Durante um bate papo descontraído com minha filha de 8 anos, em certo momento, ela me disse:
“Mãe, amanhã você me empresta o seu corretivo pra eu colocar na picada que eu levei no rosto? Não quero ir para a escola assim porque meus amigos vão rir de mim!”
Eu respondi que emprestaria sem problemas. A conversa foi tomando vários rumos. Ela me perguntou: “Tá doendo sua cirurgia?” (Fiz recentemente uma cirurgia na vesícula). Eu respondi que estava tudo bem. Ela disse: “Não contei pra ninguém na escola que você fez uma cirurgia. Não quero ninguém cochichando de você”. E continuamos falando de vários assuntos inclusive sobre esses receios.
Comecei a me lembrar de situações que também passei na idade dela. Estudava em colégios particulares e meus pais davam um duro danado para pagar. O tênis da escola era dois números maior para não perder rápido. Lápis de cor com 24 ou 36 cores era meu sonho de consumo. Tênis da moda? Já ouviu falar que pé de pobre não tem tamanho?
Eu era magra, um bambu, e morria de vergonha. Na adolescência, colocava uma calça de lã por baixo do uniforme independentemente do tempo. Bermuda? Nem pensar! Sandália? Nunca! Achava o meu pé feio demais e eu não merecia passar por essa vergonha toda.
Tenho certeza de que neste momento já passou pela sua cabeça um monte de situações desse tipo e que você deve ter dado um sorriso e talvez até balançado a cabeça só de lembrar o quanto tudo isso foi dolorido naquela época. Ah, se eu soubesse o que sei hoje!
E observando os questionamentos e temores de minha filha, lembrei da música “Como nossos Pais”, composta por Belchior em 1976 e imortalizada na voz de Elis Regina. Segue uma palinha:
“Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais…”
Precisamos abandonar esses condicionamentos, pois somos vítimas dos condicionamentos dos nossos pais, assim como nossos pais também o foram.
Não precisamos condenar ninguém, apenas começar uma mudança dentro de nós mesmos. Sendo felizes, nos aceitando, cuidando da gente como muitas vezes cuidamos do outro, procurando o aprendizado em cada erro, perdoando, amando, aceitando, confiando e agradecendo sempre. A gratidão é uma das forças que mais aumentam as emoções positivas.
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E hoje, com 40 anos, tudo isso parece tão claro e eu entendo agora o porquê dizem que a vida começa aos 40. Porque de repente cai a ficha e muitas coisas começam a fazer sentido. Então peço licença à nossa querida Elis Regina e entro com Titãs para finalizar o nosso bate papo:
“Toda pedra do caminho
Você pode retirar
Numa flor que tem espinhos
Você pode se arranhar
Se o bem e o mal existem
Você pode escolher
É preciso saber viver”