Através dos estudos do filósofo Michael Foucault, ficamos sabendo que encontramos em Alcebíades, personagem de Platão-Sócrates, os primeiros ensaios da filosofia sobre a razão de ser e a forma do cuidado de si.
O cuidado de si constituiu, no mundo greco-romano, o modo pelo qual a liberdade individual e, até certo ponto, a liberdade cívica foi pensada como ética. Na atualidade, podemos praticar algumas dessas técnicas de cuidado de si como ajuda para a constituição de uma vida mais saudável e íntegra.
Tenho pensado, enquanto estudo o livro de Foucault, Hermenêutica do Sujeito, de 1982, sobre algumas práticas que mais parecem habitar os estratos da autoajuda e do misticismo do que os da ciência ou da filosofia. São leituras, dietas e exercícios que fazem parte das técnicas do cuidado de si.
Desde Platão-Sócrates, o cuidado de si vem sendo alvo de interesse dos filósofos como constituinte do pensamento moral. Um caminho para a produção de uma ética da existência que possibilite o exercício da liberdade. Portanto, o que vou apresentar a seguir, mesmo que pareça o mais corriqueiro e bobinho dos gestos, está ancorado na tradição filosófica, desde que essa foi inventada pelo pensamento humano ocidental. Bem, provavelmente, o prezado leitor esteja associado a algum grupo de Whatsapp.
Acertei? As famílias, geralmente, possuem um grupo ou vários e, na minha, não é diferente. Um dos nossos grupos chama-se “O Anjo das Dez”. É um grupo destinado a conectar nossa família, que está dispersa por várias partes do mundo, durante alguns momentos por dia.
Exatamente às dez horas da manhã, cada membro da família publica no grupo um “anjo”, ou seja, uma qualidade motivadora de reflexão, retirada de um antigo baralho de cartas ilustradas, que acompanha o livro ‘Meditando com os Anjos’, escrito por Sônia Café e ilustrado por Neide Innecco.
Ambas as autoras foram residentes de Nazaré Uniluz, onde as conheci e participei do lançamento do livro. A ideia do baralho não é delas, mas uma prática associada ao Jogo da Transformação, técnica desenvolvida por Joy Drake e Kathy Tyler, no período em que residiram na Fundação Findhorn, na Escócia.
O baralho foi adotado em Nazaré também como prática diária, para ampliar a capacidade de meditação, concentração e busca de percepções, antes das diversas atividades rotineiras do Centro de Vivências, como era chamado Nazaré Uniluz, no tempo em que também residi por lá.
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Esse simples gesto de ler uma palavra num cartão e olhar para uma ilustração quer ser capaz de fazer uma pausa no automatismo do cotidiano. Quer ajudar a nos colocar em sintonia conosco mesmo e com aquilo que estamos fazendo. É um gesto que colabora para a presentificação da existência, o que os budistas chamam de estar no “aqui e agora”.
Estender esse gesto diariamente para um encontro familiar por um aplicativo de mensagem não só nos aproxima daqueles que amamos, mas expande as qualidades que podem nos ajudar a cuidar de nós mesmos e dos outros. Coisa singela, mas produtora de efeitos de salutogênese e inscrita nas técnicas de cuidado de si, para a produção de uma ética da existência.