Os dias às vezes parecem travados. A voz muda, o tom desarmônico e as notas erradas. Há dias em que insistimos nos erros, atravessamos os sentimentos e recuperamos lembranças enterradas. Há momentos em que só se quer sumir, mudar a rota, esconder o destino e transmutar os arredores.
Existem pessoas que simplesmente não fecham, não entram, não conseguem ficar. A sincronia das horas, por vezes, parece nunca se alinhar. Não é de propósito, mas acontece de a energia não fechar, de os objetivos não coincidirem e as vontades tornarem-se solitárias. Vãs. Acontece que esperamos pelo próximo sentido, pela próxima risada, pelo próximo dia. Queremos sempre a próxima folga, a próxima festa, os próximos encontros, os próximos beijos.
A verdade é que vivemos mais a espera do que o momento em si. Somos felizes ao planejar, inventar, enriquecer de detalhes os planos. O barato do futuro é o que o antecede, as linhas que intercruzam os imprevistos e o tanto de inesperado que encontramos pelo caminho. Nunca é o dia da formatura, mas os anos estudando. Nunca a festa de casamento, mas os meses organizando. Nunca o fim, mas os meios, os aprendizados, as circunstâncias.
Hoje, olhando para trás, percebo o quanto de nada havia na maior parte do tão esperado “tudo”. Ao longo do percurso, gastamos as energias com o supérfluo, o banal. A vida é senão uma retórica que, a rigor, não permite resposta. Simplesmente acontece e não mensura. Por isso, passei a pensar mais nos elementos da contextualização do que no próprio contexto. Emancipar mais as sensações ocasionais do que as ocasiões das sensações. Procurar menos a identificação e buscar mais o identificar-se.
Ao perceber o monólogo da existência, concebo a exacerbada coletividade de uma vida sozinha. As conversas dialógicas e pouco recursivas, os encontros mais fugazes do que ansiosos. Tudo pelo fim e pelas próprias verdades. Argumentos, pois, travados pela concepção de vencer, de estourar os limites do conhecimento e da informação superiores. A verdade é que as relações tornarem-se pesadas com tanta robustez, com tanto penar pelo ócio e pelo silêncio.
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Tenho sido muito acusada por silenciar em meio a algumas discussões. Apontada como teimosa e dona da razão. Incapaz de assimilar verdades diferentes das minhas. Mas a verdade, preciso confessar, é que tenho ficado exausta com os rodeios que competem unicamente por uma persuasão estúpida sobre o que, honestamente, ninguém sabe.
Não nos damos conta de que apenas descobrimos tudo o que inventamos. A consciência nada mais é do que a percepção da existência, somada ao repertório que carregamos para ler as verdades externadas. A única coisa que fazemos, de fato, é a seleção hologramática do que já está dado. E só.