Comportamento Psicologia

Comportamento – Macacos Voadores: Indicação de que o risco continua

Homem se admirando no espelho
Africa Images de Canva

Não é raro que portadores de uma personalidade narcisista façam uso do que a psicologia acabou chancelando pela designação de “macacos voadores”. O termo teve origem na trama de “O Mágico de Oz”, onde os macacos voadores faziam o trabalho sujo pela bruxa malvada da ficção.

Na vida real eles podem surgir como vizinhos, irmãos, contatos da rede social, colegas de escola ou qualquer outro que tenha um vínculo pessoal com o narcisista. Tais pessoas, como já dito, acabam fazendo – voluntária ou involuntariamente – o trabalho sujo que atenda os objetivos do narcisista, mas pelo qual ele não pretende se expor.

Dessa forma ele habilmente usa os macacos voadores que também manipula, mas naquele momento não estão no foco de seu objetivo principal. Apesar disso, acabam impondo um tratamento abusivo às vítimas do narcisista por ainda acreditarem nas boas intenções dele, graças ao seu poder de convencimento.

Por esse motivo os macacos voadores se convertem em problema extra para as vítimas do narcisista, transformados que são numa extensão de seu poder e colocados à frente do processo para que ele consiga seus objetivos por via indireta. São bastante úteis no que toca à ligação do narcisista com suas vítimas, já que mais bem recebidos por elas do que ele próprio, que se tornou uma figura carimbada graças ao seu histórico de abusos.

É muito difícil convencer um macaco voador de que ele está sendo usado pelo narcisista e quais as consequências disso, já que sob influência dele por conta dos laços que se estabeleceram. Na realidade ele não entende porque se recusa a entender. Alguns mais teimosos e reincidentes escolhem permanecer cegos quanto à situação e pouco se pode fazer para que despertem, a menos que desconfiem diante de um fato gritante e busquem as informações por si mesmos.

Ainda assim não existe uma garantia de reversão, pois algumas pessoas consolidam uma imagem falsa – mas tão solidamente construída pelo narcisista –, que elas não conseguem apagá-la de sua cabeça simplesmente porque não aceitam admitir que sempre estiveram enganadas.

Uma dificuldade desse tipo leva à conclusão de que os macacos voadores também têm suas próprias razões para se comportar dessa forma. Alguns realmente o fazem por ignorância, enganados que foram durante anos pelo narcisista que os domina, mas os estudos também revelam que pessoas com tal perfil têm personalidade fraca para impor resistência a quem as coloque sob forte poder de influência, tornando-se moldáveis a quem se mostre inteligente o bastante para manipulá-las.

Muitas vezes elas até são capazes de entender sua realidade e a do narcisista que as manipula, mas falta-lhes coragem para defender o lado certo da história, visto que, como a parte mais frágil desse triângulo, acham melhor ficar do lado mais forte a virar alvo preferencial do narcisista patológico.

Tal fato pode ocorrer até pela lembrança que trazem de um passado recente em que já estiveram na situação de vítimas. Há casos, inclusive, de serem ensinadas a se aproximar dos alvos para atender os interesses do narcisista, já que ele não ignora a maior aceitação que seus macacos voadores obtêm junto às suas vítimas.

Não se pode descartar, no entanto, que se trate também de narcisistas escondendo um comportamento de que nem eles próprios ainda se deram conta. Há aquelas exceções, como a de pessoas bem-intencionadas, usadas como inocentes úteis por um narcisista esperto para transformá-las em macacos voadores involuntários. A vantagem destes é a possibilidade de serem despertados com mais facilidade por dados que lhes permitam tirar suas próprias conclusões.

Mulher se olhando em vários espelhos
Bianca Salgado de Pexels

Outro fato não tão raro é nos depararmos com vários narcisistas numa mesma família em diferentes graus de desvio. Basta que um de seus membros mais importantes traga uma personalidade narcisista e exerça influência sobre os demais para imprimir neles a mesma característica, como é o caso, por exemplo, de uma mãe narcisista que tenha ascensão sobre os próprios filhos.

