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Bissexualidade: explorando a identidade bissexual e suas nuances

Bandeiras bissexuais lado a lado estiradas
Leonid Altman de Getty Images no Canva
Escrito por Eu Sem Fronteiras

A bissexualidade é uma orientação sexual presente na nossa sociedade. Ainda está envolta em preconceitos e discriminação. Há falta de informação sobre a identidade bissexual e como os conceitos associados a ela vêm se transformando com o decorrer do tempo. Aprofunde-se no assunto e descubra mitos e desafios que precisam ser vencidos.

Século 21. Nunca foi tão importante lançar ideias, investigar hipóteses, rever teorias e derrubar preconceitos acerca do que é o ser humano em toda a sua complexidade. Afinal, essa é uma maneira de ampliar a consciência e evoluir. Em consonância a isso, é necessário compreender o indivíduo bissexual como parte da sociedade diversa em que vivemos, favorecendo a convivência construtiva e harmônica.

A bissexualidade é um assunto que ainda se constitui um tabu e tem nuances que muitas pessoas não compreendem adequadamente, pois há paradigmas e conceitos que distorcem a realidade. Elucidar os aspectos que envolvem o assunto ajuda a ampliar o conceito de sexualidade e o que ela representa na formação da identidade de uma pessoa.

Além disso, ao contrário do que se imagina, a bissexualidade não é algo novo, embora o termo tenha sido adotado somente a partir do século 19. Inclusive muitas práticas bissexuais são conhecidas desde os primórdios da humanidade e estiveram presentes ao longo da História. Então abra a sua mente para entender, construir e renovar conceitos e visões sobre o assunto.

O que é bissexualidade?

Peças com as letras "L", "G", "B" e "T"
beauty_of_nature por Pixabay

Bissexualidade é o termo adotado para designar a orientação sexual do indivíduo que se relaciona afetiva, emocional ou sexualmente com pessoas de qualquer gênero, inclusive, indo além do feminino e masculino.

Atualmente, o conceito sobre essa orientação sexual legítima está ampliado. Ela é fluida, na qual a atração se manifesta de maneira plural, variando de indivíduo para indivíduo, conforme suas preferências particulares.

Ela representa uma possibilidade de relacionamento com pessoas de gêneros iguais e distintos daquele do indivíduo, mas não é uma obrigatoriedade. Assim, uma pessoa bissexual, ainda que se reconheça como tal, pode se relacionar unicamente com alguém de outro gênero ou do mesmo que o dela. E vale lembrar que ela não precisa ter se relacionado com vários gêneros para se considerar como tal.

Inclusive um indivíduo bissexual pode manifestar atração ou se relacionar por um ou outro gênero durante algum tempo e num determinado grau de intensidade. Um exemplo é aquela pessoa que esteve casada com outra de gênero oposto e, após o rompimento, passa a se relacionar com alguém do mesmo que o dela ou de gênero não binário ou não monossexual.

Considerando essas características, a bissexualidade passou a ter um sentido mais amplo e se tornou um “guarda-chuva”, abrangendo outros gêneros e tornando-se importante nas questões de identidade, representatividade e acolhimento.

É importante ressaltar que bissexualidade é um termo que surgiu antes do conceito de pansexualidade e, portanto, ainda estava preso ao conceito binário masculino-feminino. Porém deve ser compreendida como a atração por pessoas, independentemente de como elas se refiram a sua sexualidade.

Bissexualidade e pansexualidade

Enquanto a concepção sobre a bissexualidade se transforma e se amplia para o interesse por pessoas de qualquer gênero, ela esbarra no conceito de pansexualidade, tornando os dois tipos de sexualidade semelhantes.

No sentido de determinar diferenças é comum se recorrer ao significado da palavra: “bi” = “dois”; e “pan” = “tudo”. Assim, enquanto bissexualidade significaria o interesse por dois gêneros, pansexualidade representaria a atração por todos eles.

No entanto, essa é uma visão reducionista e errônea de ambas manifestações da sexualidade, levando a preconceitos. É importante saber que indivíduos bissexuais sentem atração por mais de um gênero, inclusive por pessoas que estão fora da binariedade. Tem um caráter fluido.

Na pansexualidade, o indivíduo se sente atraído por pessoas, não importando o sexo, o gênero ou a maneira como elas se apresentam para a sociedade. Também tem característica fluida.

