Convivendo

Mulheres e seus mimimis

Girl profile face on a grey background
Escrito por Wal Reis

Sem filhos e sem blábláblá

Preguiça. Essa é a sensação quando ouço ou leio depoimentos de mulheres que, assim como eu, optaram por não ter filhos. Isso porque muitas não-mães usam a escolha como bandeira partidária. E falam e repetem e praguejam o quanto são discriminadas pela sociedade que as acusa de egoísmo, sobre a necessidade de bradar que são donas do próprio corpo, sem contar as cobranças familiares e um blábláblá sem fim e – pior – sem sentido. Parece uma necessidade de vitimização, de mostrar ao mundo que seguram uma barra sem precedentes, enfrentando tudo e todos pelo direito de não parir. É muita vontade de polemizar onde não há polêmica.

A ideia de ser mãe nunca me animou por um motivo bem prosaico: crianças crescem. Essa fase “criança”, caso ninguém tenha se dado conta, passa em, no máximo, uns oito anos. E olha lá. Caso a ciência tivesse inventado uma maneira de manter crianças como crianças, talvez tivesse providenciado alguns exemplares (isso soou tão *Entrevista com Vampiro). Gosto de crianças, aprecio o ser humano de maneira geral, mas não necessariamente isso me leva a fabricá-lo.

E nunca me causou incômodo. Não cheguei perto de nenhuma crise existencial – ter ou não ter, eis a questão – e muito menos passei noites em claro pensando em algo plausível para justificar minha decisão. Ninguém com capacidade de discernimento mínima – amigo ou não – teria ousado me interpelar com alguma questão inquisitiva sobre eu não querer procriar. E por uma razão muito simples: quando você sabe o que está fazendo, e o que está fazendo definitivamente não é da conta de ninguém, desenvolve uma aura, uma imunidade que te protege dos defensores da perpetuação da espécie.

Um dos argumentos da oposição que mais me diverte é aquele que ganha tons de ameaça premonitória ou praga mesmo: “vai ficar sozinha na velhice, sem ninguém para cuidar de você”. É assustador saber que alguém cria outro alguém com o intuito de garantir a própria aposentadoria. E isso é tão incerto (além de injusto com a próxima geração) quanto o futuro da Previdência Social brasileira.

Student girl dont know answer free space. Portrait of young woman cannot get necessary material. Stupid girl, ignorance, laziness concept

Perguntar sobre minha opção, claro que pode. As pessoas realmente têm curiosidade para saber o que faz um casal enquanto os demais do grupo estão enfeitando o quartinho do neném, trocando fraldas, escolhendo escola, ajudando nas aulas de recuperação ou tendo mini-infartos cada vez que o adolescente não atende o celular. Eu entendo. Mas garanto: dá pra não morrer de tédio. É só ter um pouco de criatividade.

Num planeta onde mulheres são agredidas, violentadas e vendidas como escravas é um pouco constrangedor se sentir mártir porque meia dúzia de sem-noção vai boquejar qualquer coisa por conta de sua preferência pela não-prenhez. Se existe um requisito aqui é entender que escolhas implicam em decidir por um lado e virar as costas para o outro, portanto, requerem sabedoria para evitar arrependimentos. E ponto final.

Você também pode gostar:

*O filme ‘Entrevista com Vampiro’ (Interview with the Vampire: The Vampire Chronicles, EUA, 1994. Direção Neil Jordan) conta a história de um vampiro, Louis de Pointe du Lac (Brad Pitt), que ganha de “presente” a vampirinha Claudia (Kirsten Dunst), que, por ter sido devidamente “vampirizada” quando criança, permanecerá como infante pela eternidade.

Sobre o autor

Wal Reis

Oi, prazer, sou a Wal. Comecei como Waldely, mas, cada vez mais, acho que a vida deve ser minimalista. Principalmente quando te colocam um nome que dá confusão de gênero, número e grau. Convivia como uma série de alter egos – Wanderly, Waldecy, Wanderley e Waldemar – até adotar o apelido de infância para íntimos e não íntimos.

Formada em Jornalismo pela Universidade Metodista de São Paulo, minha experiência profissional inclui rádio, revista e jornal. Nesse último meu apego foi maior. Deixei as redações em 2000, quando a comunicação corporativa me pegou pela perna. Relutei muito, confesso. Chatinha de nascença, achava que aquilo seria a extrema unção do meu diploma. Mas descobri um segmento cheio de oportunidades, que minha cegueira idealista não me deixava ver. Há dez anos, já pronta para deixar o ninho, alcei vôo solo e eis-me aqui fazendo o que mais gosto: geração de conteúdo (leia-se textos, textos e mais textos). Trabalho dessa forma para empresas que precisam transformar informações em relatos para seus diferentes públicos.

No território escrever sobre o que mais gosto, palpitar na vida dos outros está ali. Também tenho uma quedinha por ir na contramão do que todo mundo acha certo. O “todo mundo” me incomoda, assim como o “certo”. Por isso, vivo uma incansável busca pelo avesso. Porque ali sempre estão as melhores respostas.