O estudioso dos mitos Joseph Campbell (1904 – 1987) afirmava que a maior parte dos grandes destas histórias encontradas no mundo se referem simbolicamente à nossa jornada espiritual pessoal.
Assim, os mitos falam sobre nossos “demônios” e inimigos internos, a luta pela liberdade e as lições que precisamos aprender para nos tornarmos uma pessoa completa. Neste infinito imaginário, a “Árvore da Vida” da Cabala e as lâminas do Tarô parecem apontar esse caminho.
A origem do tarô é bastante obscura e controversa. O caráter divinatório das cartas é seu aspecto mais conhecido e vulgarizado. Porém, o tarô é muito mais: um mergulho nos padrões cósmicos que regem a existência. O nível mais profundo das cartas só pode ser notado por aqueles que deixam de lado o apego pelo mundo material.
O tarô é composto por 78 cartas, divididas em dois grupos: os arcanos menores (56 cartas) e os arcanos maiores (22 cartas). Este último conjunto é o mais importante, e compõe o alicerce do tarô, com sua rica simbologia. Os arcanos maiores desenvolvem a jornada do herói (como a entendia Campbell), simbolizado pelo “Bobo” (ou “O Louco”, carta sem numeração), rumo à autorrealização.
O Bobo representa a condição do ser humano sobre a Terra. Ele inicia sua jornada, cheio de esperança e despreocupação quanto aos riscos. É o tempo de descobertas e dos primeiros passos rumo ao desconhecido.
No caminho, o Bobo encontra O Mago (carta 1), que parece ter o mundo inteiro sob controle. Todos os elementos da vida estão à sua disposição e ele transborda de sabedoria. O Mago afirma que toda vida existe para ser conquistada.
O Bobo encontra a seguir a Sacerdotisa (carta 2), envolta em mistério e segredo, intuitiva e paciente. A Sacerdotisa sugere dirigir o olhar para além do óbvio, buscando as profundezas de todas as coisas.
A Imperatriz (carta 3) expressa a natureza suave e nutridora. Ela encoraja o Bobo a apreciar o ciclo natural de tudo e a experienciar a abundância da Vida.
O Imperador (carta 4) é um disciplinador severo e exige respeito como um líder. Ao longo do tempo, o Bobo percebe que está sob controle da autoridade e das estruturas impostas pela sociedade. Com a ordem, vem a segurança e a direção.
Ao encontrar o Sumo Sacerdote (carta 5), sistemas de crenças e educação são implantados. O Bobo começa a discernir a estrutura moral da sociedade e aprende a se adaptar ao sistema.
O Bobo agora deseja uma conexão profunda com os outros (Os Amantes, ou O Enamorado, carta 6). Romance e paixão sexual, liberdade de pensamento, escolhas e autoexpressão estão em primeiro plano.
Focando no sucesso, através do trabalho duro e determinado, o Bobo segue adiante, impulsionado por sua força e zelo mental (O Carro, carta 7). Não há tempo de descanso para o Bobo: tempo é dinheiro.
O Bobo descobre como suas próprias ações trazem consequências e liquida antigos débitos (A Justiça, carta 8). Honestidade e equidade o definem e ele percebe que realmente se colhe aquilo que se planta.
A ideia do Bobo sobre o mundo se modifica. E o leva a passar longos períodos meditando sobre si mesmo (O Ermitão, carta 9). Verdades profundas são reveladas e ele se isola do mundo, querendo descobrir mais.
O Bobo está em um ponto de virada (A Roda da Fortuna, carta 10). Ele adquire um ponto de vista mais abrangente, enxergando as conexões entre as coisas. Logo seu rumo será alterado para uma nova direção.
O Bobo desenvolve seu caráter e resolução (A Força, carta 11). Ele agora compreende a necessidade de ser paciente e de aceitar os acontecimentos. Seu senso de compaixão e de perdão proporcionam a ele uma medida de controle durante os tempos difíceis.
A partir de agora, o Bobo faz escolhas de um modo diferente, colocando de lado seus interesses pessoais (O Enforcado, carta 12). Ele sabe que deve colocar seus esforços em prol de um propósito maior. Toda ação é suspensa, aguardando uma oportunidade certa.
Os caminhos antigos se esgotam (A Morte, carta 13). É a transição para uma nova fase: o que é velho não serve mais para o Bobo. É inevitável e necessário focar apenas no essencial.
Com a Temperança (carta 14), o Bobo encontra equilíbrio e se desfaz dos excessos. É tempo de cuidar da saúde e do equilíbrio emocional.
O materialismo e os vícios foram vencidos (O Diabo, carta 15). O Bobo já não é mais pego de surpresa ou controlado. Os antigos temores são substituídos pela fé.
De modo súbito, o Bobo adquire a compreensão verdadeira (A Torre, carta 16). Crises, golpes e humilhações, foram os catalisadores necessários para esta revelação. Toda negatividade é varrida de um só golpe.
A esperança no futuro é restaurada (A Estrela, carta 17). Ciente das bênçãos recebidas, o Bobo anseia por um sentido maior na vida. O amor flui naturalmente até ele e sua generosidade nada exige em troca.
Todos os medos e falsos ideais abandonam o Bobo (A Lua, carta 18). Sua mente é estimulada e sua imaginação abre novos horizontes.
O Bobo adquire a iluminação profunda e se sente verdadeiramente livre (O Sol, carta 19).
O dia de prestação de contas se aproxima (O Julgamento, carta 20). O Bobo renasceu completamente transformado e reconhece seu verdadeiro chamado.
A meta foi atingida (O Mundo, carta 22). O Bobo conquistou o desejo profundo de seu próprio coração. Seus dons são oferecidos ao mundo. A jornada está completa.
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Referências
“O Tarô de Marselha” – Carlos Godo – Editora Pensamento – São Paulo;
“Tarot Archetypes- The Fool’s Journey “