Como decorrência, não é incomum que o membro da família que se perceba despertado para o fato acabe transformado em bode expiatório e alvo da ira de todos, que o verão sempre como ameaça pelo péssimo hábito de dizer a verdade e expor os múltiplos narcisistas dentre os demais. Se esse é o seu caso, o melhor a fazer é se afastar de todos, por mais que lhe doa, sem o que dificilmente terá paz, já que será sempre o culpado por tudo que dê errado nos planos deles.

Narcisistas que convivem num mesmo ambiente normalmente se unirão contra o bode expiatório enquanto permanecem competindo entre si, pois que seus objetivos são egocêntricos demais para que os compartilhem. A um observador atento essa dinâmica não irá escapar, em se tratando de uma família com vários narcisistas que atuaram ao longo de sua linha do tempo.

O bode expiatório a ser escolhido, portanto, será o membro que acordou para a triste realidade em que vivem. A partir desse momento será visto como ameaça ao segredo que os outros tentam manter longe de sua plateia. Eles não hesitarão em tratar como teoria conspiratória suas tentativas de despertá-los para o contexto que os rodeia.

Para esse membro, portanto, o sofrimento será intenso, independentemente da decisão que tome: se deixar tudo como está, se fará alvo preferencial dos outros, já que visto como ameaça permanente a que as manobras sejam descobertas, por se recusar a compactuar com elas; se decidir se afastar, vai enfrentar a perda dos narcisistas e macacos voadores ligados a ele, que precisarão ser afastados em sua busca por autopreservação.

Para qualquer lado que penda, então, sempre sairá machucado dessa história e precisará de muita determinação e resiliência para superar seu drama familiar. Entre as decisões, porém, essa última ainda será a melhor, pois com o distanciamento gradativo do foco de seus problemas ele acabará concluindo que fez a escolha mais saudável e agora poderá levar uma vida livre das sucessivas pressões e do ambiente tóxico de seu meio familiar.

O maior benefício, ao final de tudo, acontece pela constatação de que excluir pessoas que não agregam valor algum à sua vida a rigor não representa nenhuma perda, mas uma vitória. Uma vitória difícil, é verdade, pelas dores que promove, mas sempre uma vitória, pois calcada em coragem e superação.

Além do trauma da separação em si, a decisão não estará isenta de alguns efeitos colaterais, já que os narcisistas e/ou seus macacos voadores não irão se agradar dessa declaração de liberdade, principalmente quando entre eles houver um pai ou uma mãe que amamos.

Isso é usado como um trunfo pelos outros, pois que sofrerá ainda pela pressão de ser colocado como o filho ingrato, o irmão rancoroso e tudo o mais que encontrarem para despejar a culpa do rompimento sobre seus ombros, já que nunca se verão como causa da toxicidade daquele círculo vicioso com que ele precisou romper.

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Natural então que entre as maiores perdas do bode expiatório apareçam alguns relacionamentos que ele não desejaria cortar, se tivesse tal opção, e isso vai doer bastante, sem dúvida; mas o tempo chega sempre como o maior remédio.

Quando colocar o antes e o depois lado a lado, assim que a poeira baixar, não terá dúvidas da real dimensão de seu ganho, principalmente no que diz respeito à sua saúde mental, ainda mais quando se tem consciência de que ela é apenas o primeiro passo antes do colapso da saúde física, que se segue após a primeira, caso nos acovardemos ante a decisão que precisa ser tomada.

Sobre o autor

Luiz Roberto Bodstein

Formado pela Universidade Federal Fluminense e pós-graduado em docência do ensino superior pela Universidade Cândido Mendes. Ocupou vários cargos executivos em empresas como Trimens Consultores, Boehringer do Brasil e Estaleiro Verolme. Consultor pelo Sebrae Nacional para planejamento estratégico e docente da Fundação Getúlio Vargas e do Instituto Brasileiro da Qualidade Nuclear (IBQN) para Sistemas de Gestão. Especializou-se em qualidade na educação (Penn State University, EUA) e desenvolvimento gerencial (London Human Resources Institute, Inglaterra). Atualmente é diretor da Ad Modum Soluções Corporativas, tendo publicado mais de 20 livros e desenvolvido inúmeros cursos organizacionais em suas diferentes áreas de atuação. Conferencista convidado por várias instituições de ensino superior, teve vários de seus artigos publicados em revistas especializadas e jornais de grande circulação, como “O Globo”, “Diário do Comércio” e “Jornal do Brasil”.

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