Qual a importância que você dá aos alimentos? Como encara o desperdício? Por que tantas pessoas desperdiçam o alimento e por que ele não tem uma importância em nossa sociedade? Preocupada como a forma que a comida é vista, ou melhor, não vista é que Dani Leite, uma boa pesquisadora, fundou o manifesto: “Comida Invisível”. Para saber mais sobre o manifesto leia a entrevista:
Eu sem Fronteiras: O que é o manifesto comida invisível?
Comida Invisível: A Comida Invisível recupera a comida que você não vê, o alimento próprio para consumo que é atirado no lixo todos os dias. Combatemos o desperdício de alimentos produzidos, garantindo-lhes a correta destinação dos alimentos ainda próprios para consumo que perderam o valor comercial, existentes em entrepostos (CEAGESP, CEASAS), supermercados, feiras livres e indústrias alimentícias.
A educação é um dos pilares do projeto e fomentamos a conscientização através das ferramentas e canais digitais do COMIDA INVISÍVEL (Facebook, Instagram – @comidainvisivel – e site: Comida Invisível), levando para todos um novo olhar em relação ao consumo e desperdício de alimentos. De uma forma didática, leve e divertida informamos as pessoas sobre os dados de desperdício no Brasil e no mundo, apresentando formas simples e orientando para a mudança de pequenos hábitos e experiências interessantes. Também apresentamos exemplos que inspiram, informações nutricionais sobre os alimentos, formas de aproveitamento integral, cores, texturas e pessoas interessantes engajadas na causa.
Eu sem Fronteiras: Quando e por que surgiu?
Comida Invisível: Tudo começou no ano passado, numa tarde de fevereiro quando levei o meu filho, Pedro, para conhecer o CEAGESP. Enquanto caminhávamos pelos pavilhões nos deparamos com frutas perfeitas jogadas no chão ou nas caçambas de lixo e sujeira por todos os lados.
Ao passar por aqueles caminhões e depósitos, me dei conta do tamanho desperdício que há nesse trajeto do alimento do campo até a nossa mesa. Quantas pessoas poderiam ser alimentadas com as frutas e legumes deixados no chão? Um país com tamanha desigualdade social não poderia conviver com esse desperdício! Eu precisava fazer algo para minimizar esse abismo.
Após alguns dias pesquisando sobre o tema, entrei em contato com o CEAGESP, conheci o Banco Ceagesp de Alimentos (BCA) e passei a frequentá-lo para estudar o problema. O projeto surgiu no CEAGESP e se expandiu em outras frentes, com o objetivo de tirar do lixo aquilo que não é lixo, alimento bom, próprio para consumo que por falta de consciência e informação é desperdiçado todos os dias.
Flávia Vendramin e Sérgio Ignácio também foram tocados e abraçaram essa causa comigo. Hoje, somos um time e contamos com o apoio de várias pessoas que buscam levar consciência para esse tema.
Eu sem Fronteiras: Vocês são um grupo de pessoas que estão por trás do manifesto. Já se conheciam?
Comida Invisível: Além de mim, o Sérgio e a Flávia, temos vários embaixadores que aderiram à causa e muito nos ajudam a seguir em frente, que abraçaram essa causa conosco e doam o seu tempo, trabalho e cuidado pela causa. Também temos vários parceiros que nos ajudam a seguir, nos dando suporte nas ações que realizamos. Nossa eterna gratidão a todos eles!
Eu sem Fronteiras: Quais as ações realizadas?
Comida Invisível:
- Elaboração do Projeto de Lei 581/15, em trâmite na Câmara dos Vereadores de São Paulo, aprovado em primeira votação por todas as comissões reunidas e, atualmente, encontra-se com 95% de aprovação popular;
- Participação em palestras em empresas, instituições de ensino, instituições culturais e eventos (virada sustentável, virada zen);
- Cozinha itinerante na cidade de São Paulo (food truck) para a conscientização e degustação de receitas produzidas a partir de alimentos que perderam o valor comercial, mas ainda estão próprios para o consumo, doados pelo Banco Ceagesp de Alimentos;
- Elaboração de conteúdo para as redes sociais do Comida Invisível, com a participação e engajamento de formadores de opinião (tais como: Marcelo Rosenbaum, Bela Gil, Alexandra Loras, Fábio Nunes, etc.);
- Criação de projetos para equipes internas e comunidade, voltados para empresas dentro dos preceitos do Comida Invisível;
- Treinamento de equipes de restaurantes;
- Elaboração de pesquisa quantitativa em parceria com a Sax Metrics para obter a percepção e entendimento do consumidor em relação ao desperdício;
- Colaboração na construção do Guia Justiça Alimentar e Cidadania – Eleições 2016 realizado pelo Instituto Reaja.