É importante destacar que na pansexualidade, ao contrário do que muitos pensam, a atração é por pessoas, e não por animais, árvores ou objetos. Por isso, ater-se ao significado da palavra ou do prefixo que a compõe não funciona e distorce os conceitos.

Bissexualidade – concepções e origem do termo

A bissexualidade é uma construção sócio-histórico-cultural relacionada com um tipo de manifestação da sexualidade. Representa uma categoria identitária, ou seja, refere-se ao jeito de ser de uma pessoa, a imagem que ela tem de si, que os outros fazem dela e, ainda, diz respeito a um grupo de indivíduos na sociedade.

O termo “bissexualidade” e a concepção atual do que ela representa são relativamente novos. De acordo com o antropólogo holandês Gert Hekma (1951-2022), ele foi usado pela primeira vez no século 19 para representar androginia e orientação sexual.

Já a palavra “bissexual” foi adotada do século 17 até início do 20, particularmente pela Medicina, pela Teologia e pelo Direito, para denominar pessoas hermafroditas ou intersexuais – aquelas com uma combinação de atributos biológicos ou anatômicos masculinos e femininos, trazendo a ideia de um terceiro sexo.

No final do século 19 e durante o século 20, ela foi usada na Psicanálise para se referir ao indivíduo que supostamente tinha uma combinação de masculinidade e feminilidade, independentemente do caráter anatômico.

Essa visão surgiu inicialmente com o psiquiatra e sexólogo alemão Richard von Krafft-Ebing (1840-1902), que adotou o termo “hermafroditismo psicossexual”, também empregado nas primeiras obras do médico e psicólogo Havelock Ellis (1859-1939).

Posteriormente, a palavra “bissexual” também foi adotada pelo neurologista e psiquiatra austríaco Sigmund Freud (1856-1939), ao defender que a bissexualidade é a orientação básica para os seres humanos, que assumem posteriormente a heterossexualidade na fase fálica.

Depois disso, ela passou a ser adotada para indicar o desejo sexual que une heterossexualidade e homossexualidade. Inclusive, a palavra “homossexual” foi criada em 1869 pelo escritor e ativista dos direitos humanos suíço Karl-Maria Kertbeny (1824-1882). No mesmo ano também usou o termo “heterossexual” para se referir aos homens que se sentiam atraídos por mulheres.

Bissexualidade e práticas bissexuais na História

Como visto, a palavra “bissexualidade” é relativamente nova, mas na História há registros de práticas bissexuais, confirmando que, desde longa data, essa manifestação da sexualidade esteve presente.

É fundamental compreender que as ideias e os costumes associados a ela vão evoluindo e se ajustando ao momento histórico, social, cultural, político, cognitivo e psicológico. Assim, o que foi válido anteriormente e num dado contexto, atualmente representa obsolescência, inadequação e, em algumas circunstâncias, ilegalidade. Confira no tópico a seguir.

Grécia Antiga

Na Grécia Antiga, as relações sexuais entre homem e mulher atendiam à procriação, e, entre dois homens, tinham como objetivo a educação do cidadão, bem como o fortalecimento das forças armadas.

Era comum um homem, especialmente se ele fosse um mentor, que, casado com uma mulher, mantivesse uma relação afetiva e sexual com um adolescente ou jovem adulto. Chamada de pederastia, essa relação era vista pela sociedade como uma forma de inspiração, um intercâmbio entre professor e aluno, na qual o homem adulto ensinava ao jovem as práticas sexuais e lhe oferecia uma formação filosófica.

Os jovens atenienses adolescentes eram incentivados a aceitar a amizade e os laços afetivos com homens mais velhos de maneira a absorver suas virtudes, seus conhecimentos e sua sabedoria. Após a idade de 12 anos, caso concordassem e as famílias aprovassem, eles se tornavam parceiros passivos destes tutores até os 18 anos. Aos 25, eles adotariam o papel ativo, estabelecendo relações heterossexuais, inclusive com o objetivo de procriar.

Tal intimidade entre casais de homens também era incentivada e praticada como uma estratégia militar: unidos afetivamente e servindo na mesma unidade, esses homens teriam um ímpeto mais forte para se protegerem, assim como resiliência para superarem dificuldades e perigos.

