O submarino afundou há muitos milhares de anos e, ao afundar, virou de cabeça para baixo. A tripulação inexplicavelmente sobreviveu e produziu, por milênios, as gerações futuras. Com o tempo, essas gerações perderam o registro histórico de sua origem e passaram a acreditar que o mundo era o submarino.
Ao tentar contato com o mundo exterior, por meio do periscópio, tudo o que as pessoas viam era o fundo do mar: muita escuridão e a limitação de sua percepção para além do chão de areia. Era uma vida limitada e sem perspectivas, em que as pessoas viviam brigando e disputando o pouco espaço e os recursos disponíveis, sem esperanças, e sem entender o porquê daquela vida, mas também sem questioná-la.
Mas o mundo lá fora sabia que o submarino havia afundado e tentava de tudo para salvar seus tripulantes. A equipe de resgate tentava em vão comunicar-se. No submarino, se alguma manifestação da superfície chegasse a ser percebida, ela não era entendida, pois ninguém sequer admitia a hipótese de existir uma equipe de resgate com a missão determinada e incondicional de salvamento.
Passado tanto tempo, depois de tanto sofrimento, uns poucos começaram a imaginar que aquilo pudesse não ser a vida verdadeira. Devia ser mera ilusão. A verdade deveria existir em um mundo muito melhor, do qual apenas não tinham conhecimento. Apuraram então seus sentidos, para tentar captar alguma coisa vinda do exterior que não fosse apenas aquilo que seu periscópio podia fazê-los enxergar. Aos poucos, começaram a ouvir sons que nunca antes tinham ouvido, e perceber uma nesga de luz que antes nunca lhes tinha chegado aos olhos. “Ah! Sim, deve existir um mundo lá fora. A luz parece vir de cima, assim como o som. Talvez estejamos mesmo de cabeça para baixo. Temos que virar o submarino!”
Foi muito difícil convencer os outros, menos sensíveis, que havia mesmo alguma coisa lá fora:
“Vocês estão loucos… isto é fantasia de sua cabeça… é um processo psicológico de fuga da realidade da vida…”
Mas, pouco a pouco, alguns outros passaram a acreditar e a apurar seus sentidos. Passaram também a perceber que o submarino poderia ser a ilusão e que lá fora haveria um mundo real. O esforço para virar o submarino começou. No início os resultados eram pequenos. Mas, à medida que o periscópio, desviando-se do fundo e angulando-se para cima, permitia a entrada de uma luz cada vez mais intensa, mais pessoas convenceram-se de que poderia haver uma salvação.
O esforço aumentava e, paulatinamente, o submarino, girando em seu eixo para a direção da superfície, permitia agora que o periscópio captasse muito mais luz e, com ela, a visão de um vasto oceano, cheio de riquezas nunca antes imaginadas. A atividade da equipe de resgate, com seus equipamentos sondando o oceano, já podia agora ser ligeiramente percebida.
Começou então a comunicação consciente de uma parte, ainda pequena, da tripulação com a equipe de resgate. Lançavam-se objetos ao mar para estabelecer referências; batia-se no casco do submarino para que a tripulação se fizesse ouvir. Vários grupos internos de resgate foram criados, entre os membros da tripulação, para assegurar que o contato com as equipes externas fosse efetivo.
Só a perspectiva do resgate já mudou o clima dentro do submarino, entre os que acreditavam no salvamento. As pessoas deixaram de brigar por mesquinharias, seus corações se alegravam e distribuíam amor entre si. Sabiam que um mundo maravilhoso, abundante de recursos e beleza, embora ainda desconhecido, os esperava lá fora. Passaram a cuidar muito melhor do próprio submarino, pois dependiam dele para um dia subir à superfície…
***
O fim da história não se sabe ainda. Mas os corações e a energia dos que creem estão cada vez mais voltados à tarefa de levar esse submarino à superfície. É maravilhosa a perspectiva de ver o sol brilhando sobre as águas e as florestas; de ver os pássaros voando, enquanto ouvimos seu canto; de ver a noite de lua cheia e as estrelas; de respirar o ar puro e fresco… De tudo isso, hoje dá para ver apenas o vulto e, ainda assim, distorcido pela refração nas águas do mar.
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O dia a dia, as orações, os pensamentos, cada célula do ser deveriam estar empenhados e profundamente comprometidos com a ascensão do submarino. Estendamos nossas mãos e voltemos nossa mente e coração às equipes de resgate. Assim, ouviremos suas manifestações de forma cada vez mais clara.
A vida no submarino parece incompreensível. Suas regras de convivência e partilha, criadas por nós mesmos, tripulantes, chegam a ser insuportáveis. Mas é nesse ambiente que nossa missão de participar do salvamento deve se realizar. E, curiosamente, não podemos nos salvar sozinhos: para que um único tripulante se salve, todos no submarino devem se salvar também.
A regra é simples: apenas perceba em cada atitude, preocupação, pensamento e sentimento aos quais você se permite expor se isso está contribuindo para perpetuar a vida no submarino, que um dia poderá se desintegrar, ou para levá-lo à superfície, onde imperam as leis da Vida, garantindo a você, e às futuras gerações, a verdadeira existência na superfície do planeta.