Dizem que a felicidade está dentro de nós. Para alguns é difícil de compreender. Para tantos outros, a felicidade se busca, se contempla em momentos vespertinos e pode aparecer assim de repente.Mas o que é a felicidade para você? É viajar? É ter um ano de folga? É compartilhar bons momentos?
A felicidade pode ser o que você define. Para mim sentar na grama e acompanhar o pôr do sol é um momento de felicidade, ao lado da pessoa que amo.
A felicidade é tão almejada pelas pessoas que ela virou assunto para dois jornalistas pesquisarem mais sobre o que de fato é a felicidade.
Eles largaram seus empregos em São Paulo, e criaram o Glück Project. Os dois foram morar na Alemanha, tiraram um ano sabático para pesquisaram sobre a felicidade. O que eles descobriram? Você lê na entrevista a seguir.
Uma dica: leia cada frase como inspiração, pode ser que a partir deste texto você consiga pensar em outros caminhos e, quem sabe, mudar algo que não esta bom em sua vida.
Eu sem Fronteiras: O que é o Gluck Project?
Glück Project: Glück é uma investigação sobre a felicidade feita por dois jornalistas que largaram seus empregos por um ano para fazer uma grande reportagem sobre o tema, ao mesmo tempo que tiravam um ano sabático e repensavam suas vidas.
ESF: Como surgiu?
Glück Project: A Karin tem família alemã e seu avô é sobrevivente da guerra e da perseguição aos judeus. Ele fugiu de Berlim ainda jovem e a cidade faz parte do imaginário da família. Uma tia da Karin mora lá e ela passou um tempo da sua infância na Alemanha. Quando a gente casou, ela me perguntou “Você não vai matar meu sonho, né?” e eu: “Que sonho?” “De passar um tempo fora, na Alemanha”. Na época, ela estava muito cansada de São Paulo, do trânsito, do trabalho e eu até estava num ótimo momento profissional, mas o estilo de vida consumista e estressado me deixava em crise. Então falei que não queria viajar por viajar, que a gente deveria pensar num projeto, que deveríamos repensar nosso estilo de vida. Essa reflexão dos dois deu origem ao Glück, quando percebemos que aqueles não eram questões só nossas, mas da nossa geração.
ESF: Por que investigar sobre a felicidade?
Glück Project: A felicidade é muito pouco levada a sério, né? A gente quer fórmula para ser rico, fórmula pra ser bom de cama, fórmula pra ser bom profissional, etc, achando que isso vai levar para a alegria e plenitude automaticamente, mas estuda pouco os mecanismos (físicos e psicológicos) que levam à felicidade. Resolvemos, como jornalistas, que era algo que valia a pena investigar.
ESF: Como foi deixar casa, emprego, cidade para viver e se transformar, em um ano sabático?
Glück Project:
Karin: Compramos uma bicicleta em Berlim, o que, para mim, que vivia dentro de um carro há 10 anos, foi bastante estranho e libertador. Limpávamos nossa própria casa, lavávamos nossas roupas e cortamos grande parte dos nossos gastos com restaurantes e comida fora de casa. Também não comprava mais coisas de que eu não precisava realmente – de roupas a livros. Não tem muito milagre: para gastar menos é preciso viver com menos também.
Fred: Eu já tinha vivido com pouco dinheiro antes de começar a ser promovido na Editora Abril. E, é claro, que dinheiro é importante. Todo mundo deveria ganhar o suficiente para ter uma vida decente com educação, comida, saúde e lazer garantidos. Mas tem um ponto em que você supre essas necessidades e começa a querer ganhar mais grana para ter status, para competir com os amigos, para valer a pena morar na loucura de São Paulo, sabe? Você trabalha muitas horas para ganhar um dinheiro que você nem tem tempo de gastar. Isso é uma loucura. Tem muita gente de classe média e alta que está infeliz em São Paulo mesmo “tendo tudo”. O que mostra que o dinheiro traz felicidade até certo ponto. Tem buracos na nossa vida que precisam ser preenchidos com coisas que não se compra.
ESF: Qual foi o maior desafio?
Glück Project: Poderíamos falar que foi encarar o inverno de Berlim (-15 graus), ou a falta dos amigos e família – que realmente pesaram – mas a verdade é que o maior desafio é conter a ansiedade, saca? É muito difícil você não pensar “Ai, meu Deus, larguei o emprego agora vou ficar sem grana”. “Ai, meu Deus, será que nunca mais vou ter um emprego?”, etc. E todo mundo te questiona e projeta suas ansiedades nas suas costas. .
ESF: O que encontraram em relação à felicidade?
Glück Project: Putz, a gente pesquisou muitas coisas. Nosso mantra básico é “busque o autoconhecimento”. Antes de você “buscar a felicidade” descubra o que está te deixando triste. Nem todo mundo gosta de viajar ou quer morar na praia. O que te angustia? Sua vida amorosa? Seu trabalho? O trânsito? A solidão? As pessoas são infelizes por vários motivos diferentes. Você precisa descobrir o seu e depois ter coragem para enfrentar o problema, de procurar ajuda. E viver de acordo com o que faz sentido para você e não com o que importa para os outros. É claro que na vida temos que aceitar muita coisa. Muita gente não pode se dar ao luxo de largar um emprego, mas você tem o controle sobre muitas outras coisas: como você vai se relacionar com sua família, com o seu companheiro, com a sua religião, etc. E duas dicas para finalizar: organize-se e leia! Infelizmente, o mundo é realmente duro e a vida não é como gostaríamos, é preciso muita organização e planejamento para realizar nossos sonhos. E os livros te levam a todos os lugares do mundo de uma forma barata, além de serem excelentes professores.