Para os gregos, a atração relacionava se à beleza das pessoas, sem levar em consideração o sexo biológico. Eram maneiras de obter prazer, que convinha melhor a determinados indivíduos e momentos da existência.

Japão Feudal e o shudo

No Japão Feudal, havia práticas bissexuais na aristocracia, mas principalmente relacionadas com o shudo (tradição de atos homossexuais, centrada na pederastia e estruturada de acordo com a idade), predominante na classe samurai do período medieval até o final do século 19.

O shudo era estimulado e conceituado como benéfico para a juventude, que aprendia virtudes como a honestidade e a avaliação da beleza. Nessa tradição, um samurai adulto, casado com uma mulher e tendo filhos, mantinha um relacionamento afetivo e sexual com um aprendiz (homem mais jovem), ensinando-lhe o código moral dos samurais e realizando a iniciação desse jovem nas relações sexuais.

Para os samurais, pessoalmente, tal prática possibilitava o equilíbrio entre yin (elemento feminino) e yang (elemento masculino), necessário durante as batalhas. Apesar disso, não era objetivo adotá-la como estratégia militar, como ocorria na Grécia antiga.

Mas os samurais que assumiam o religioso “percurso magnífico”, chamado “bi-do”, faziam voto de castidade, não mantendo relações sexuais com mulheres, mas podendo mantê-las com aprendizes, como forma de se aproximar do divino.

Assim, a bissexualidade era vista como um meio carnal para se chegar ao sagrado. Tanto ela quanto a distinção entre os sexos eram menos importantes do que a concepção de divino-mortal na organização da sociedade no aspecto da sexualidade.

Roma Antiga e a bissexualidade como símbolo de poder

Na Roma Antiga, a aprovação social das relações afetivas e sexuais tinha como base o status social. Não era importante o sexo biológico. Eram aceitas as relações sexuais entre quaisquer parceiros ou parceiras, devendo ser respeitada a ordem de dominação-submissão da época. Assim, o homem penetrava na mulher; o mestre, no escravo; o homem romano, no homem estrangeiro.

O que atualmente é chamado de bissexual, na Roma Antiga era norma. Mas, para ser respeitado socialmente, o homem deveria parecer masculino, não fisicamente, mas aquele que domina e que penetra nas relações sexuais.

A pederastia (relação entre um homem adulto e um mais jovem) era conceituada como um sentimento puro. Porém, se ambos fossem adultos, eles seriam vistos com desprezo pela sociedade e seriam até impedidos de exercer cargos públicos. Suas famílias também não eram bem aceitas na sociedade.

Práticas bissexuais em tribos e povos indígenas

Para alguns povos indígenas, a pederastia e as práticas bissexuais eram comuns e aceitas nos rituais de iniciação. Em várias tribos da África e da Oceania, acreditava-se que os jovens que recebessem o esperma de um homem adulto por via oral ou por via anal teriam virtudes de masculinidade.

Nas tribos camaronesas de Bassa e de Beti, quando ocorriam problemas com a colheita, as mulheres casadas com homens, se reuniam e dançavam tocando os órgãos genitais umas das outras para alongar os clitóris de modo que se parecessem pequenos pênis e, assim, invocavam as forças da natureza, a fertilidade da terra e a união da tribo.

Entre indígenas das Américas e da Ásia, a bissexualidade era valorizada nos xamãs, pois se acreditava que ela os ajudava a ampliar a compreensão de todos os membros da tribo, muito mais do que se fossem monossexuais.

Há cerca de 10 mil anos, tribos das ilhas de Fiji, Salomão e Nova Guiné, no Pacífico, adotavam o ritual de um homem travestido, representando um espírito, transmitir o conhecimento sagrado por meio do coito com outro, que aliás só deveria ocorrer com duplas de mesmo sexo.

Como visto, a bissexualidade acompanha o desenvolvimento cognitivo, emocional, psicológico, cultural e social dos povos ao longo do tempo, demonstrando que ela não é estática e representa identidade.

A bandeira bissexual

Bandeira bissexual (rosa, roxo e azul)
clu de Getty Images Signature no Canva

Há algumas décadas, os indivíduos bissexuais sofrem discriminação, preconceitos e invisibilização como resultado da falta de informação e de algumas narrativas que cercam essa orientação sexual. Isso ocorre no âmbito das sociedades mundiais e também na comunidade LGBTQIA+.

