Comportamento Educação dos filhos

Você nunca presta atenção, só fica neste celular!

Mãe e pai segurando celular e criança sozinha

Nas famosas DR (discussões de relação) são comuns reclamações do tipo “você nunca presta atenção, só fica neste celular” ou “nem parece que você está me ouvindo”. Aliás, são tão comuns que talvez não haja mais tantas discussões de relação por estarem ambos ao celular.

No meio disso, se um bebê pudesse falar talvez dissesse algo parecido, como “mamãe, papai, o que há de tão importante neste celular? Por que tenho eu que concorrer com ele?”. E se Freud estivesse vivo, quem sabe não incluiria o smartphone em sua teoria do Complexo de Édipo?

Pais e filha com celular e notebook no chão da sala
Foto de Andrea Piacquadio no Pexels

O bebê precisa, para se desenvolver psicologicamente de forma saudável, da atenção total de sua mãe e seu pai. Este projeto de pessoa necessita sentir-se o centro do universo, a prioridade número um da casa, o assunto mais interessante na vida de seus pais.

Amamentar olhando as redes sociais, por exemplo, comunica ao bebê exatamente o contrário. Brincar respondendo mensagens, também. Estar ao celular durante as refeições, também. Porém, os pais, em sua imensa maioria, possuem o forte desejo que seus filhos cresçam fortes e saudáveis, que possam estudar na melhor escola possível e, claro, que possam ser felizes. Isso nos faz pensar no que é básico para o desenvolvimento.

A base de um desenvolvimento saudável está na atenção e no respeito ao ritmo que cada bebê possui. Sim, os bebês possuem um ritmo que ultrapassa em muito a hora da mamada, eles possuem um ritmo de ser.

A noção do que é básico muitas vezes não é pensado como a base, mas sim como o mínimo, ou o máximo, necessário para a sobrevivência. Nisso as preocupações se voltam para a marca do hospital onde o bebê nascerá, na marca do leite, do pediatra, da escola e em tantas outras marcas nas quais a regra básica é: quanto mais caro, melhor. Uma boa pergunta a se fazer é qual a marca do seu cuidado com seu filho?

As primeiras fases da vida, cada uma a seu turno, encerram as possibilidades humanas. Bebê, criança, adolescente. Nessas fases são constituídas as bases que, pelo resto da vida, serão repetidas e sofridas.

Mas que relações podem haver entre este período de quarentena e o desenvolvimento? Uma delas é justamente essa de que dar comida não é alimentar, e estar junto não é estar presente. Independentemente do jogo de palavras, a questão é a qualidade da presença e da atenção que os pais oferecem aos filhos.

Vemos em muitas casas uma batalha na qual de um lado estão os pais, que não sabem como alimentar seus filhos com afeto e companheirismo e, de outro, filhos que não sabem como explicar que sentem falta de algo que não conhecem. Ambos, pais e filhos, estão estrangeiros ao leite derramado pelo mal entendido do que é básico ao desenvolvimento psicológico.

Família com pai, mãe e filhos nos colos
Foto de Victoria Borodinova no Pexels

Estar em família não significa que está tudo bem. A falta do que não foi construído nas relações entre os familiares e também nas relações do eu consigo mesmo de cada membro do grupo passa a fazer muito mais ruído, e as paredes e portas da casa já não abafam mais esses sentimentos; pelo contrário, os amplifica.

Crescer dá trabalho. Aos pais, então, é imposto um trabalho dobrado, de tornarem-se adultos capazes de ajudar seus filhos a se tornarem pessoas. Tudo isso implica uma grande quantidade de energia, de vontade e de comprometimento. O desafio é tão grande que trabalhar fora de casa por doze horas é mesmo tentador, sem contar o bônus de poder pensar, e muitas vezes gritar pela casa, que todo sacrifício de manter um emprego que não gostam ou de enfrentar trânsitos infinitos, é pelos filhos.

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Promover um desenvolvimento infantil saudável em seus filhos convoca os pais a trabalharem no próprio desenvolvimento, o que significa remediar e abrir mão de muitas formas de viver e pensar. Entende agora, do preço que estamos aqui a falar? Mas isso sempre foi assim, não é mesmo? Em pouquíssimo tempo histórico a sociedade tornou-se muito mais complexa, com solicitações e demandas diretamente proporcionais ao avanço das tecnologias, e os pais, sobretudo as mães, acham-se sobrecarregados na busca por dar conta desses dois mundos que lhe são tão caros, o individual e o dos filhos.

Sobre o autor

Eduardo Marchese Damini

Eduardo Marchese Damini é psicólogo clínico, docente do curso de Psicologia no Centro Universitário Fundação Santo André e Mestrando em Psicologia da Saúde na Universidade Metodista de São Paulo.

Email: eduardodamini@gmail.com