Pode ser que só de imaginar o perdão a respiração torne-se mais ofegante, o rosto se feche, os ombros se levantem, a musculatura enrijeça. É natural, temos muitos conceitos, alguns distorcidos, do que vem a ser o perdão e quais os seus benefícios. Respire suavemente, deixe os ombros relaxarem. Entre tantos aprendizados, percepções e insights que a pandemia da Covid-19 nos trouxe, uma delas é sobre a importância das relações em todas as áreas da vida e como é fundamental termos “a mente quieta, a espinha ereta, e o coração tranquilo”, como compôs Walter Franco.
É um convite para vermos o perdão sob novas perspectivas. Há muitos preconceitos e mal entendidos em relação ao perdão. Perdoar é libertar o coração aprisionado para voltar a fluir, avançar. Perdoar a si mesmo é libertar o coração da culpa e da vergonha.
Perdoar não é aprovar ou apoiar os comportamentos que lhe causam dor, ofensas, abusos, traições, agressões – tanto seus como de outra pessoa. Nem o impede de proteger os seus direitos. Nem fingir que “está tudo bem.” Perdoar não é passividade, sem você valorizar seus direitos, necessidades ou limites. Se um relacionamento ou situação estão além dos seus limites e são inaceitáveis, perdoar não significa permanecer e permitir que aconteçam de novo e de novo. Assim, usará o perdão como justificativa para não encarar e mudar.
Se, ao perdoar, a pessoa se sente superior, agirá com arrogância. Podemos perdoar e ainda assim não querer conviver. Nem sempre é necessário, ideal ou possível falar pessoalmente, declarar o perdão. É suficiente uma atitude interna, uma mudança de percepção. Renunciar à necessidade de prosseguir alimentando a mágoa, raiva, decepção, vingança, castigo, acusação etc.
O maior motivo para perdoar é o alívio das consequências danosas dos efeitos desgastantes da raiva e do ressentimento crônico. Quando estamos ressentidos, sentimos a dor do passado constantemente, uma ferida aberta que não cura. Assim, ressentidos, não conseguimos ver e viver o presente, valorizar o aqui e agora, desfrutar do bem que acontece agora, comprometendo as relações e o bem estar físico, emocional, mental e espiritual.
Vemos no consultório que, geralmente, a raiva e o ressentimento não trabalhados encobrem sentimentos de desproteção, abandono, desapontamento, insegurança, dor, medo, desamparo. Quais os ganhos e os prejuízos em alimentarmos mágoas, raiva e ressentimentos?
Ser gentil consigo mesmo é um ato de auto perdão. Olhar para si, numa auto revisão amorosa, sem críticas ou julgamentos, assumindo o compromisso de que, sejam quais forem os sentimentos presentes, ainda assim você decide ser gentil com você para escolher novas formas de ser, ter e fazer. Sempre fazemos o nosso melhor, isso depende do grau de medo ou amor que sentimos no momento. Para fazer diferente, precisamos aumentar o nível de amor constantemente.
A observação da respiração é um poderoso comportamento que nos traz para o aqui e agora, para o presente, a presença. Sempre que sentir-se desafiado, observe a respiração, sem críticas ou julgamentos, apenas sinta ao inspiração e a expiração pelas narinas. Antes de aceitar ou rejeitar, respire, solte a tensão, reconsidere, acalme. O perdão é uma decisão, uma atitude, um processo. É algo que oferecemos aos outros, ora aceitamos/recebemos e podemos oferecer a nós mesmos.
Perdoar a si mesmo talvez seja um desfio maior que perdoar o outro. Significa aceitar, sem julgamentos, tudo o que somos, a nossa luz e a nossa sombra. Abrir a cela em que somos os nossos próprios carcereiros. Compreendendo que a culpa não motiva mudança de comportamento, não instala novas atitudes, não gera psicoeducação, apenas atormenta, distorce a realidade e amarga a vida. A responsabilidade pelos nossos atos e escolhas, de forma gentil e com compaixão, libera o auto perdão e o compromisso de fazermos diferente, aprender com os erros. A responsabilidade guia a nossa consciência. Se o remorso e a culpa dominarem a sua mente, como haverá espaço e energia para a renovação?
O auto perdão é um processo: reconhecer a verdade e a causa na atitude; assumir a responsabilidade pelo que fez; aprender com a experiência; reparar o erro; assumir o compromisso de fazer diferente.
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Perdão, autoperdão e compaixão são uma tríade que nos aproxima da espiritualidade, que nos torna mais fortes e presentes na vida, ampliando a nossa capacidade de realização, de fazer o bem, de vibrar numa frequência mais alegre, mais positiva.
O passado tem um lugar na nossa história e deve permanecer nesse lugar. Quando o passado ocupa o presente, o presente fica sem lugar, ausente. Onde a vida acontece? Onde estão todas as oportunidades? Podemos dizer um grande sim à vida e, todos os dias, escolhermos viver o aqui e agora, no tempo real, possível, inteiros.
Um grande abraço