Como num palco ensaiado para sustentar esperas, algumas manhãs acordam com a sensação de liquidar qualquer sopro que a alma acuse reter. Como se o roteiro fosse métrica desajustada de avessos que de tão desorganizados se encontraram, a dosagem das parcelas vez que outra vem com erro de fábrica. Com prescrição inaudita das tormentas que nunca nos poupam. Trata-se, pois, dessa ansiedade amarrotada pelos pés e com as mãos atadas. Uma emergência de sair com a vontade de ficar mais um pouco. Mais cinco minutos ou uma vida inteira.
São tantas as auras recrutadas nesse ballet de joguetes, que me sinto, de vez em quando, na retaguarda dos instintos. Na defensiva das vontades. Ontem mesmo silenciei um grito de felicidade pela compostura de precisar medir o ser. Medir os intuitos cheios de arrogância e emblema. Não acho que as horas precisem passar pelos minutos. Não acredito na projeção das governanças à moda de quem acha saber prescrever qualquer coisa. A inspiração é instintiva e os modelos reais e confiáveis são os que nunca se ajustam. O contexto é a estrada – e nada mais.
Mediante tantas falhas já enquadradas, parece-me que até os erros são prognósticos. A quadratura retém até mesmo os modelos de pecado e de doença. Adoeçamos com as mazelas seculares – caso não o façamos, não se trata de nada além de birra e rebeldia de vanguarda. Chulas tradições essas que impelem as dores e moldam as energias. Todas as direções, por assim dizer, apontam para o mesmo lado. Somos marionetes treinadas para a felicidade fabricada. Para a ilusão romântica dos filmes que engolimos – temos padrões de lágrimas e de sorrisos. Motivos pré-determinados de avessos e de linhas.
A era da hipocrisia passa por todas as nuances do espírito. Por todas as retinas já cegas pela falta do que ver. O amor agora é a caixa bem ornamentada na prateleira das expectativas – pronto a ser descartado. Feito para acabar o mais rápido possível. Meu teatro ensaiado é o improviso da cena – ou da falta dela. Como uma dança improvisada, seguindo tão somente o ritmo das sentinelas, sorrio sem requinte ao passo torto que desagrega quem acha muito saber. Fazendo barulho no palco feito para alguns assistirem e outros provarem, decidi berrar quando for o tempo da plateia dizer. O silêncio toma conta dos corações em cena quando se perde o sentido de se estar onde se está.
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Nas peças que apresentei, permiti-me o desgaste sepulcral de uma vida com absolutamente todos os sentidos. Atribuindo àquele ser encenado a máxima da verdade, encarnei em todas as instâncias as tentativas frustradas ou felizes. Os minutos perderam-se em instantes paralisados de saudade e de sossego. Sentindo novamente o cheiro dos inícios, as ânsias retomam a coragem pelo nexo ausente. Para valer, é preciso experimentar ser palco e plateia. Ser protagonista e coadjuvante. O teatro é a empatia plena de uma vida pensada para não se pensar muito. Em tempos de moldes, sejamos as caricaturas mal-encarnadas do que desejam que sejamos. Revolucionemos.