Na imensa região do Sudeste Asiático que hoje abrange a China, o Tibete, as duas Coreias, a Mongólia, parte da Rússia, o Japão e chega até a Malásia e o arquipélago da Indonésia, também havia inúmeras tribos e clãs espalhados sem demarcações de fronteiras. Todos aqueles povos, alguns dos quais ainda existem atualmente, seguiam um modo de vida natural que poderíamos chamar erroneamente de “religião”.
Eles desenvolveram uma visão do mundo em que viviam observando a natureza e a si mesmos, aprendendo a sobreviver com a caça e a coleta, a ler sinais no céu, na terra e na relação entre o ser humano com o seu meio. Os antropólogos modernos chamaram estas culturas de “animistas”.
Para os antigos descendentes dos chineses, em vez de um único Deus antropomórfico ou nenhum, em vez de milhares de deuses ou meia dúzia, tudo que podiam perceber com seus sentidos, ainda que não tivessem um conhecimento científico dos fenômenos com os quais se deparavam, era sagrado, tinha uma existência própria e uma função especial na comunidade e no local em que eram encontrados.
E como aqueles povos que ocupavam um gigantesco território antes do início da civilização chinesa observaram que tanto eles quanto os animais, as plantas e as constelações passavam por contínuas mudanças e transformações cíclicas, compararam esse processo perpétuo ao movimento sinuoso e em fluxo dos rios incessantemente desaguando no mar.
Posteriormente, esta visão animista do mundo foi chamada pelos chineses de TAO, ou Método, uma palavra composta
de dois ideogramas, um pé e uma cabeça, fazendo uma alusão à jornada iniciada pela mente quando tomou consciência dessa perenidade. Para os taoístas, antes da influência do budismo e do confucionismo, o universo não girava ao redor do homem e nem era necessária salvação ou iluminação uma vez que tudo e todos retornavam para o imenso vazio do ventre da Mãe Natureza que os aceitava sem distinção, semelhante ao mar e ao solo que absorviam igualmente as águas sem predileção por nenhuma fonte.
Dessa visão animista em que uma energia, um fogo interior, um espírito e uma consciência, sustenta a forma temporária tanto de um homem quanto de um grão de areia, nasceu a arte marcial do TAI CHI e diversas outras manifestações artísticas e tecnológicas. Não por acaso, graças a essa rica herança cultural que lhes facilitaram assumir uma posição de vanguarda na crescente expansão da civilização, os antigos chineses arriscaram chamar seu país de “Império do Centro”. Do centro do mundo…
Isso explica porque o taoísmo original se diluiu em uma mistura de xamanismo com rituais budistas e confucionistas. À medida que a visão animista foi sendo suprimida, uma perigosa ideologia etnocêntrica acabou por colocar irmãos em guerras de extermínio por espaço e recursos, sempre famintos ao dependerem da monocultura do arroz.
Separados do modo de viver dos seus ancestrais, os antigos chineses passaram a reverenciá-los e a cultuar as suas tradições esotéricas na esperança de preservar, ao menos na memória, uma época em que o homem caminhava livre e em paz consigo mesmo e com o mundo.
O livro “Tao Te King” atribuído ao eremita Lao Tsé, foi a primeira tentativa de registrar isso que até então era um sentimento inominável prestes a ser esquecido e perdido para sempre.
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O TAI CHI CHUAN incorpora todas as virtudes do taoísmo e como todo fruto ele carrega a semente para que possamos reviver um estilo de vida em que não sejamos vítimas da ânsia por um poder efêmero quando podemos viver felizes em sociedade por mais de cem anos e assim sucessivamente a cada nova geração.
Agora, o desafio dos chineses é o mesmo de toda a humanidade: para atingirmos a tão sonhada longevidade dos povos animistas que já estão no planeta há uns duzentos mil anos enquanto essa civilização precisou apenas de dez mil anos para se tornar hegemônica e nos colocar em um sistema instável de sobrevivência, será preciso resgatar certos tesouros do passado. E o TAI CHI CHUAN é um deles.