Ontem, depois dos afazeres escolares, quando eu fui dormir, já quase no alvorecer de um novo dia, um pensamento invadiu a minha mente: “Como posso viver em paz e sem mágoa se, à minha volta, pessoas passam fome e clamam por justiça?”
Em sonho, depois de muito meditar sobre essa questão, meus pensamentos materializaram-se em imagens. Algumas dessas imagens eram solitárias, outras, aos montes, formavam pares. O interessante era que o agrupamento dessas imagens dava-se pelas divergências e não pelas afinidades.
Como filósofo, eu indagava: “Quando o reino da bondade vai fazer morada entre os humanos?”; “Será que a solidariedade ainda pulsa no coração do homem atual?”; “Ainda há salvação para os incrédulos?”
E eis que, de repente, como num flash, um anjo apareceu em minha mente. Como meus pensamentos estavam confusos, tudo se apaga…
O tempo passa, e, com ele, o esquecimento ganha força. Tudo parecia pedido para sempre, até que a minha mente começou a reagir, a dar sinal de vida…
Como se em câmera lenta, aos poucos, as lembranças voltam, opacas — é verdade —, mas elas voltam…
Naquele jogo de esquecimento e lembrança, quem levaria a melhor? Qual era o sentido e o significado de tudo aquilo, daquele sonho?
Depois de um tempo, que eu não sei precisar quanto, se um segundo ou um minuto, uma hora ou um dia, um mês ou um ano… novamente, em minha mente, volta a imagem do anjo. Dessa vez, ele não estava sozinho. Uma legião de anjos saltava, de um lado para o outro, dentro de um templo suntuoso, que parecia ser invisível. Não era um templo qualquer, um templo comum: era um templo de arquitetura medieval, cercado de montanhas por todos os lados e com um imenso jardim.
No formato triangular, aquele templo possuía sete grandes portas e sete janelas laterais. Suas colunas eram de ouro maciço. Não existiam bancos, no interior do templo, apenas tapetes macios e limpos, onde os fiéis, em posição de lótus, faziam suas orações. No centro do templo havia um púlpito. Sobre ele, os dizeres: “Aqui habita o Ser”.
Todo o templo era divinamente ornamentado com flores, lindas flores; flores de todos os tamanhos, de todas as cores, que exalavam os melhores perfumes.
As flores vermelhas, com seu cheiro de Amor, atraíam os casais apaixonados, que, em um frenesi infernal, formavam a grande sinfonia da vida.
As flores rosa, que estavam por todas as partes, transmitiam gestos de respeito e admiração, sentimentos que imperavam naquele templo.
As flores amarelas, além de alegrar o ambiente interno e externo do templo, representavam a riqueza e a beleza daquele lugar.
As flores brancas, que representavam a pureza e a inocência do lugar, eram as mais desejadas, e todos queriam alcançá-las.
Num dado momento, devido à dificuldade no entendimento acerca da paz, um homem, que dormia numa das colunas no pórtico do templo, levantou a voz e fez-se ouvir: “Mero desejo, pura quimera, a paz é inatingível”.
E as flores roxas, que representavam a vida e a morte no templo, começaram a murchar…
E os lírios, que retratavam a transparência da alma e o amor eterno no templo, começaram a se fechar…
“O fim está próximo e muitos de vocês perecerão por causa do orgulho e da ganância”, profetizava aquele homem.
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Muitos que estavam do lado de fora, quando ouviram aquele pronunciamento, correram para dentro do templo. Era um desespero imenso; gritos e pedidos de socorro vinham de todos os lados, principalmente dos assassinos e corruptos de plantão, quando as portas do templo se fecharam.
Mas nada era capaz de amolecer o coração daquele homem, que continuava a discursar, e suas palavras eram ainda mais duras: “Não tem jeito, o ser humano é impossível de ser consertado, apenas o fogo o renova.”
As flores que outrora enfeitavam o templo, que serviam para aquecer o coração dos visitantes, agora serviam de combustível para o fogo que destruía tudo e todos, purificando o ambiente e anunciando a primavera.