Convivendo

Tranças, ancestralidade e símbolo de resistência

Recorte de um rosto de uma mulher negra com tranças.
Beatriz de Andrade Silva / Eu Sem Fronteiras

De uns quatro ou cinco anos para cá, temos notado o aumento do uso de penteados com as tranças afro e o que se sabe é que as tranças são muito mais antigas do que pensamos e que isso não é um estilo, mas ancestralidade e cultura.

Na Antiguidade, as tranças eram usadas como símbolo e identificação de religião, classe social, etnia e estado civil. As tranças Nagô, por exemplo, eram feitas de diferentes formas, como um caminho na cabeça das pessoas escravizadas, e o objetivo era fazer um mapa traçando as rotas de fugas. Ademais, as tranças eram usadas para armazenar sementes, para que pudessem usar assim que encontrassem um local seguro. Elas tinham um papel fundamental para transmitir mensagens entre as pessoas escravizadas.

As tranças têm um simbolismo de resistência. Na década de 60 e 70, existiram vários movimentos negros que lutavam pelos direitos da população negra, sobretudo por poderem ser quem quisessem. Muito embora houvesse preconceito e racismo, o objetivo era mostrar que poderiam usar as roupas do seu jeito e o cabelo também, como o Black Power e as tranças. Era uma forma de valorizar nossa cultura e mantê-la viva.

Como disse no início do artigo, o uso das tranças e até mesmo dos cabelos afro naturais cresceu significativamente nos últimos anos e, ainda que haja muito preconceito e racismo sobre os cabelos afro, temos a liberdade de expressão de mantermos nossos cabelos do jeito que acharmos melhor, usando-os naturalmente, com tranças ou laces.

Ao falarmos de ancestralidade, retomamos esse movimento pela história da população negra, passada de geração em geração, cujo conceito é racial e cultural.

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Entretanto muitas pessoas brancas usam tranças e, se é algo cultural, por que elas podem usar se não faz parte da sua cultura?

Falemos, então, sobre apropriação cultural, que é um tema que acaba se interligando a esse. Apropriação cultural não é determinar que pessoas brancas não possam usar tranças, mas não deslegitimar a origem da nossa cultura, de seu significado, de sua ancestralidade e de minimizar tudo isso, como quando vir uma pessoa negra usando trança e considerar que é estranho, sujo, mas quando é o contrário, uma pessoa branca usa é estiloso. A apropriação cultural é complexa e um problema estrutural, é usar uma cultura a seu favor e inviabilizá-la, desrespeitando sua história.

Portanto, as tranças são mais do que penteados, elas são a força, a resistência de um povo que até hoje luta por seu espaço, por respeito e por legitimidade.

Sobre o autor

Beatriz de Andrade Silva

Psicóloga Clínica, orientada pela psicanálise freudiana, Mestranda em Psicologia Social (PUC-SP), especialista em diversidade nas organizações (PUC-SP), pós-graduada em direitos humanos, responsabilidade social e cidadania global (PUC-RS), pós-graduada em psicologia e desenvolvimento infantil, mentora de carreira (FGV) e pesquisadora das relações étnico-raciais. Atuei por oito anos no mercado financeiro, na área de gestão de pessoas, com foco em talent acquisition, treinamento & desenvolvimento. Na área social, sou voluntária em um coletivo que busca colocar a diversidade e inclusão em pauta e ação.
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