Para distinguir esses indivíduos, chamando a atenção da população para essa categoria identitária, foi criada a Bandeira do Orgulho Bissexual, pelo ativista Michael Page, em 1998.

Tal qual a bandeira arco-íris, ela é um símbolo de comunidade, de acolhimento e de resistência, que ajuda a aumentar a visibilidade dos indivíduos bissexuais na sociedade. É conhecida também como bandeira bi, sendo uma composição de três faixas horizontais sequenciais.

A primeira faixa compõe 40% do todo e tem a cor magenta (um tipo de rosa – Pantone #226). Representa a atração romântica, emocional ou sexual por pessoas de mesmo gênero.

A segunda faixa da bandeira bissexual é uma sobreposição da primeira e da terceira e compõe 20% do todo. Tem a cor lavanda (uma suposta mistura entre o magenta e o azul-real da terceira faixa, sendo Pantone #258). Representa a atração por pessoas de vários gêneros, inicialmente entendido como masculino e feminino.

A terceira faixa abrange os restantes 40% do todo e tem a cor azul-real (um tipo de azul profundo – Pantone #286). Representa a atração por pessoas de gêneros opostos.

As cores desse símbolo são as mesmas dos biângulos, outro símbolo da bissexualidade, posteriormente substituído por duas Luas Crescentes.

Alguns já atribuem outros significados à bandeira bi, por exemplo, considerando a Psicologia das Cores de Eva Heller. Assim: o magenta representa sensibilidade e sentimentalidade; o lavanda, sucesso, espiritualidade, criatividade e sabedoria; e o azul-real, simpatia, harmonia, virtudes intelectuais e fidelidade.

O Manifesto Bissexual

O Manifesto Bissexual retrata a importância do debate sobre a bissexualidade e os estigmas que os indivíduos dessa orientação sexual sofrem. Foi publicado pela primeira vez na revista norte-americana “Anything That Moves: Beyond the Myths of Bisexuality”, em 1990. É considerado um documento histórico e apresenta conceitos relevantes sobre o assunto. Veja a seguir.

Bissexualidade é um todo, identidade fluida. Não é naturalmente binária ou poligâmica. Os indivíduos bissexuais não têm “dois” lados” ou precisam estar envolvidos simultaneamente com dois gêneros para se sentirem seres humanos completos.

Essa orientação sexual não está associada à existência de apenas dois gêneros. Não representa confusão, irresponsabilidade ou inabilidade para assumir compromisso. Também não significa promiscuidade, infidelidade ou comportamento sexual inseguro, que, aliás, podem ocorrer com todas as orientações sexuais.

Nesse manifesto, há um “desabafo” sobre as pessoas bissexuais não serem aceitas em sua existência, suas questões, contribuições, alianças e vozes. Ainda, serem analisadas, definidas, representadas por outras que não elas próprias ou sequer consideradas.

Revela a frustração decorrente da imposição de ter que “escolher” e anunciar uma identidade homossexual ou heterossexual, como se a bissexualidade fosse transitória ou uma experimentação que, ao final, levaria a uma decisão monossexual.

Aliás, esse documento versa que a monossexualidade é uma sentença heterossexista, usada para oprimir homossexuais e para negar a validade da bissexualidade.

Diversidade na bissexualidade: os tipos de bissexualidade

As sociedades são diversas por várias razões, da mesma forma que os grupos sociais que as compõem, mesmo com indivíduos que partilham de características e objetivos semelhantes. Na comunidade bissexual também há diversidade. Há tipos de bissexualidade. Veja alguns a seguir.

1 – Bissexualidade heteroafetiva

Também chamada de bissexualidade heterorromântica, ela diz respeito aos indivíduos que sentem atração por homens e mulheres, mas preferem se relacionar afetivamente apenas com pessoas do sexo oposto.

2 – Bissexualidade homoafetiva

Também chamada de bissexualidade homorromântica, identifica os indivíduos que sentem atração por homens e mulheres, mas preferem se relacionar afetivamente com pessoas do mesmo sexo.

3 – Bissexualidade birromântica

Identifica os indivíduos que se conectam romanticamente com pessoas, independentemente da identidade de gênero, podendo ser, por exemplo, transexuais e agêneros, incluindo ou não atração sexual.

