E como faz quando a gente não esquece e quer de novo? Quando a vida dá mais uma daquelas rasteiras de surpresa, provando que temos muito pouco poder sobre tudo. Trata-se, quem sabe, de uma tentativa do universo de liquidar com a nossa arrogância e mostrar que ele é o senhor.
A dificuldade de não ceder, a vontade de não sentir. Todos os pretextos que sucumbem a alma têm como fonte os desejos nunca satisfeitos. As ansiedades nunca sanadas. Somos alegoria da terra e marionetes amantes de uma sátira cujo final todos desconhecem, cujo início é sempre uma relativização do improvável. Ponto de vista e só.
A vida, vez que outra, toca fundo nas preliminares e, quando nos põe à prova, acusa treinamento prévio. Não permite rascunho. A chance é única e a expectativa alarma. Não controlamos sequer um passo, mas, ainda assim, desenhamos o caminho. O sentimento, pois, é o fantoche mal-acabado de quem se nomeou a vitrine dos tempos, empoderando-se das sensações e fazendo promessas ao que não se cumpre. O tempo não se cumpre.
Os dementadores das ruas orquestram a risada triunfal por meio dos tropeços e das fantasias que criamos. A romantização das derrotas talvez seja a autoajuda da qual nunca conseguiremos nos desvencilhar, provando a nós mesmos o quanto a falha subjuga as batalhas. O quanto podem ser mortais as noites de vida inteira.
Ontem, ao despertar depois das três xícaras de café, criei vontades como ornamentos chulos de um roteiro feito em rascunho. Não há certeza sobre nada e, mesmo assim, as escritas à caneta parecem efervescer as apostas para o infinito. Ninguém entende o fim. Ninguém acredita na redenção – mesmo que a energia motriz para se seguir esteja na crença infantil sobre mais uma chance. E mais uma e outra mais.
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Esse utilitário de despesas ainda dará o que falar. Essa presunção por confiança, enjaulada em conjunto com a melancolia sobre o nada, apenas traz à tona o entendimento destorcido que subjetiviza todas as resoluções prontas. Não existe nada em definitivo. Aprender a lidar com os nossos monstros está na caixa-preta de cada um. Não tentemos abri-la.