapartida, esse prazer vem com uma responsabilidade gigantesca: indicar uma pessoa para o paredão, que pode, eventualmente, sair do jogo. Indicar um desafeto e vê-lo sair pode ser legal, mas e quando o líder indica alguém por quem nem tem inimizade e essa pessoa sai? Pode ser um peso emocional a mais para carregar.
E o que acontece com as pessoas indicadas para o paredão? Imagine como é o estresse de ter que se planejar para sair da casa, voltar à vida normal, abandonar aquele universo no qual viveu por algum tempo… E pior: imagine quem é indicado para vários paredões e fica num ir e vir infinito, sempre arrumando suas coisas e se preparando para voltar à realidade, mas permanecendo no jogo… Isso pode ser uma situação bastante desgastante e desencadeadora de ansiedades.
Isso porque nem citamos as provas de resistência, que exigem aptidões físicas, mas, sobretudo, psicológicas dos participantes, que são expostos a situações extremamente desgastantes e desafiadoras em todos os sentidos possíveis, desde o físico até o emocional.
E, acima de todas as provas, os paredões e as disputas, há sempre o jogo: as alianças, as manipulações, confiar ou não naquele participante que se aproximou? Na vida normal, no sistema em que vivemos, já somos desafiados a quase sempre estar em disputa com outras pessoas e conosco mesmo, mas isso fica ainda mais pungente quando sua sobrevivência depende de ver outra pessoa abandonar o jogo.
O afastamento da família
A quem recorremos quando estamos passando por momentos difíceis na vida? Normalmente, à família, aos amigos e às pessoas amadas que fazem parte da nossa caminhada. No jogo, isso não existe. O máximo a ser feito é contar com uma amizade ou um romance construído há poucas semanas ou meses, ou seja, alguém que o participante mal conhece e em quem é difícil de confiar…
A proibição de recorrer às pessoas que amamos pode ser bastante triste, estressante e desgastante. Não é à toa que chamam a família de base, porque imagine sentir o chão sob seus pés desabar e ficar simplesmente sem base alguma sob eles. Quando não temos base, nosso corpo fica flutuando no desconhecido e é isso o que acontece no BBB. Aliás, é esse o objetivo do programa: colocar os participantes numa experiência de confinamento desgastante e estressante para promover conflitos e desgastes e ver como eles lidam com isso.
É uma situação, portanto, extremamente desconfortável, porque, além do estresse, da tristeza, do nervoso e da ansiedade por causa dos acontecimentos do programa, dos conflitos e do jogo, é impossível recorrer às pessoas mais importantes da sua vida naquele momento.
Mesmo assim, os reality shows continuam sendo os queridinhos do brasileiro
Como citado na introdução deste texto, o BBB é um reality show e, portanto, um produto de entretenimento. As pessoas costumam consumir o BBB como consomem filmes e seriados, por exemplo, lidando com os participantes como se eles fossem personagens e acompanhando suas felicidades e tristezas como se acompanhassem os sentimentos de um personagem ficcional, alguém que está em tela com o intuito de entreter, não como uma pessoa real que está passando por sofrimentos e privações.
E essa é a característica principal do reality show: usar pessoas de verdade, não atores, colocá-las em situações que mexem com suas emoções e usar isso para entreter as pessoas. O BBB faz isso com sucesso, basta acompanhar a comoção nas redes sociais e a quantidade de pessoas que assina o serviço de pay-per-view para acompanhar o programa na íntegra, 24h por dia.
Há muitos e muitos anos, o BBB é acusado de ser um programa alienante, que oferece um escape para os problemas verdadeiros da sociedade e supostamente emburrece a população, desviando o foco dos problemas que realmente importam. Esse argumento é falacioso. Isso não poderia ser dito, por exemplo, do futebol, do cinema e da literatura? O fato de uma pessoa acompanhar um reality show não faz com que ela seja menos inteligente ou antenada nos problemas sociais e políticos do país somente por causa disso. BBB é entretenimento, assim como futebol e cinema.
Entretenimento não precisa ter a obrigação de afiar o nosso conhecimento ou de proporcionar conhecimento, pois a função do entretenimento é, obviamente, entreter e trazer lazer e é isso o que o BBB faz para aqueles que gostam do programa.
Na próxima vez em que uma pessoa criticar você por acompanhar o programa, pergunte quantos livros ela leu nos últimos meses, quantos idiomas aprendeu a falar no último ano, quais são os nomes dos principais ministros do governo. É bem improvável que ela saiba, por isso ela não pode acusar você de ser alienado. Quem está em paz com seu conhecimento e com seus momentos de lazer não importuna nem julga a maneira como outra pessoa se entretém.
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Enfim, o BBB é uma experiência de confinamento bastante desgastante e estressante psicologicamente, mas é isso, afinal de contas, que faz com que o programa seja entretenimento interessante para aqueles que gostam de um reality show. Só não podemos nos esquecer de que as pessoas que estão lá dentro são, sim, pessoas, então seu sofrimento é verdadeiro. Desde que se assista ao programa com empatia, não há problema nenhum em acompanhar.