4 – Bissexualidade circunstancial

Refere-se a pessoas principalmente heterossexuais que escolhem parcerias de mesmo sexo diante de situações em que não tenham acesso àquelas de sexo oposto, por exemplo, na prisão, numa escolha segregada por gênero ou no exército.

5 – Bissexualidade condicional

Identifica os indivíduos heterossexuais ou homossexuais que se relacionam com outros gêneros para obter ganho financeiro, profissional ou com objetivo específico. É o exemplo de uma pessoa homossexual que estabelece um relacionamento heterossexual para ser aceita na família ou para ter filhos.

6 – Bissexualidade recreativa

Identifica os indivíduos heterossexuais que se envolvem em relacionamentos homossexuais quando estão sob a influência de álcool ou de drogas.

7 – Bissexualidade motivada

Identifica especialmente as mulheres heterossexuais que praticam sexo com outras mulheres para satisfazerem seus parceiros que se sentem excitados com esse comportamento.

Aprofunde-se no significado e nas pautas de cada “letra” da sigla LGBTQIA+

Identidade e representatividade

Os indivíduos constroem e expressam sua identidade também por meio da sexualidade. Além disso, é a cultura que categoriza os comportamentos sexuais.

Isso significa que a sexualidade não tem um sentido universal e fixo, uma vez que comportamentos sexuais iguais podem ser compreendidos de maneiras diferentes em sociedades e épocas distintas.

Nesse sentido, é visível que a heterossexualidade é considerada a norma e exerce pressão em relação aos outros tipos de sexualidade. Desse ponto de vista, para conquistar espaço, visibilidade, respeito e status de normalidade é que indivíduos das demais expressões sexuais se unem em movimentos identitários e de representatividade.

Atualmente vemos na mídia uma ascensão das manifestações LGBTQIA+ ao redor do mundo. Mas, majoritariamente vemos nos filmes, nas novelas e nos programas de TV, as relações afetivas, emocionais ou sexuais entre pessoas de mesmo sexo.

Apenas de alguns anos para cá, a mídia vem favorecendo a comunidade bissexual. Há filmes que assertivamente contribuem para a visibilidade da bissexualidade, por exemplo, “Crazy Ex-Girlfriend”, “Grey’s Anatomy” e “Brooklyn- Nine-Nine”.

Também, alguns artistas assumiram publicamente a bissexualidade, como Miley Cyrus, Lady Gaga, Anitta, Ludmilla, Jesuíta Barbosa e Gabriel Santana.

Contudo, quando se trata de bissexualidade, a discriminação e o preconceito ainda perduram. É comum a pessoa bissexual ser interpretada como alguém transitando entre as orientações homo e heterossexual.

Em razão dos preconceitos, as pessoas bissexuais se percebem invisibilizadas, e muitas se frustram por serem pressionadas a escolher uma identidade hetero ou homossexual.

Inclusive na própria comunidade LGBTQIA+ há discriminação à bissexualidade, pois alguns acreditam que ela trai a representatividade e o ativismo do grupo. E, de uma maneira geral, quando o indivíduo não se vê representado ou não pode assumir com confiança sua identidade, ele pode vir a ter prejuízos emocionais, psicológicos, físicos e sociais, como distúrbios alimentares, ansiedade, depressão, ideação e tentativa de suicídio e automutilação.

Dia da Visibilidade Bissexual

Com o objetivo de trazer visibilidade para a comunidade bissexual, combater a bifobia (prática que hostiliza a bissexualidade) e celebrar essa orientação sexual com orgulho, foi criado o Dia da Visibilidade Bissexual, também conhecido como Dia da Celebração Bissexual.

A data comemorativa e de conscientização foi criada por três ativistas bissexuais norte-americanos – Gigi Raven Wilbur, Michael Page e Wendy Curry – em 23 de setembro de 1999, tendo como base o mês de aniversário de Freddie Mercury, que, embora não tenha declarado publicamente sua orientação sexual, foi considerado por muitos veículos da mídia como bissexual.

Ela surgiu como uma resposta à marginalização e ao preconceito em relação às pessoas bissexuais tanto nas comunidades hetero quanto na LGBTQIA+. Contribui para aumentar o ativismo e para reforçar a bissexualidade como a orientação sexual em que o gênero não determina a atração sexual, afetiva ou emocional. Também, para mostrar que essas pessoas existem e devem ser respeitadas em todos os grupos sociais.

