Definitivamente esse tipo de experiência nos coloca num lugar que o imaginário por muitas vezes não irá alcançar a dimensão das oscilações e dos pensamentos que temos. Para os mais ansiosos já irei adiantar que o principal aprendizado que tive foi sobre a minha capacidade de controlar meu corpo físico, emocional, mental e espiritual a ponto de guiar com segurança e tranquilidade quem poderia acionar o corpo de bombeiros: meu pai, no caso.
Eu tinha decidido ficar uns dias com ele na cidade em que ele mora, no interior de São Paulo. Na verdade, o meu movimento era altamente intencional, de resgatar a comunicação com ele pela milionésima vez. Decidi isso após vivenciar um relacionamento no mínimo tóxico e, para mim e para minha terapeuta na época, era clara a necessidade de alinhar essa representação com o masculino e o próprio pai. Pois havia muitas memórias ativas de uma relação indigna com ele, e nada como resolver isso diretamente na fonte.
Talvez em um próximo texto eu possa abordar de forma mais clara o quanto nossos primeiros relacionamentos impactam nas nossas escolhas de parceiros amorosos, e criatura divina aí do outro lado entenda que nossas primeiras relações são com pai e mãe. Porém lares disfuncionais, em que a estrutura (entenda: pai e mãe) não se trata e melhora constantemente, cria filhos também disfuncionais.
Mas e o tal elevador, não é mesmo?
Ah! Vale dizer que os elevadores do prédio tinham sido trocados na semana anterior a esse evento. Apenas para você começar a pensar em como nada é aleatório, e espero que até o final deste texto você possa entender o porquê desta minha afirmação.
Cheguei ao prédio do meu pai mais de meia-noite… Tinha tido um dia extremamente leve, como havia muito tempo não tinha tanto — tanto por causa de trabalho quanto pelo contato com pessoas queridas que havia muito tempo eu não via. Fui presenteada por um jantar na casa e uma família tão querida e sai de lá me sentindo literalmente a dona redonda de tantas coisas boas que pude aprender, trocar e transbordar.
Enfim… Entro eu no elevador… Tudo parece normal até eu pegar no celular e ver as mensagens do ex-namorado, que estava nitidamente alterado emocionalmente e outras coisas mais. Aquilo mexeu demais comigo e de uma forma extremamente negativa. Quando estou prestes a responder, o elevador simplesmente chega no nono andar — local em que meu pai mora —, as portas do elevador não se abrem e nada acontece. Nem a ventilação de emergência é acionada. Apenas sinto um tranco. Geralmente, não tem rede de telefone nem de internet dentro do elevador.
Precisei pensar rapidamente depois de apertar todos os botões e ver que nenhum funcionava, não encontrando também as orientações de qual número discar de dentro do elevador para acionar a central de segurança.
Arrisquei ligar para meu pai. Ele atendeu. Você pode pensar aí do outro lado: UFA!
Não é bem assim, pois ele não fez nada do que orientei ele fazer. Entrou em pânico e foi nesse momento que eu precisei me manter extremamente calma e focada.
Eu pedi que ele não tentasse abrir o elevador sozinho, pois achei estranho não ter nada emergencial acionado dentro do elevador. Ele não me ouviu. E decidiu que iria ligar e desligar o sistema do elevador.
Eu só ouvia uma voz lá dentro: não é para fazer isso. Pedi para ele ligar para os bombeiros, que aliás estão a 2 quarteirões do prédio. E ele aos berros só sabia dizer que sabia o que estava fazendo.
Nesse momento eu me sentei no chão do elevador e respirei fundo. A única coisa que me veio foi: se nesse momento eu preciso partir, sei que fiz o meu melhor. E só pedi uma única coisa: não sobreviver caso o elevador caísse em queda livre.
Você pode entrar em choque aí do outro lado. Entenda que nesse momento é a máxima condição de gerenciamento de estresse. Para mim, a opção era a vida, porém não estava mais em minhas mãos as ações mais coerentes e seguras, uma vez que, ao ligar para meu pai, o meu aparelho ficou imediatamente sem rede alguma.
Nisso já estava ali havia uma hora. No momento em que meu pai reiniciou o sistema de operação do elevador, ele caiu em queda livre. Algo segurou. Na minha análise, eu pensei, devem ter sido as travas de segurança. Porém nenhum sistema de segurança e ventilação estava acionado. Depois de um tempo, o elevador foi descendo em câmera lenta até o fosso.
E lá estava meu pai do outro lado. Não ouvindo nenhuma palavra do que eu falava. Silenciei e só o ouvi xingar e tentar abrir com uma chave-mestra própria do elevador. E eu apenas dizia: ligue para os bombeiros.
