A internet é um universo vasto e complexo, composto por pessoas, informações e culturas, mas de tempos em tempos surgem notícias que nos fazem atentar e refletir sobre ela. Para quem não sabe, neste domingo (16 de outubro), um adolescente de 13 anos foi encontrado morto em seu quarto durante uma brincadeira estabelecida entre seus amigos.
Os garotos jogavam um game online chamado League of Legends. A brincadeira que os meninos estabeleceram era que o perdedor deveria provocar asfixia em si mesmo, e Gustavo, o garoto em questão, utilizou uma corda que prendia um saco de boxe no teto. Os amigos, percebendo que havia alguma coisa errada, ligaram para uma prima do jovem e pediram que fosse ver como ele estava.
Diante de notícias deste tipo as pessoas voltam seus olhares cheios de desdém, mágoas e raiva para o universo online, atribuindo-o como causa do problema e, muitas vezes, impondo severas restrições aos seus próprios filhos acerca do uso da web ou jogos. Atribuir tal responsabilidade à internet em muito se assemelha a atribuir às ruas e à cidade a culpa por um assassinato, ambas apresentam os mesmos riscos, e restringir não é a solução.
A internet navegável que conhecemos é apenas a ponta do iceberg, pois existe a chamada deep web, composta por sites e endereços que não podem ser localizados através de navegadores convencionais (Chrome, Firefox, Internet Explorer) nem ser pesquisados no Google ou outros provedores de pesquisa.
Estima-se que seu tamanho seja 500 vezes maior que a web comum, e nela estão uma série de sites que, caso estivessem na web convencional, levaria a página a ser retirada do ar e o dono preso. Alguns dos conteúdos mais comuns envolvem pornografia infantil, execuções e torturas.
Porém, não é necessário ir tão fundo para encontrar conteúdos que os pais não queiram o filho ou filha acessando. Ouvi relatos de pais deixando tablets nas mãos de crianças e encontrarem a criança acessando uma paródia da Pepa Pig que utiliza linguagem vulgar e faz piadas “sujas”, o próprio YouTube pode fornecer este tipo de conteúdo.
Considerando o quão cedo as crianças têm adquirido equipamentos com acesso à internet, isto acarreta também em uma aprendizagem acelerada acerca do uso da ferramenta, promovendo ao usuário a liberdade de acesso a mais conteúdo.
Os jogos também são um conteúdo que pode ser acessado quando se possui acesso à tecnologia, seja via internet ou via mídias graváveis, como DVD e Blu-Ray, e não é necessário que o jogo seja online para ser potencialmente nocivo ao jovem consumidor, quem jogou a série GTA sabe muito bem do que estou falando.
A série Grand Theft Auto (abreviada GTA) aborda questões como tráfico de drogas, prostituição, roubos, muitos deles protagonizados pelo próprio jogador. Apesar deste lado não tão belo dos videogames, encontramos também diversos benefícios, em funções psicológicas, motoras e comportamentos:
– Atenção: tempo prestando atenção, estimula o cérebro a ficar mais tempo focado em uma atividade
– Criatividade: estimula o jogador a criar e imaginar soluções para diversos problemas.
– Reflexos: reduz a latência entre um acontecimento e a reação diante dele.
– Pensamento estratégico: jogos de combate, estratégia e lógica fornecem desafios e situações para o jogador, recompensando as decisões mais inteligentes.
– Coordenação motora: executar diversos movimentos com precisão.
– Sociabilização: iniciar e manter conversas, jogos online estimulam a comunicação.
Tenho cruzado também com pesquisas que em seus resultados relataram que jogar videogames provou ser mais eficiente no tratamento da depressão em idosos do que os medicamentos convencionais. Porém, outras pesquisas relatam que o tempo máximo que uma pessoa pode jogar por dia para gozar destes benefícios é 4 horas, acima disso, os efeitos passam a ser reversos, prejudicando ao invés de auxiliando.
Apesar disto, as pesquisas nesta área ainda são escassas e necessita-se de mais material e experimentação. É uma área bastante vasta, mas muitos dos prejuízos relatados até hoje referem-se ao mau uso do conteúdo.
Em uma viagem que fiz pelos Estados Unidos, perguntei a vendedores de games se os pais se interessavam e atentavam aos jogos que a criança ou adolescente comprava. Na cidade de San Francisco, terra de grandes empresas e negócios – sendo muitas delas relacionadas à tecnologia – relataram que por diversas vezes os pais mal olhavam para a caixa do game, e mais tarde voltavam para devolver o jogo.
Em Orlando, ponto de encontro de diversos turistas, contou-me um simpático vendedor cubano que as famílias levavam caixas aos montes sem nem ao menos checar o que os filhos adicionavam ao carrinho. No entanto, na cidade de Las Vegas fui surpreendido ao ouvir que raramente recebiam devoluções ou ouviam reclamações de pais enfurecidos, e que por vezes até escolhiam o jogo junto do filho(a), e jogavam juntos.
Considerando a grande lenda (nem tão lendária assim) acerca do antro de farra e boêmia que é Las Vegas, aquilo soou estranho à primeira impressão, mas logo ficou claro em minha mente quando percebi o severo controle que a cidade possui sobre o consumo de bebidas alcoólicas e sobre o próprio jogo.
Meus irmãos mais novos nem sequer podiam ficar próximos às áreas onde ficavam as máquinas caça-níqueis, mesas de cartas, roletas, nada, nem ao menos ficar próximos aos bares. Um segurança veio pedir que um de meus irmãos se afastasse do bar, apesar de estarmos apenas assistindo ao humilhante 7×1 da Copa do Mundo.
De volta ao Brasil, encontro por todos os lados pessoas depositando nas mãos dos jovens tablets, celulares e computadores e pensarem que seus filhos estão a salvo, ou até mesmo utilizar o dispositivo como uma espécie de “calmante”, visto que estes aparelhos podem entreter o usuário por horas a fio, dando aquele tão almejado “sossego” após um dia longo de trabalho.
Tais pensamentos são falaciosos, pois deposita-se nas mãos da criança um dispositivo com o potencial de cruzar o planeta e trazer-lhe informações vindas dos quatro cantos do globo.
Apesar deste grande risco, existem diversas ferramentas para controle de conteúdo, como o controle parental, restrições de sites por meio de bloqueios e liberações, horários de acesso e muitos outros, mas em minha opinião o melhor deles é o acompanhamento dos pais no entretenimento dos filhos.
Ser capaz de jogar um jogo dito violento com seu filho ou filha e relembrá-lo(a) da natureza fictícia do conteúdo, explicando também como aqueles conteúdos se desdobram no mundo real, não é manchar sua santidade, é educá-lo.
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É tolice, uma ilusão pensar que esconder esse universo o fará algum bem, pois casos como o de Gustavo, ou de outros adolescentes que morrem nas ruas acontecem, muitas vezes, por falta de instrução ou de consecução da instrução transmitida pela família.
Da mesma forma que se ensina a atravessar uma rua ou utilizar camisinha, deveríamos ensinar os jovens a navegar na web, isto é segurança, e contanto que não restrinja o ser humano, nunca será em exagero.