Hoje em dia, milhares de pessoas — em sua maioria mulheres, mas não só —, apesar de todas as suas conquistas de independência, ainda assim permanecem subjugadas atrás de véus de sofrimento.
Permanecem reféns de relacionamentos abusivos, com parceiros que exercem um tipo de sequestro emocional que rapidamente se transforma em sequestro de alma quando, estrategicamente, roubam das suas vítimas os seus próprios cenários existenciais.
É um tipo de manipulação perversa onde as vítimas sequencialmente vão perdendo referências sobre si mesmas, sobre o que lhes é vital, sobre o que verdadeiramente lhes faz sentido. Tais abusadores fazem uso estratégico de táticas onde ocorrem a inserção de uma escravidão velada e onde a vida das pessoas que entram nessas tramas é literalmente roubada.
É especificamente neste cenário de pleno século XXI, onde grande parte das mulheres almeja ser —e muitas já se encontram — financeiramente independentes, que acontecem tais dinâmicas.
Mesmo considerando as facilidades para se divorciar sem o antigo preconceito que antes rondava este tema, observa-se que, embora os caminhos estejam abertos para que o desenvolvimento da individualidade se manifeste, infelizmente, porém, este fator ainda não ocorre em sua plenitude. Em alguns casos, como o tema que estamos revelando, o sentido oposto de tudo o que pode significar liberdade é o que costuma acontecer.
A boa notícia é que começa a se fazer ouvir um grito de pedido de ajuda que antes era silencioso.
A grande pergunta que ronda aqueles que estão de fora seria o porque muitos, mesmo quando já estão conscientes da condição em que estão, ainda assim continuarem a conviver com parceiros manipuladores do tipo sequestrador emocional. Outra questão seria sobre como, nessa atualidade, que visa a independência a qualquer custo, as pessoas entram nessas situações e porque isso acontece?
Precisamos definir quem são eles e como agem e porque tanto estes tipos quanto as vítimas estão em evidência nos dias de hoje.
Quem são eles? Narcisistas perversos? O que seria um relacionamento abusivo e prejudicial?
“Narcisismo perverso” é uma patologia que se evidencia mais em nossa atualidade exatamente pelas demandas do nosso século. O narcisista perverso não suporta ver brilhos fora dele. Qualquer pessoa que esteja por perto, numa relação mais próxima, ameaça a sua frágil percepção de si mesmo.
E, como o vazio interior é grande, a luz do outro deve ser apagada imediatamente, mas não em evidência porque ele sabe das leis de boa conduta e precisa, por sua característica narcísica, aparecer bem na fita. Uma de suas principais armas é a promessa de um relacionamento de fusão, ou seja, de compatibilidade absoluta seja em qual área for. Isso pode ser na sexualidade, mas não só. Para tanto, o grau de sedução vai às alturas.
Na fase da sedução, as promessas fazem o colorido das conversas e, com isso, ele vai descobrindo o que falta na vítima, onde dói e o que precisa ser suprido. Após a entrega afetiva da vítima, quando se cai na ilusão de que as carências podem ser sanadas, o lado negro do sedutor narcisista perverso aparece. De uma hora para outra, ela passará a ser criticada, o que se faz e o que se é nunca estará suficientemente bom.
E, ainda neste pacote, juntamente com as críticas, uma ameaça sinistra de abandono ficará incessantemente pairando no ar. As vítimas, uma vez que fisgadas, esquecem-se de que há pouquíssimo tempo estavam autossuficientes em suas vidas e com o seu brilho próprio. Aliás, o medo dessas vítimas é o do abandono.
Funcionam em sua maioria como pessoas sociáveis e que têm o costume de agradar os outros antes mesmo de ouvirem o que seria de fato bom para elas. Como este receio, agora amplificado pelas artimanhas do perverso, as presas muitas vezes acabam num estado de total regressão, a ponto de esquecerem-se de suas conquistas pessoais, passando a funcionar com o emocional da criança temerosa da perda do amor que um dia tiveram.
Mesmo aquelas que não acessam esse lugar de modo consciente não escapam dos sentimentos de medo do abandono. Com isso, gradativamente, vão funcionando como escravas do olhar dos parceiros, denegrindo-se, inclusive, tudo em nome de não perderem o afeto, portanto, o sustento da vida, de quando se é criança principalmente.
A solução para se resolver este impasse são duas: consciência do lugar onde se está e, na maioria dos casos, auxílio terapêutico para poder sair fortalecido dessas tramas. Uma oportunidade de curar feridas emocionais escondidas, mas que gritam alto quando ativadas e não devidamente tratadas.
Existem também outras opções para sobreviver a esse tipo de relacionamento, uma delas é a alternativa do não contato. Nela, a pessoa decide cortar toda a forma de contato. Esse tipo de envolvimento é conhecido como uma espécie de relação tóxica, como se fosse uma drogadição que, para se descontaminar e se desintoxicar totalmente, a distância absoluta se faz necessária. A necessidade de fusão, quando ainda não estamos completos em nós mesmos, pode levar a todo tipo de adição.
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Por conta da repercussão do meu livro e de tudo o que está ficando em evidência sobre os relacionamentos nesses tempos, todos os dias recebo pessoas desesperadas, com total consciência de onde estão, querendo ajuda para que possam se libertar do inferno em que vivem.
E as consequências para quem permanece tempo demais podem ser devastadoras. Em meu livro, conto casos reais, romanceados e redimensionados. Fica evidente como as pessoas entram nessas roubadas e como podem acordar e se resgatar mais amadurecidas depois de tanto sofrimento.