Por muito tempo eu vivi sem saber do que gostava, me via envolvida com o que os outros gostavam. Sempre colocava o outro em primeiro lugar e ficava preocupada em querer agradar quem quer que fosse.
Quando preparava o jantar da família ou recebia os amigos, buscava adivinhar como poderia deixar aquela refeição apetitosa, fazendo com que todos ficassem satisfeitos.
Porém agradar pessoas diferentes, com paladares diversificados, hábitos distintos, tornava-se uma ginástica e tanto. Cozinhar ganhava um peso extra e por muitas vezes a pizza se tornava a grande solução, outras vezes acabava desistindo de receber a visita em casa optando por algum bar ou restaurante.
Conforme eu seguia querendo me tornar uma grande adivinha, fui ficando de lado e aos poucos acabei sem saber do que eu gostava, o que fazia os meus olhos brilharem e a minha boca salivar.
Segui neste padrão até vivenciar uma grande crise pessoal e ser convidada a olhar para mim. Fiquei boquiaberta quando percebi que não sabia nada de mim, que me desconhecia por completo.
Neste momento a cozinha me chamou, convidando a descobrir o meu sabor, a encontrar o que me apetecia, a deparar com o que me desagradava, a me olhar com amorosidade, a me acolher, me respeitar e me colocar em primeiro lugar.
No início, ao abrir a geladeira, eu ficava perdida me perguntando: “O que eu quero comer agora?”, porém o que começou confuso foi se tornando divertido. Sem muito saber o que fazer, fui soltando as expectativas e me aventurando entre as panelas.
Ainda lembro do dia em que um maço de espinafre piscou para mim ao mesmo tempo que o feijão fradinho despertava as minhas lombrigas. Na minha cabeça só uma pergunta: “E agora?”, no meu coração: “Vai, tenta, arrisca. Você consegue. Vai valer a pena!”
Seguindo a voz do coração mergulhei de cabeça. Na frigideira salteei pedaços de açafrão com cominho em azeite de oliva e então juntei o feijão cozido. Um colorido intenso tomou conta daqueles grãos que pareciam pintados um a um, meus olhos sorriam diante daquele quadro e a vontade de provar crescia enquanto um perfume instigante se espalhava pela cozinha. O gran finale ficou por conta do contraste que as folhas de espinafre trouxeram ao prato.
Sentada à mesa sentia a crocância daquelas folhas de sabor rasgante se mesclando aos tons adocicados do feijão e de olhos fechados saboreava o inominável, alcançando espaços de êxtase jamais provados. Um gosto terroso me trazia de volta e mais um bocado era ingerido, apreciado e eu agradecia cada grão, por cada sensação.
Essa experiência me estimulou a apreciar o meu sabor, a me valorizar, a dar vazão a minha intuição, a me acolher com braços amorosos, a acreditar em mim, a me abrir mais e mais aos sabores da vida.
E você já descobriu o seu sabor?
Compartilho com vocês o sabor da minha descoberta:
Feijão fradinho salteado com espinafre
Ingredientes:
- ½ xícara de feijão fradinho;
- ½ maço de espinafre;
- 1 colher de chá de cominho;
- 1 colher de sopa de açafrão da terra;
- 1 colher de sopa de azeite;
- Sal.
Modo de fazer:
- Coloque o feijão fradinho em um bowl, cubra com água e deixe descansar por 8h;
- Dispense a água e lave o feijão;
- Leve uma panela ao fogo com o feijão fradinho, cubra com água e cozinhe até ficar macio, porém crocante (cerca de 20 minutos);
- Leve uma frigideira ao fogo com o azeite, o açafrão e o cominho;
- Salteie por um minuto;
- Junte o feijão fradinho, sem a água do cozimento e salteie por um minuto;
- Acrescente o espinafre e salteie por um minuto, as folhas permanecem tenras;
- Coloque sal e sirva;
- Aprecie com os olhos do coração.
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