Quando você pensa na palavra manicômio, o que vem à sua mente? Provavelmente, um monte de pessoas com transtornos psicológicos vivendo em condições ruins e insalubres, certo? Esse tipo de casa manicomial praticamente não existe mais em nosso país por causa do trabalho de uma mulher chamada Nise da Silveira, você a conhece?
Bastante reconhecida nos últimos tempos por ter sido interpretada pela atriz Glória Pires no filme “Nise – O coração da loucura”, lançado em 2015, Nise é um dos principais nomes da luta antimanicomial no Brasil e da revolução da psicologia no nosso país. Saiba quem foi ela, quais foram suas principais ideias e de que forma você pode aplicá-las em sua vida.
Direto ao ponto
Quem foi Nise da Silveira?
Nise Magalhães da Silveira (1905-1999) foi uma das primeiras mulheres brasileiras a se formar em medicina. Em sua turma, entre 1921 e 1926, foi a única mulher entre 157 homens. Em 1933, especializou-se em psiquiatria e seguiu seu trabalho especializando-se nessa área.
No ano de 1944, começou o trabalho que a fez ganhar notoriedade. Depois de ingressar no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Rio de Janeiro, Nise não se conformou com as práticas psiquiátricas agressivas que eram aplicadas nos pacientes, como eletrochoques, lobotomias, entre outras.
Como punição por isso, foi deslocada para a área de terapia ocupacional, ou seja, cuidados terapêuticos para manter os internos ocupados com atividades alternativas, o que era desprezado pelos colegas. Ali ela criou um ateliê de pintura e modelagem com os pacientes, mostrando que os doentes podiam reatar seus vínculos com a realidade usando a arte e a criatividade.
Pouco a pouco, seu trabalho ganhou reconhecimento no Brasil e as artes criadas por seus pacientes ganharam exposições em importantes museus brasileiros. Dali em diante, focou seu trabalho em reabilitar pacientes que passaram por práticas abusivas em instituições psiquiátricas e em usar a arte e o contato com animais para tratar os doentes.
Em 1954, ela entrou em contato com o reconhecido psiquiatra Carl Gustav Jung, com quem manteve correspondência durante anos e quem chegou a visitar em duas oportunidades, entre 1957 e 1958 e entre 1961 e 1962, estudando no instituto de Jung em Zurique, na Suíça. Depois de retornar ao Brasil, difundiu a psicologia junguiana.
As ideias de Nise da Silveira
Nise dedicou sua vida a provar a eficácia de terapias alternativas e não agressivas no tratamento de doentes mentais, opondo-se radicalmente a tratamentos como eletrochoque, insulinoterapia, lobotomia e quaisquer outro que considerasse abusivo e agressivo com os pacientes.
O principal tratamento alternativo sugerido, implementado e estudado por Nise foi o uso da arte para que os doentes se expressassem livremente e até mesmo se comunicassem consigo e com o mundo.
Estudiosa dos ensinamentos de Carl Jung, ela acreditava que, quando se expressavam por meio de pinturas e de esculturas, por exemplo, os doentes estavam manifestando imagens de seu inconsciente, algo que não poderia ser acessado por meio de nenhum outro tipo de terapia.
Por fim, outra contribuição de Nise foi a defesa do contato com animais no tratamento psiquiátrico, algo que ela estimulou desde o seu primeiro trabalho no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Rio de Janeiro. Ela impediu que os cachorros que habitavam o quintal da instituição fossem expulsos e estimulou os doentes a interagirem com eles, notando que os internos conseguiam se expressar ao lado dos animais e que seu humor melhorava drasticamente quando as criaturas estavam presentes no convívio diário com os pacientes.
Frases importantes de Nise da Silveira
“Não se curem além da conta. Gente curada demais é gente chata.”
— Segundo esse pensamento de Nise, manter certas doses de loucura é essencial para ser saudável, já que aquele que afirma ser 100% são ou estar em busca disso é, na verdade, enfadonho e arrogante.
“Vivam a imaginação, pois ela é a nossa realidade mais profunda. Felizmente, eu nunca convivi com pessoas ajuizadas.”