Leva ao conhecimento do público as dificuldades que os bissexuais enfrentam cotidianamente, muitas vezes levando-os a omitirem esse aspecto de sua identidade.

Elucida a bissexualidade como uma orientação sexual legítima, ou seja, não é algo temporário, uma confusão ou uma experiência.

Com esse foco, várias ações são adotadas nessa data, especialmente por órgãos do governo, prefeituras, empresas privadas, Conselhos de Psicologia etc., para conduzir a reflexão sobre temas relativos à bissexualidade.

O Dia da Visibilidade Bissexual representa a oportunidade para evidenciar os direitos humanos, importantes para essa comunidade, especialmente porque seus indivíduos estão sujeitos à discriminação, ao preconceito e à violência em razão da orientação sexual.

Inclusive, no Brasil, em 2019, o Supremo Tribunal Federal decidiu por enquadrar a discriminação por identidade de gênero e por orientação sexual, qualquer seja a forma de manifestação, nos diversos tipos penais. Mas, por enquanto, não há leis brasileiras que resguardem especificamente os direitos dos bissexuais.

A data é celebrada em países como Alemanha, Canadá, Estados Unidos, Japão, Nova Zelândia, Reino Unido e Suécia. No Brasil, a primeira manifestação foi realizada no ano de 2021, na cidade de Porto Alegre.

Bifobia: o combate ao preconceito e à discriminação

É mais comum do que se imagina um indivíduo bissexual não assumir sua orientação sexual, tentando se “encaixar” como heterossexual ou homossexual. Entre muitas razões, existe a questão da bifobia, percebida no local de trabalho, no grupo de amigos, em casa, no clube etc.

A bifobia é a discriminação e o preconceito direcionados à pessoa bissexual, sendo prejudicial para o indivíduo, para essa comunidade e para a sociedade como um todo.

O estudo “Bisexual adults are far less likely than gay men and lesbians to be ‘out’ to the people in their lives”, realizado em 2019 pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, apontou que os bissexuais têm maior tendência a não se sentirem confortáveis em falar aberta e livremente sobre sua orientação sexual, por temerem a rejeição, o preconceito e a constante pressão para se decidirem e se adequarem aos padrões morais e às convenções sociais, podendo desenvolver problemas de saúde mental, comparados a pessoas monossexuais.

Junto com a invisibilidade bissexual, a bifobia provoca o receio e o constrangimento do indivíduo bissexual até mesmo para realizar exames médicos periódicos, fazendo-o omitir seu histórico sexual, o que traz prejuízos também à saúde física.

A bifobia fomenta os estereótipos e os estigmas que a falta de informação produz. O problema é tão sério que, quando alguém se declara bissexual, pode lhe ser atribuído o rótulo de promíscuo. No entanto, a bissexualidade não se restringe ao ato sexual em si, ao número de parcerias ou de que forma elas ocorrem.

Compete à sociedade, em seus diversos segmentos e instituições, combater o problema, promovendo a conscientização, o debate e a reflexão sobre as diversas formas de sexualidade. Também, possibilitando que os indivíduos tenham espaço para expor seus conteúdos de maneira a serem vistos como seres humanos, com suas semelhanças e diferenças em relação aos demais, mas, sobretudo, com muitas qualidades e aptidões.

É necessário levar à compreensão que ser bissexual é uma das maneiras de expressar a sexualidade. E reforçar que a identidade de gênero cabe a cada indivíduo, com direito garantido na Constituição e que, portanto, ele merece respeito, dignidade e empatia.

Mitos e equívocos comuns sobre a bissexualidade

Uma mulher e dois homens sentados na cama
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Como visto anteriormente, a bissexualidade está envolta em conceitos errôneos e inadequados, que são influenciados por preconceitos, discriminação, estereótipos e muita desinformação. Abaixo, veja os mitos e os equívocos mais comuns sobre o assunto.

1 – Bissexualidade é indecisão sobre ser heterossexual ou homossexual: da mesma forma que é possível sentir atração por pessoas de etnia, altura, peso, cor de olhos e cabelos diferentes, para indivíduos bissexuais também é válido sentir atração por gêneros distintos, inclusive não binários. Portanto a bissexualidade não é indecisão, uma fase, um estado, experimentação, descoberta do sexo nem tampouco confusão.

