Uma máscara de argila no rosto, uma taça de vinho, um roupão macio e novo, os pés dentro de uma banheira e uma travessa cheia de nachos com guacamole. Para muitas pessoas, essa é a visão de um momento de “self-care”, que pode ser traduzido para o português como “autocuidado”.
Em uma sociedade que se estrutura no regime patriarcal, o cuidado com a aparência é entendido como uma obrigação para as mulheres. A masculinidade, da forma como se constrói, nesse sentido, nega que os homens devam se cuidar. Por isso, quando se fala sobre o autocuidado pautado na aparência é mais comum as mulheres serem o foco de atenção.
O autocuidado é vendido por empresas de beleza (maquiagem, cosméticos, máscaras faciais) e por influenciadoras digitais (mulheres que se tornaram famosas no Instagram) priorizando a venda de produtos para manter a pele de uma mulher de acordo com o padrão estético imposto pela mídia: sem espinhas, sem cravos e radiante.
Seguindo esses conceitos, o senso comum sobre autocuidado seria de que é uma prática feminina, que tem como objetivo atingir um padrão de beleza. Cuidar de si, no entanto, vai muito além do exterior dos corpos de cada mulher.
O primeiro tópico a se considerar é que tanto homens quanto mulheres podem se preocupar com a própria aparência. Um homem não deveria ser considerado menos masculino por querer remover cravos e espinhas, assim como uma mulher não deveria ser obrigada a fazer esses procedimentos.
Além da aparência, é de suma importância que homens e mulheres se sintam responsáveis por quem são, buscando sempre mudanças na rotina ou práticas simples que podem mudar como eles se sentem. Nesse sentido, o autocuidado se aplica tanto para homens quanto para mulheres, sendo essencial para ambos.
O autocuidado deve ser baseado em práticas que fazem uma pessoa se sentir melhor com quem ela é e com a aparência que tem. Dessa forma, seria fundamental não só priorizar os cuidados com a pele, mas também os cuidados com a interioridade de cada pessoa. A necessidade de se sentir bem com a própria personalidade e com as escolhas de vida também faz parte do autocuidado.
O movimento “boring self care”, traduzido como “autocuidado chato”, é uma manifestação que aborda a importância de se conhecer, analisando quais são as atividades que uma pessoa deve fazer para se sentir bem consigo e que vão além da aparência. Sem o glamour de uma taça de vinho e de uma máscara de argila, colocar em prática atividades essenciais para o bem-estar de alguém são consideradas chatas, por nem sempre serem vistas como “legais” ou “bonitas” por pessoas que vivem à base de aparências.
A primeira pessoa a motivar o boring self care foi a terapeuta ocupacional Hannah Daisy. Na conta @makedaisychains, que pertence a ela, é possível conferir imagens com o que seriam esses cuidados chatos. Um deles é pendurar e recolher as roupas lavadas do varal. Outro se refere a sair para caminhar. Ao lado das ilustrações, ela incluiu o termo “boring self care”. Esses são exemplos que podem se aplicar a qualquer pessoa, mas ainda é necessário se aprofundar mais.
Em junho de 2019, Daisy fez uma postagem demonstrando a insatisfação que sente ao ver o uso do termo “self care” sempre atrelado à superficialidade de como cada pessoa aparenta ser. Além disso, ela afirma que a palavra “self”, que significa “eu”, não deveria significar que uma pessoa deve realizar sozinha todas as atividades que fazem bem para ela.
Segundo a terapeuta, o boring self care pode ser, por exemplo, pedir ajuda para uma profissional da saúde que a permita compreender as suas aflições, ou fazer exames de rotina. Ela reafirma a necessidade de se buscar uma rede de apoio de pessoas que querem o seu bem e podem ajudá-la a se sentir melhor sobre quem você é.
Ainda que sejam atitudes simples as que envolvem um autocuidado diário e mais aprofundado, a ideia é que elas façam parte da rotina de uma pessoa e precisem ser realizadas, por mais desgastantes ou entediantes que sejam.
A principal ideia é que essas práticas sejam definidas de forma individual para cada pessoa, de acordo com as personalidades, rotinas e ambições delas. É um exercício de reflexão e introspecção. Só é possível definir quais serão os autocuidados chatos de uma pessoa que sabe do que ela precisa para ser alguém melhor.
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Para realizar esse processo, você deve se nortear por estas perguntas: estou me alimentando bem? Estou fazendo exercícios físicos? Estou dedicando tempo aos meus hobbies? O lugar onde eu moro está limpo? Sou feliz fazendo minhas atividades diárias? Existe algum esporte do qual eu gostaria de aprender? Existe algum idioma de que eu gostaria de aprender? Quanto tempo faz que não encontro meus amigos? Quando foi a última vez que encontrei um familiar? O que eu preciso mudar para aproveitar melhor meus dias? Como engrandecer meu potencial? A pessoa com quem eu me envolvo romanticamente me faz bem? Estou precisando economizar? Preciso de ajuda para resolver meus problemas?
Esses são os questionamentos que uma pessoa pode levantar quando está em um processo de autoconhecimento, essencial para definir quais serão as práticas diárias de autocuidado. Melhorar a alimentação, engajar-se em questões sociais, aprender coisas novas, conversar sobre como você se sente, beber mais água, fazer algum exercício diariamente, participar de eventos instrutivos, ouvir quem precisa de um conselho, encontrar familiares e amigos ou se dedicar a uma nova atividade são exemplos de boring self care.
Os cuidados que você vai estabelecer dependem do que você pretende ser. Veja quais são os hábitos que você reproduz e que o incomodam, reveja seus comportamentos e adote medidas que podem controlá-los. Transforme o ato de se cuidar em uma atividade que valoriza o seu interior além do seu exterior e observe como você será de capaz de se sentir bem com quem você é e com a sua aparência.