ESF: O que é para vocês a felicidade?
Glück Project: Felicidade é um caminho, não uma meta final. É uma sensação de ausência de dor/tristeza provocada por algo diferente para cada pessoa e para cada momento da vida daquela pessoa. A felicidade não é estática e pronta. Temos momentos felizes (que podem ser muitos e consecutivos), mas não uma contínua e automática felicidade.
ESF: Por que a felicidade é tão relacionada ao consumo?
Glück Project: Acho que por muito tempo na nossa sociedade capitalista associamos a felicidade ao “ter”. E dinheiro é importante, é claro. Todo mundo fica mais feliz com saúde, segurança, comida e moradia. O dinheiro pode comprar essas coisas. O problema é que depois que você tem o básico precisa de mais e muitas pessoas pensam que o mais é consumir para ostentar. A opinião dos outros também acaba nos escravizando. “Não basta ser feliz, devo parecer feliz.” Então eu vou comprar um carrão e uma roupa de marca para mostrar para o meu vizinho como ser feliz. E a opinião do outro não pode ser uma prisão, por isso batemos na tecla do autoconhecimento.
ESF: Se as pessoas procuram, quais as dicas que mais dão?
Glück Project: Sempre falamos muito do autoconhecimento que a pessoa deve buscar com muita reflexão e pode ser auxiliada por ferramentas como a meditação, a terapia e a leitura. Temos alguns conselhos também que descobrimos em nossa pesquisa como a boa relação com o dinheiro (dinheiro compra felicidade só até certo ponto) e a importância do “fazer” na vida. O maior arrependimento das pessoas no leito de morte são as coisas que elas não fizeram.
ESF: Vocês se inspiraram em algumas pessoas?
Glück Project: Sim, claro. Antes de pedir demissão líamos muitos blogs e projetos como o Continue Curioso e o 360 Meridianos. Acho que fazemos parte de uma geração que tem repensado o trabalho, a felicidade, o estilo de vida que levamos. Não inventamos nada sozinhos. Depois, na nossa viagem, conhecemos a Fê Neute do “Fêliz com a Vida” e Eme e a Jaque do “Nômades Digitais”. Além dessas pessoas, entrevistamos Larte, Monja Cohen, Leonardo Boff e KL Jay… Suas palavras foram muito inspiradoras! E a entrevista que a Karin fez com a Dr. Ana Claudia (que atende doentes terminais) foi fundamental para tomarmos coragem. Além de todos os livros que lemos…. Enfim, fomos inspirados por muitos. Devo estar esquecendo de mais uma dúzia aqui, mas agradeço a todos hehehe.
ESF: Existe um segredo para viver a felicidade?
Glück Project: Desculpe ser repetitivo, mas o segredo é o autoconhecimento, hehehe.
ESF: Qual o conceito mais usado de felicidade para pessoas?
Glück Project: Acho que não existe uma unanimidade nesse ponto. Freud, pai da psicologia, costumava dizer que felicidade é obter prazer e evitar desprazer.
ESF: Por que algumas pessoas associam a felicidade, simplesmente a largar tudo e viajar ? como se esta fosse apenas a única fórmula de felicidade?
Glück Project: As pessoas gostam de fórmulas prontas, atalhos e gurus. Freud associa os governos totalitários à necessidade que boa parte da humanidade tem de um “grande pai” que resolva seus problemas sem que elas tenham que ser responsáveis por elas mesmas. Antigamente, as pessoas se apegavam ao “trabalhe, case, compre um carro e uma casa, reproduza-se e morra”. Quando uma geração passou a questionar essa regra e focou e um estilo de vida mais prazeroso, as pessoas mais preguiçosas adotaram o “largue tudo e viaje o mundo” como sua nova receita para a felicidade. Repito: não existe receita. Tem gente que não gosta de viajar, tem gente que ama seu trabalho. Essas pessoas podem ser felizes assim. Não acreditamos que a única saída para a felicidade é o aeroporto. Existem muitos caminhos, não tente pegar o atalho aberto por outras pessoas.
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ESF: Onde vocês estão morando hoje?
Glück Project: Agora estamos em São Paulo tocando o projeto “esperando nosso primeiro filho”, hehehe. Mas já estamos pensando qual será o primeiro lugar que nosso filho vai visitar, quando pudermos viajar de novo.
ESF: Fiquem à vontade para escrever algo:
Glück Project: Muito obrigado pelo espaço, esperamos que nossa entrevista possa contribuir para as pessoas terem uma vida melhor. Acessem o www.gluckproject.com.br para mais reflexões sobre o tema 🙂
“Tem buracos na nossa vida que precisam ser preenchidos com coisas que não se compra”.
• Entrevista realizada por Angelica Weise da Equipe Eu Sem Fronteiras