Agressividade, isolamento, auto-destruição, timidez, imaturidade (birras, choros sem razão), falta de controle, rebeldia, falta de atenção, ansiedade… são tantos os sintomas emocionais que deixam mães e pais preocupados e pensando em procurar ajuda terapêutica!
É comum ouvirmos que isto pode ser explicado por ser um problema genético. Neste caso, haveria muito pouco a ser feito por essas crianças: tratar o corpo, utilizar drogas que tragam a criança para mais perto do “padrão normal” e procurar métodos que a auxiliem a mudar seu comportamento. Mas, pensando para além do orgânico, muitos destes sintomas podem ser um sinal de alerta de que algo não está bem – não somente com a criança, mas com a família. E aí está o nó da questão: por mais difícil que seja ver isto, às vezes não são os filhos os “problemáticos”; os próprios pais podem fazer parte deste problema. Em geral, quando a família identifica um membro como doente, os outros membros estão defendidos, e evitam entrar em contato com suas dificuldades emocionais.
Vamos aprofundar um pouco.
A família é responsável pela formação e estruturação psíquica da criança. Mesmo antes de nascer, o filho já faz parte da fantasia dos pais: “o que vai ser quando crescer? Se for menina será trabalhadora como a mãe, vaidosa como a tia?” etc. A criança nasce mergulhada em um universo simbólico que já determina alguns caminhos. Ao crescer, a criança vai concretizando parte desses desejos. Mães que impõem seus desejos e vontades aos filhos, por exemplo, podem contribuir para a criação de sintomas neuróticos por não permitir que os filhos tenham os seus próprios desejos. E quanto mais rígida essa projeção, maior será a dificuldade da criança em criar seu próprio eu, realizar seus desejos, por não conseguir libertar-se dos desejos dos pais. Rebeldia ou extrema passividade podem ser alguns sintomas gerados neste quadro.
Quando falamos da dinâmica da família na formação de sintomas nas crianças, temos outros pontos a observar, por exemplo, a pressão sofrida pela longa jornada de trabalho. Muitas vezes há uma inversão no padrão comum das gerações anteriores: os pais estão assumindo mais a casa e as tarefas domésticas, e as mães ficando muito tempo fora, no trabalho. Isto pode gerar de um lado sentimento de culpa nas mães (que se busca compensar com excesso de mimos, presentes e dificuldades para estabelecer limites), de outro as dificuldades do homem que não viveu essa experiência na sua própria infância com seu pai. E a criança, quando não consegue entender muito bem essa dinâmica, pode perder tranquilidade emocional por não saber o que esperar dos pais no tocante ao seu papel no ambiente doméstico: vê o pai exercendo papel de filho, a mãe que exerce papel de amiga. Quando a criança não sente a função paterna ou materna sendo exercida, sintomas podem começar a aflorar. O sintoma da criança é parte integrante do sintoma da família.
É muito comum na clínica vermos pais projetando inconscientemente nas crianças seus ideais, suas culpas, frustrações, realizações fracassadas. Também vemos bastante o desejo dos pais em manter o filho sempre dependente: quanto mais ele é “meu”, mais fica escondido o medo de perdê-lo para o mundo. Aqui, o filho acaba tendo a tarefa imposta de completar a metade dos pais, completar a falta que os problemas emocionais dos pais geram, preencher o vazio.
É preciso, portanto, tomar cuidado com os diagnósticos dados às crianças, pois manter o foco do tratamento apenas na criança pode impedir de ver a causa real dos sintomas. Rotula-se a criança como “problema”, e os pais ficam de fora do tratamento, sendo impedidos de ver suas dores, seus conflitos, suas culpas, etc. Eles ficam de lado. O diagnóstico dado à criança nem sempre representa a realidade da família. E é interessante notar que, quando atendemos apenas os pais, vemos os sintomas de seus filhos diminuírem. Com o atendimento aos pais, a família passa a ter novas significações de cada um de seus membros.
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Cabe ao terapeuta acolher estes pais, ouvi-los e ajudá-los na compreensão do que está oculto, para que possam livrar-se de culpas, mágoas e frustrações.