Parece que não evoluímos muito desde os tempos do antigo Egito, uns dois mil anos antes da chegada de Cristo, nos quais as vaidades impunham até máscaras faciais com excremento de crocodilos e banha de suínos para sustentar e dar brilho aos cabelos, isso tudo depois de horas de imersão em banheiras com leite azedo. Aff… Que horror… Assim eram os belos, o que leva a que se imagine como se mostravam os definitivamente feiosos!
Sem a menor chance de alguma melhoria no corpo em que navego por essa existência tão curta quanto saborosa, acabei sendo cooptado pelas fileiras dos que louvam o verão no corpo, ou seja, um estado quase onírico na relação “eu com eu mesmo”. Nesse tipo de relação, não há nada a ser melhorado no corpo para que se alcance a sensação do ser feliz. Fala mais alto a maneira como o assumimos como a mais bela e saudável expressão de harmonias entre possibilidades: o que somos e o que podemos ser. E na tribo dos bem-resolvidos com o seu corpo, não há desprezo pela cosmetologia e toda sorte de recursos da “photoshopada” tão ao gosto das semanas de pré-verão, mas também não há a sujeição dócil e meio neurótica porque, tribo naturalmente alegre e em paz com a vida, são pessoas totalizadas, já provaram todos os sabores da vida, doces e amargos, e são bem sintonizadas com as suas dimensões existenciais, dentre elas: a de que o que vale é a vibração emocional, isso sim! Nessa tribo, há a reverência ao próprio corpo, não o culto ao corpo de outras pessoas ou de uma impossível imagem de esculpidíssimo modelo fotográfico.
Andei pensando, melhor empregando o tempo que perderia dando trela aos sussurros da patacoada de setores da mídia que não ousam mostrar a si mesmos como exemplos das belezas propagadas em suas matérias e, pensando, meio abusado até, eu admito, defendo a tese de que não é sensata essa ideia da beleza para o verão. Se o(a) caro(a) leitor(a) chegou até essa meia dúzia de linhas que fecha o texto, então, posso dividir com ele(a) o que ensinaram uns tantos sábios que me foram mentores: tudo se resume a soltar o corpo e deixar que, com ele e as suas escolhas, a vida se expanda. Esse soltar significa que é prudente ouvir e entender os seus sinais e comer, beber e dormir apenas o que ele pede, porque nada faz mal, só o excesso. Vale também deixar que o corpo brinque à vontade em caminhadas de que goste para valer, livre de tabelinhas que infestam os notebooks dos treinadores, corridas em que se aventure sem preocupações com uniformes vistosos e o monte de tralhas que enfeitam o corpo, mas não lhe agrega valor algum, a não ser os débitos e juros dos cartões de crédito, e que curta-se em esportes variados, sem gastar energias com padrões estéticos, muitíssimo menos com ganhar ou perder. O corpo se mostrará como um jovem em verões inesquecíveis se lhe for concedida a liberdade de dançar como louvação à vida, pouco ligando para a técnica do ritmo da moda, ossos e músculos brincando juntos e pulando as fogueiras onde queimam os medos, as vergonhas e a timidez bobinha. Ah… E o verão será reverberante, liberando energias para acender núcleos de novas estrelas alhures, bem para lá da Via Láctea, se o seu corpo, cá entre nós, estimado(a) leitor(a) desse valente e doce Eu Sem Fronteiras, for liberado para ferozes combates corpo a corpo… Entre lençóis! Aí, podeis crer, ó vós que ainda tendes alguma renitência, o verão vai até se esticar uns dias a mais para que nele, assim ampliado, caiba nova e imensa sensação de felicidade.
Como me restou um espacinho, deixo um efeito muito bacaninha dessa prática de “verão no corpo”, não a bobagem do “corpo para o verão”: rejuvenesce!
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