— Quanto mais convivemos com pessoas criativas, questionadoras e loucas, mais passamos a ver a realidade com olhos mais brandos e menos angustiados. Estimule sua imaginação e sua criatividade!
“É necessário se espantar, indignar-se e se contagiar, só assim é possível mudar a realidade…”
— Ainda que muita gente veja a indignação e o espanto com maus olhos, Nise afirma que eles são necessários, porque é somente a partir do incômodo que nos movemos para fazer alguma mudança para que a tribulação desapareça.
“As coisas não são ultrapassadas tão facilmente, são transformadas.”
— Para Nise, tudo está sempre em transformação. Então conceitos como ultrapassar e superar não dão conta das complexidades dos seres humanos e das relações entre eles.
“Para navegar contra a corrente, são necessárias condições raras: espírito de aventura, coragem, perseverança e paixão.”
— O sistema, o mundo, o capitalismo, as dificuldades da vida… Muitos problemas podem ser encarados como a corrente, mas, para enfrentar todos eles, são necessárias características de bravura e valentia, além de sensibilidade.
“Não sou muito do passado. Sou do futuro. Quem olha demais para trás fica.”
— Apegar-se ao passado traz apenas dor e arrependimento, segundo Nise. Aquele que investe seu tempo visualizando um futuro melhor em vez de um passado triste é que realmente consegue avançar na vida.
“A palavra que mais gosto é liberdade. Gosto do som dessa palavra.”
— A partir desse comentário de Nise, é possível se perguntar: qual palavra tem um som agradável para você? Qual palavra você ama ouvir e até mesmo em qual você ama pensar?
“O que cura é a alegria, o que cura é a falta de preconceito.”
— Mais do que tratamentos psicológicos ou de saúde física, a felicidade e a expansão da mente para novas ideias que estejam distantes de qualquer preconceito são essenciais para qualquer tipo de cura que se deseje realizar.
“A criatividade é o catalisador por excelência das aproximações de opostos. Por seu intermédio, sensações, emoções, pensamentos são levados a reconhecerem-se entre si, a associarem-se, e mesmo tumultos internos adquirem forma.”
— Nise sempre acreditou que a criatividade e a arte eram os melhores métodos para promover cura em qualquer paciente com transtorno psicológico, justamente porque a arte tem o poder de causar emoções, sensações e de promover pensamentos libertadores.
“Todo mundo tem um pouco de loucura.”
— Não, ninguém é 100% curado. Ninguém é são por completo. Todos temos nossas manias, nossos devaneios e nossas particularidades. Abraçar isso, em vez de se afastar, é essencial para uma vida mais plena e feliz.
Como aplicar as ideias de Nise em sua vida?
Há quatro ideias que qualquer pessoa pode apreender dos ensinamentos de Nise da Silveira e aplicar na vida:
1 — Todos temos um pouquinho de loucura. Tentar negar isso só vai trazer sofrimento. Quando abraçamos nossas manias, esquisitices e idiossincrasias, somos mais felizes e menos angustiados a respeito de quem somos;
2 — Nenhum tratamento responde adequadamente à dor. Somente o amor, o cuidado e a criatividade podem nos tirar de abismos emocionais e de sentimentos deprimidos. Então se trate com amor e faça o mesmo com pessoas que você precisa ajudar;
3 — A arte é a melhor maneira de expressar aquilo que há de mais inconsciente, profundo e interno em nós. Você não precisa ser um grande artista, no sentido de ter uma técnica apurada, nem mesmo precisa publicar o seu trabalho. O próprio fazer artístico pode ser suficiente para aliviar a sua mente;
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4 — O contato com animais traz apenas benefícios para nós: alívio do estresse, descanso, amor, compaixão, companheirismo… Não se afaste de animais e, se possível, tenha sempre um perto de você, porque os bichinhos só podem fazer bem, seja lá o que estiver acontecendo em sua vida.
E aí, o que você achou das ideias dessa que foi uma das maiores intelectuais brasileiras de todos os tempos? Acha que a luta antimanicomial dela é válida ou discorda disso? Compartilhe suas impressões a respeito da vida e dos princípios de Nise e incorpore as ideias dela em sua vida caso as tenha considerado interessantes.