Olá, amigo leitor do Portal Eu Sem Fronteiras! Leiam e reflitam com afã em continuar estudando esse tema tão importante após séculos de discussões sobre o tema da evolução do homem.
Os discursos acerca da “origem do homem”, da teoria da evolução e do Gênesis não são discursos concorrentes, por não serem discursos de mesmo gênero. Portanto, não faz sentido opor um ao outro. Quem o faz são os criacionistas, que fazem uma leitura muito particular do texto bíblico.
Antes de tudo, é importante distinguir o relato do Gênesis da sua leitura “criacionista”. O Gênesis e o criacionismo não são a mesma coisa. O Gênesis é um relato mítico da origem do homem e da mulher. O Criacionismo é um movimento político-religioso baseado numa leitura ideológica que nega o caráter mítico, isto é, simbólico, do relato do Gênesis.
O Criacionismo faz uma leitura literal do texto bíblico. Eles leem o Gênesis, com um interesse político-religioso de caráter “fundamentalista”, como se este descrevesse fatos históricos-naturais, o que é uma enormidade.
Maliciosamente, o Criacionismo quer opor o Gênesis à teoria da evolução. A teoria darwinista e o relato bíblico da Criação referem-se ambos à origem do homem e da mulher, mas não têm o mesmo objetivo. Falam aparentemente de uma mesma coisa, mas com objetivos distintos. Por isso, não são discursos de mesmo gênero.
A assim chamada teoria da evolução darwinista fala do lento processo de transformações que resultou no surgimento das espécies, buscando identificar os troncos comuns e as variações que deram origem à biodiversidade. Fala de processos naturais, portanto. O Gênesis, por seu turno, não fala de processos naturais por ser seu objetivo o de emprestar um sentido à existência humana.
A teoria darwinista fala de fatos histórico-naturais, sem atenção ao “sentido da vida”, por isto ser estranho à ciência. O relato mítico fala de sentido da vida, e por isto, antes de falar de fatos naturais, fala de eventos simbólicos. Quem acha que os dois discursos estão falando da mesma coisa e com os mesmos objetivos – e por isto poderiam ser tomados como concorrentes entre si – está mal-informado, ou é mal-intencionado.
O “debate” entre darwinistas e criacionistas é no mínimo um diálogo de surdos. A teoria da evolução fala do surgimento das espécies de um ponto de vista, digamos, “realista”, baseado na observação dos fatos da história natural, com o interesse de trazer à luz a lógica imanente à natureza responsável pela evolução das espécies.
O relato mitológico da Criação fala do surgimento de todos os entes de um ponto de vista, digamos, “ético”, fazendo apelo à estrutura simbólica inscrita no inconsciente humano, com o interesse de fixar um sentido para a existência humana, existência essa essencialmente sem sentido.
Ciência e mito podem conviver lado a lado, para o desespero dos adeptos do Criacionismo cujo interesse político-religioso é fazer retroceder a marcha da história a pré-modernidade, quando toda produção espiritual humana (filosofia, ciência, arte, etc.) e a política tinham que estar sob o jugo da religião.
O Criacionismo desde sempre odiou a Modernidade porque a Revolução Burguesa emancipou a política e a produção espiritual humana dos chefes religiosos, o que foi uma conquista extraordinária. Max Weber chamou este processo de modernização de “autonomia das esferas de valor”, onde a política, a moral, a arte, a ciência libertam-se da tutela da religião.
A teoria do Criacionismo é, a um só tempo, politicamente reacionária e religiosamente perversa, faz má política e má religião. Faz má política por reacionarismo regressista, negando as extraordinárias conquistas advindas das Revoluções Burguesa e Proletária. Faz má religião por querer condená-la a seguir reduzida à moral, negando-se a reconhecer na modernidade a chance de redenção da própria religião.
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Ao impor ao texto bíblico a sua absurda leitura literal, a extraordinária riqueza simbólica que ali reside, que poderia alimentar projetos de futuro, se perde melancolicamente. Apegados ao passado, esses cristãos não percebem que a perda de centralidade da religião no Ocidente abre-lhe ao Cristianismo a chance de reencontrar a sua dimensão ética, existencial, perdida ao longo da história ao se confundir com moral e política.
Essa reflexão nos remete a investir em pesquisas e meditar sobre a ótica crítica da filosofia.