2 – Bissexualidade significa a não aceitação da homossexualidade: a bissexualidade é uma orientação sexual legítima. Essa afirmativa equivocada reforça o caráter monossexual. Limita a abrangência e desconsidera a complexidade e as possibilidades que a sexualidade representa. Por trás dela há a pressão velada por “escolher um lado” – heterossexualidade ou homossexualidade.

3 – Ser bissexual é trair o ativismo LGBTQIA+: há o mito de que indivíduos bissexuais não revelam sua orientação sexual para manter seus privilégios, não se comprometendo com as lutas e com os direitos buscados pela comunidade LGBTQIA+, especialmente se estiverem em relacionamentos heterossexuais. Representa a falta de empatia e de respeito em relação ao que ela representa.

4 – Bissexuais são superficiais, imorais, libertinos ou hedonistas: acreditar que os indivíduos bissexuais são superficiais leva ao conceito de inconstância, promiscuidade e infidelidade. Além disso, quando se aborda a questão da imoralidade ou da perversão, pressupõe-se que esses indivíduos são incapazes de cumprir as regras morais e sociais, o que aumenta a marginalização dessa orientação sexual. Da mesma forma, considerar que uma pessoa bissexual é hedonista (baseada na existência na busca do prazer – nesse caso, sexual) é uma maneira de reduzi-la e invisibilizar suas capacidades e o quanto ela pode contribuir para a sociedade.

5 – Bissexualidade significa o melhor do universo masculino e do universo feminino, além do dobro de oportunidades para encontrar alguém com quem se relacionar: nossa sociedade é heteronormativa. Há homofobia, e muitos bissexuais se deparam com a bifobia em suas famílias, comunidades e grupos sociais. Logo, eles não têm o melhor dos dois universos. Quanto ao fato de terem mais oportunidades para encontrar alguém para se relacionar, isso diz mais respeito à personalidade, ao autoconhecimento e à capacidade de se fazer atraente ao outro do que a sexualidade de cada um.

6 – Bissexuais são infelizes ou incompletos: é comum as pessoas pensarem sobre as agruras de ter uma orientação sexual diferente da normativa, uma vez que tanto a homofobia quanto a transfobia e a bifobia estão presentes e visíveis na sociedade. Em decorrência disso, os bissexuais podem vir a ser infelizes – porém não é o inverso, ou seja, não são infelizes e por isso são bissexuais. E são pessoas inteiras, com suas crenças, suas ideias, suas verdades, seus sonhos e suas capacidades, como todas as outras.

7 – Bissexuais espalham ISTs e HIV: essa afirmativa é insensata e infundada, pois não há qualquer dado conclusivo, oriundo de pesquisas ou estudos, que comprove a comunidade bissexual como principal disseminadora de ISTs ou de HIV.

8 – Bissexuais são “meio gays” ou “meio lésbicas”: eis um equívoco que contribui para disseminar a ideia de que a bissexualidade não é uma orientação sexual completa e integral e que colabora negativamente para fazer perdurar o conceito de que os indivíduos bissexuais estão num processo de descoberta e experimentação.

9 – Pessoas bissexuais não conseguem ser monogâmicas e são infiéis: ao contrário dessa afirmação preconceituosa, há pessoas bissexuais que são monogâmicas e fiéis em seus relacionamentos. O monossexismo produz a monogamia como padrão social, e tudo que for diferente disso se constitui como uma anomalia ou ameaça. Além disso, é mais provável que a fidelidade seja resultado do atendimento de expectativas e necessidades de uma pessoa em relação à outra como amante, amiga, confidente, parceira intelectual, companheira emocional etc. – ou seja, questões psicológicas, emocionais e comportamentais.

10 – Bissexualidade significa atração 50% por homens e 50% por mulheres: não há como mensurar e quantificar a bissexualidade em relação ao grau de atração por um ou por outro gênero ou por qualquer orientação sexual específica.

Tudo sobre Bissexualidade:

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Para concluir, a bissexualidade é uma forma de expressar a sexualidade individual e a própria identidade. Ela é um dos aspectos da rica e complexa diversidade humana que constitui as sociedades. Deve ser compreendida e respeitada; afinal, ela é legítima. Pense sobre isso e lembre-se de manter sua empatia em relação às pessoas com essa orientação sexual. Podemos e merecemos vencer preconceitos.

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