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Depois de mais um tempo. Quando ele se convenceu de que ele não teria nenhuma habilidade para de fato resolver a situação, ele aceitou ligar para os bombeiros.
Você está se perguntando aí: como será que ela estava nesse momento? Confesso: serena. Pois entendi muitas coisas em toda essa situação que vou compartilhar com você.
Antes, preciso dizer a minha surpresa com o relato dos bombeiros. Todos preocupados se eu estava bem e todos os protocolos…. até que abriram o elevador.
Eu calmamente disse: “Oieeee… boa noite a todos vocês”. Eram quatro bombeiros. E ainda disse assim: “Posso sair?!”, sorrindo e feliz. Os olhares entre eles foram os melhores.
Papo vai, papo vem, um deles fala: “Nossa, que estranho. Como esse elevador desceu sem acionar as travas de segurança?”. Um silêncio se estabeleceu no ambiente. Risos de canto de puro nervosismo e expressão de espanto estavam estampados nas faces dos bombeiros.
E meu pai? Não parava de xingar e esbravejar. Mesmo tudo estando resolvido.
Bem, depois de tudo isso era momento de um bom banho e cama. Mas meu pai não parava de falar. Precisei respirar fundo, pois ele sequer percebeu o que aconteceu. A ação dele, feita sem pensar, colocou a minha vida em risco. E ele não assimilou que na verdade algo sobrenatural aconteceu ali e que na verdade eu nem deveria estar aqui relatando isso para você, criatura divina.
Eu decidi simplesmente respirar e fazer uma sequência de perguntas para ele, todas objetivas e feitas com muita calma, no tom mais baixo, porém firme, cuja conclusão levava a: estou viva e está tudo bem, ponto.
Nesse evento entendi muitas coisas da minha história. Entendi que não tinha como meu pai ter feito milhares de coisas de forma diferente de como ele fez simplesmente porque a percepção de risco dele e o gerenciamento das emoções com foco é inexistente dentro dele ou em um limiar muito baixo.
Nesse momento, algo dentro de mim apenas transmutou e passei a ver esse homem com muito amor, carinho e respeito. Tudo aquilo que até aquele momento era ínfimo nele: gerenciamento de estresse, inteligência emocional, autocontrole, clareza, objetividade, foco, segurança, capacidade de tomada de decisão e responsabilidade pelas escolhas era transbordante em mim.
E eu só posso hoje estar assim, pois tive que me movimentar incansavelmente até aprender, já que não tinha o primeiro referencial vindo dentro do lar.
Porém, embora transbordante, não teria como ser maior do que a posição hierárquica entre pai e filha, por isso ele não conseguia ouvir o que eu falava. Outros fatores aqui também interferem, mas ficarão para o próximo texto. O que é importante guardar aí do outro lado: você não precisa cair em queda livre dentro de um elevador para ressignificar relações, muito menos aprender mais sobre si.
Lembra da relação tóxica? Pois bem, também entendi naquele momento que não poderia ter estabelecido relações de parceria genuínas e verdadeiras. Um adendo: relações de parceria são todas aquelas que não estão vinculadas à família consanguínea ancestral, logo entenda trabalho, irmãos(ãs), amizade, sociedade, casamento, namoro ou qualquer outro título de relacionamento. Portanto fez total sentido até aquele momento eu não ter conseguido estabelecer o tipo de relação que seria o básico para mim, pois na verdade até aquele momento quem deveria ter me ensinado o que é uma relação de parceria simplesmente também não sabia o que era isso.
Ali, outro processo meu se iniciou. A partir do momento em que eu consegui acolher o pai exatamente como ele é, todas as relações de parceria foram se alterando, pois eu não precisava mais honrar na dor a ancestralidade para continuar reproduzindo o único padrão de parceria que eles conhecem: parcerias tóxicas. Pelo contrário, passei a honrar a família justamente usando tudo o que precisei aprender por conta própria para finalmente criar conexões genuínas de respeito, confiança, troca e ações tomadas em conjunto, com verdade e transparência.
Tudo mudou da noite para o dia? Não, eu precisei viver. Eu precisei me colocar em movimento. Eu precisei arriscar. Eu precisei me permitir viver para criar novos referenciais.
Então convido você a simplesmente viver no agora. Tirando de cada momento o máximo de aprendizado e de viradas de chave. Coloque como uma meta em seu coração que, ao ir se deitar, você esteja melhor do que quando acordou.
A noite é um total reset. E o outro dia é somente um futuro com infinitas possibilidades.
Conte comigo.
Com fé, amor e gratidão.