Planejei meticulosamente minha viagem de trem. Seriam longas cinco horas até o destino. O trem sairia cedo e eu chegaria por volta do horário do almoço. Porém, meu check-in no hotel era só às 16h. Estamos caminhando para um futuro em que check-ins serão às 18h com check-out às 7h da manhã, só para manter a gente na linha da frustração. Mas enfim, voltemos à história.
Como boa estrategista (ou assim eu me iludo), decidi comprar um lanche para garantir minha refeição no horário. Ao chegar na estação do destino, minha primeira missão foi encontrar um local para guardar minha mala. Eu precisava explorá-la cidade até o check-in, mas teria que voltar à estação depois para pegar o ônibus que me levaria ao hotel.
Aqui começa a saga linguística. Idioma oficial do país? Alemão. Eu falo alemão? Não. Segundo idioma? Francês. Eu falo francês? Também não. O inglês? Ah, eu arranho bem. Espanhol? Até que flui. Mas alguém falava essas línguas? Claro que não.
Lá estava eu, arrastando minha mala de rodinhas de um lado para o outro na imensa estação, segurando uma sacola premium com meu precioso almoço. E preciso dizer: em certos países, comida é um verdadeiro item de luxo. Me senti quase carregando uma joia.
Depois de muito procurar sem sucesso, decidi sentar em um banco e tentar uma busca online. Nada. Levantei, andei mais um pouco e encontrei dois jovens. E, como sempre, os jovens me salvaram! Com um inglês fluente e muita boa vontade, eles me ajudaram a encontrar o local onde eu poderia guardar minha bagagem.
Chegando lá, o atendente quis cobrar por duas bagagens, sendo que eu tinha apenas uma mala de 10kg e uma bolsa. O preço era um absurdo, e a barreira do idioma não ajudava. Num ato de desespero, comecei a falar em português. E adivinhem? O rapaz era português!
Ele, muito feliz, disse: “Você fala português?” E eu, quase emocionada: “Simmm, sou brasileira!” A felicidade dele parecia maior que a minha. Ele rasgou meu ticket inicial e fez outro por apenas 5 euros. Problema resolvido.
Com a bagagem guardada, era hora de explorar a cidade. Mas aí veio o momento de tensão: cadê minha sacola premium com o lanche? Lembrei-me de que provavelmente a tinha esquecido no banco onde sentei antes.
Fiquei tão frustrada. Resolvo um problema, e outro aparece. É como se o dia estivesse testando minha paciência. Mesmo assim, decidi voltar ao banco. E adivinhem? Minha sacolinha estava lá, intacta, me esperando.
Foi ali que tive uma epifania. Sempre fui aquela pessoa que devolve o dinheiro encontrado na rua, que não mexe no que não é seu. Meus pais me ensinaram que o que é nosso sempre nos encontra, e o que é dos outros não deve ser tocado. E, dessa vez, eu era a “dona” que voltou para buscar.
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Essa história me trouxe uma reflexão sobre valores e princípios. Não apenas sobre respeitar o que não nos pertence, mas também sobre valorizar o que é do outro. Isso vale para uma ideia de negócio, para um momento de alegria, ou mesmo para uma dor. Se alguém está sofrendo, essa dor é dela. Posso oferecer ajuda, ouvir, compartilhar, mas, no fim, ela volta para casa com o que é dela e eu fico com o que é meu.
No final das contas, talvez seja isso: viver com a leveza de saber que o que é seu sempre encontra o caminho de volta para você.