Eu sem Fronteiras: Por que é tão difícil essa conscientização das pessoas em relação ao desperdício de alimentos?
Comida Invisível: Acreditamos que a conscientização, informação e mudança de pequenos hábitos têm um enorme poder de transformação. Para nós, a raiz do desperdício está no fato de que perdemos a conexão com a natureza. Tornamo-nos controladores e não parte dela e isso muda o nosso referencial de vida. Nos enxergamos como dominadores, controladores e embrutecemos!
Um alimento passou a ter a mesma importância que um carro, um tijolo ou um celular e virou commodity (mercadoria). E, assim se tornando, perdeu o seu valor maior, o sagrado, aquilo que nos nutre e dá vida. Somente uma reconexão com esse sagrado, que nos faz voltar no tempo, entender nossos ancestrais e compreender a sua real importância e a forma através da qual nos relacionarmos com os alimentos é que nos ajudará a solucionar o problema.
Eu sem Fronteiras: Vocês acreditam também que o poder público tem um papel importante nessa etapa?
Comida Invisível: Sem dúvida! A ação do poder público, tanto em conscientização como em ações efetivas no combate ao desperdício, é imprescindível. Recentemente, fomos convidados pelo Instituto Reaja para apresentarmos propostas para o Guia Justiça Alimentar e Cidadania – Eleições 2016, distribuído gratuitamente para a população e candidatos a vereador.
Eu sem Fronteiras: Como as pessoas podem desperdiçar menos comida em casa?
Comida Invisível: Com consciência, se olharmos para as nossas atitudes de consumo, passarmos a observar melhor o que descartamos e perceber que podemos fazer o reaproveitamento integral dos alimentos, podemos mudar os nossos hábitos. Mas, isso só acontece a partir do momento que percebemos o quão sagrado é o alimento que nos nutre e dá vida.
Eu sem Fronteiras: O que vocês acreditam que não dê mais para aceitar hoje em relação a todo esse desperdício de comida?
Comida Invisível: Acreditamos que precisamos despertar e perceber que esse é um problema do mundo todo, mas também é um problema de todo mundo, ou seja, é um problema meu, seu, do dono do restaurante, do agricultor, etc. Precisamos olhar para dentro de nós e refletirmos sobre essa dicotomia de certo/errado, próprio/impróprio, bonito/feio… A sociedade nos impõe determinados padrões, mas será que eles são os melhores? Os corretos? Será que fazem sentido? Acreditamos que somente numa busca interna dessas respostas é que haverá uma real transformação. E, nós procuramos trazer esses pontos para reflexão.
Eu sem Fronteiras: Fiquem à vontade para escrever algo:
Comida Invisível: NOSSO MANIFESTO:
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“Há nesta terra muita abundância: mamão, abacaxi, jabuticaba, melão, figo, romã, graviola, tomate, batata, cenoura, pepino.
Muitas parreiras que dão uvas, duas, três vezes no ano.
Quando umas se acabam, outras logo iniciam.
Abundância revelada em cores, texturas, perfumes e aromas.
Acostumados que estamos a elas, muitas vezes não percebemos a diversidade da nossa terra.
Na produção, frutas que caem no chão.
No transporte, grãos são soprados ao vento.
No mercado, legumes que apodrecem.
Na geladeira, estragou, vai para o lixo.
E assim, o que era belo, real, vai dando espaço ao invisível.
Aromas que se misturam, o doce perfume da fruta fresca se transforma no cheiro azedo do lixo.
Queremos resgatar o respeito pela produção, estancar o desperdício e ver brotar a consciência criativa, que nutre e dá vida.
Queremos alimento bom, comida que se pode ver e sentir.
Queremos um mundo que não passa fome e sente orgulho de semear e colher.
Queremos bocas alimentadas.
Vamos resgatar o simples e o belo, os aromas perdidos! ”.
Imagens: Divulgação
Entrevista realizada por Angélica Weise da Equipe Eu Sem Fronteiras.