Era ouvir qualquer ruído, fosse daqui ou de acolá,
e lá vinha correndo a Naná!
Ela os conhecia todos — fosse de carro ou de moto —
como se cada barulho ela os registrasse em foto.
Se fosse gente da rua logo abanava o rabinho
e saltitava, contente, pedindo logo carinho.
Mas se fosse gente estranha, nada de rabo abanando:
ela avançava e latia, mas era só pra assustar,
que morder nunca mordia…
E o “invasor” perseguia
Até que o infeliz sumisse, a correr, da nossa rua.
A mensagem da Naná era: “oh, meu, fica na tua!”
Não se sabe nem de onde a Naná surgiu um dia,
e foi por ali ficando, a cachorra-simpatia.
Fez questão de escolher, ela mesma,
a casa onde iria morar
e os donos que queria!
Naná não aceitava recusa:
de tão decidida que era
deixou toda a gente confusa!
Escolhida a casa, os donos, a rua tomou pra si,
conquistando todo mundo, do verdureiro ao gari,
e todo e qualquer vizinho.
Com olharzinho maroto,
fez-se querida ao garoto,
e jogou charme ao velhinho!
Ela espalhava alegria pela rua, pelas casas,
fez-se logo conhecida, no seu jeitinho brejeiro,
e a Naná fez-se adotar, também, pelo bairro inteiro!
Embora tivesse a casa que elegeu para si,
entrava nas dos vizinhos e por ali se espalhava:
puxava o tapete da entrada e se deitava na grama,
saía quando queria e voltava cheia de lama…
E ninguém mais se importava ou com ela esbravejava
porque Naná, com festinhas, todo mundo conquistava!
E todos os seus latidos a gente já conhecia:
fosse espantando “estrangeiro”,
fosse para um companheiro,
a gente toda gostava da cachorra-simpatia!
E Naná nunca parou de brincar com sua gente.
Pra todos dava alegria, estava sempre contente.
Nunca se viu — como ela — bichinho com tanto amor,
e animal jamais teve — que se saiba — tão bom humor!
Naná cuidava de todos: de sua gente, de sua rua,
e desfilava orgulhosa por sabê-la toda sua!
Um dia surgiu por lá uma gente meio estranha
que reclamou a Naná, dizendo serem seus donos
do lugar onde nascera, e crescera
com seus sonhos!
Foram e levaram a Naná,
deixando todos tristonhos.
Não se passou muito tempo, porém, e toda a gente acordou
com latidos de saudade,
com rabinho balançando, com ar de felicidade
nos olhinhos da Naná:
era ela retornando para a rua que escolhera,
pra sua gente de cá!
E todo mundo entendeu que a Naná não permitia
ter um dono que a escolhesse:
ela queria escolhê-lo!
A Naná não aceitaria ter um dono que a prendesse:
ela queria prendê-lo
como fez com todos nós: prendeu-nos com seu carinho,
com seu rabinho, com aquele brilho no olhar,
com seu jeitinho maroto de quem tá sempre contente,
de quem tá sempre carente, sem malícia,
convidando toda a gente a fazer-lhe uma carícia!
Naná gostava de amar!
Um dia Naná parou
no seu canto, de manhã,
e toda a rua estranhou!
Não foi me ver como sempre, me seguir na bicicleta,
não latiu pro passarinho,
nem pro solitário atleta
que passava em sua rotina.
Não correu até na esquina
quando um estranho chegou.
Do jeito que se deitara, ali a Naná ficou…
E sempre só piorando no cantinho da garagem…
quis andar, mas, se arrastando, desistiu da traquinagem.
E pela primeira vez não foi atrás do Nandinho,
e pela primeira vez não abanou seu rabinho,
e pela primeira vez perdeu o brilho do olhar,
apesar de toda a gente da rua a lhe visitar!
Morreu Naná, de mansinho,
sem sequer choramingar.
Com sua felicidade,
morreu com dignidade.
Só fez a rua chorar.
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O Sol que nasceu de novo veio muito diferente:
não trouxe Naná contente, abanando o seu rabinho.
Não trouxe Naná carente, pedindo nosso carinho.
Só trouxe uma dor na frente: Naná se foi, de mansinho,
e deixou tanta saudade a doer dentro da gente!