Capítulo 2 – Ouça muito e sempre
Repare! As pessoas estão ansiosas para encontrar interlocutores, outras pessoas que as ouçam e as deixem abrir as torneiras das emoções e sentimentos represados, que apenas as ouçam, porque já não querem mais conversar com desconhecidos nos meandros da internet e poucas pessoas do seu círculo relacional lhes dão tempo e atenção! Não há estatísticas a respeito dessas pessoas, apenas especulações, mas todas elas veementes no ressaltar que o ato de ouvir está ficando cada vez menos evidente, substituído por uma insaciável vontade de falar de si, de mostrar as próprias conquistas ou até mesmo de atuar como camelô de si mesmas, se me perdoa o(a) leitor(a) pelo irresistível e oportuno exagero. Alguém disse e muitos aceitaram passivamente que se deve aproveitar todas as oportunidades e contatos com as pessoas para nelas deixar o currículo verbal, se é que existe essa coisa engraçada! Há, inclusive, quem defenda a tese de que todos devem praticar a “conversa de elevador”: aproveitar que o outro está confinado no mesmo espaço e dele não pode fugir, engrenando uma conversa em que seja possível criar uma conexão para futuros negócios ou, quem sabe, uma “happy-hour”.
Rubem Alves (1933-2014), o saudoso educador, teólogo, escritor, dentre outras habilidades, que nos deixou quando mais precisávamos de pessoas como ele, dizia em suas palestras que: “Tem muito curso de oratória por aí e nenhum de escutatória!”. E quanta sabedoria está diluída nessa frase bem-humorada!
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Uma historinha para ajudar a entender o princípio do ouça muito e sempre:
Orlando Villas-Bôas (1914-2002), junto com os seus irmãos, Cláudio e Leonardo, com base nas suas expedições antropológicas no Alto Xingú, notadamente a conhecida expedição Roncador-Xingú, contavam em suas aulas e palestras sobre o quanto ficavam impressionados com a sabedoria da cultura indígena! Um dos traços dessa cultura era o hábito dos índios mais velhos de algumas etnias de levar os seus jovens guerreiros para sentar-se em silêncio no meio da mata, na beira dos rios, no topo das montanhas, apenas para ouvir as muitas vozes e comunicados na Natureza e aprender que “calado é que se ouve o coração no peito e na terra”, isso bastava para ensinar ao jovem o que ele precisava para viver.
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